A crise política na Itália se agravou e chegou a um impasse nesta quinta-feira (22), depois que os partidos não conseguiram um acordo para formar o novo governo. As negociações, contudo, vão continuar e, por enquanto, as eleições antecipadas estão congeladas. O anúncio foi feito pelo presidente da República, Sergio Mattarella, na tarde de hoje, após se reunir com os líderes de todos os partidos.
Mattarella deu tempo até a próxima terça-feira (27) para que os partidos cheguem a um acordo. Caso contrário, ele dissolverá o Parlamento e convocará eleições antecipadas, como pede a nacionalista Liga, de Matteo Salvini.
Nos últimos dias, declarações de líderes do Partido Democrata, da oposição de centro-esquerda, sinalizaram uma disponibilidade da legenda para formar uma aliança com o Movimento 5 Estrelas para evitar novas eleições. Mas o acordo está longe de ser fechado.
Entenda a crise política italiana
No dia 8 de agosto, Matteo Salvini retirou seu partido, a Liga, da maioria parlamentar que apoia o primeiro-ministro Giuseppe Conte. Em junho de 2018, depois de longas negociações, o partido nacionalista de Salvini e o antissistema Movimento 5 Estrelas, que tinham sido adversários nas urnas, chegaram a um acordo para formar uma maioria parlamentar.
Para unir duas forças tão distintas, Salvini e o líder do 5 Estrelas, Luigi Di Maio, assinaram um contrato de governo e indicaram o advogado Giuseppe Conte como primeiro-ministro. Conte, que nunca havia assumido um cargo político, foi escolhido como figura de garantia entre as duas legendas. Ele foi indicado pelo 5 Estrelas, mas aceito pela Liga.
No final de julho e começo de agosto, após fazer festas e comícios lotados nas praias durante o verão italiano, Salvini abriu uma repentina crise de governo enquanto o Parlamento se encontrava em recesso. A esperança do líder da Liga era levar a Itália a eleições antecipadas até o fim do ano.
O que motivou o líder da Liga a apresentar uma moção de desconfiança contra o governo é a esperança de capitalizar o consenso que ele tem no país e se tornar primeiro-ministro de um governo inteiramente da direita. A Liga teve um “boom” nas eleições europeias em maio desse ano quando alcançou 34% dos votos. Somente um ano atrás, nas eleições italianas, teve 17%. O sucesso se deve principalmente à implementação de duras políticas anti-imigração e a um hábil uso da propaganda.
A súbita ruptura de Salvini com o aliado Movimento 5 Estrelas surpreendeu a política e a opinião pública. No dia 20 de agosto, o primeiro-ministro Conte discursou no Senado e fez duras críticas ao líder da Liga, que foi tachado de “irresponsável” por derrubar o governo.
No mesmo dia, Conte entregou seu cargo ao presidente da República, Sergio Mattarella, oficializando o fim do governo verde-amarelo, como foi batizado pelas cores de Liga e 5 Estrelas.
Como a Itália é uma república parlamentarista, o presidente da República, que é eleito pelo Parlamento a cada sete anos, tem papel de garante da Constituição. Ele atua para que os trâmites democráticos e constitucionais sejam formalmente respeitados. Entre seus poderes estão encarregar o primeiro-ministro, dissolver o Parlamento e convocar eleições.
As eleições antecipadas, porém, são sempre o último recurso usado pelo chefe de estado. O objetivo primário é tentar formar um novo governo e levar ao término a legislatura, que começou em junho de 2018 e dura cinco anos.
Após a renúncia de Conte, Mattarella realizou na quarta (21) e quinta-feira (22) rodadas de consultas com os líderes partidários no Parlamento para verificar se existe a possibilidade de um governo alternativo.
Os encontros terminaram sem que houvesse acordos e Mattarella deu um prazo maior aos partidos. Novas rodadas de consultas serão realizadas na próxima terça-feira (27). Se novamente não houver entendimento entre os partidos, a Itália irá a novas eleições.
Após a ruptura de Salvini, o Movimento 5 Estrelas, o partido que tem o maior número de parlamentares, disse ter se sentido traído pelo aliado, mas não fechou completamente a porta para um possível novo acordo de governo com a Liga. Ao mesmo tempo, porém, o 5 Estrelas mandou sinais de abertura para formar uma nova maioria com o partido da oposição de centro-esquerda, o Partido Democrata.
As eleições antecipadas são consideradas a pior opção para o 5 Estrelas, já que o partido perdeu muitos votos no último ano. Nas eleições italianas de 2018 teve 32% dos votos, mas nas europeias de maio caiu para 17%. E as pesquisas eleitorais não são positivas.
Nesta quarta (21) e quinta-feira (22), o principal partido de oposição, o Partido Democrata (centro-esquerda), por meio de seu líder Nicola Zingaretti e pelo ex-primeiro-ministro Matteo Renzi, estendeu a mão ao Movimento 5 Estrelas para formar um novo governo, mas fixou cinco condições não negociáveis. Na tarde de quinta (22), o 5 Estrelas respondeu apresentando um programa de governo em dez pontos. As tratativas estão em andamento.
Os outros principais grupos de oposição, Força Itália, do magnata Silvio Berlusconi, e Irmãos da Itália, ambos da direita, anunciaram que preferem eleições antecipadas. O objetivo dos dois partidos é criar uma coalizão de direita junto com a Liga. As pesquisas apontam que a coligação entre os três partidos ganharia as eleições e teria uma maioria ampla no Parlamento.
Movimento 5 Estrelas e Partido Democrata dizem que é perigoso levar o país a eleições antecipadas nesse momento e apelam para o senso de responsabilidade, já que, até o fim do ano, o Parlamento precisa aprovar a lei orçamentária de 2020 e o governo tem que evitar a entrada em vigor de algumas cláusulas negociadas com a União Europeia que preveem aumento de impostos. Segundo os dois partidos, enfrentar eleições nessa fase jogaria o país no caos econômico. Desde 1946, ano das primeiras eleições após a Segunda Guerra Mundial, os italianos nunca votaram no segundo semestre.
Como as tratativas entre os partidos estão em andamento, todas as opções continuam na mesa. Apesar da traição, o 5 Estrelas mantém canais de comunicação com a Liga, que ao mesmo tempo em que pede novas eleições, disse que está disposta a formar um novo governo.
A opção mais provável, porém, parece ser a de uma aliança entre 5 Estrelas e Partido Democrata. Os dois partidos, que as pesquisas apontam em crise, impediriam que a direita tome o poder nos próximos meses e ganhariam tempo para se fortalecer até as próximas eleições. Mas, caso o governo fracasse, o preço pago nas urnas será salgado.
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