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Os ataques maciços da Rússia em cidades ucranianas no começo desta semana marcam uma escalada da guerra. Mais de 20 cidades foram fortemente atingidas, inclusive a capital, Kiev, que desde junho não era visada pela ofensiva russa. Somente na segunda-feira (10), 84 mísseis e 24 drones “suicidas” foram lançados. Agora, especialistas debatem sobre quantas armas a Rússia ainda tem em mãos para continuar a ofensiva no país vizinho.
Algumas antigas estimativas já foram quebradas. “Os estoques russos foram claramente subestimados”, declarou Vincent Tourret, pesquisador da Fundação de Pesquisa Estratégica da França.
Em 2019, o instituto sueco FOI previa que o exército russo tinha cerca de 1.300 mísseis balísticos e de cruzeiro. Desde fevereiro, no entanto, mais de 3 mil já foram lançados contra a Ucrânia.
“Não é possível chegar a números precisos, principalmente porque há um limite que o exército russo não ultrapassará, para manter uma quantidade aceitável em caso de conflito militar contra a OTAN”, analisa Dimitri Minc, especialista sobre a Rússia no Instituto Francês de Relações Internacionais, em entrevista ao jornal Le Figaro.
Além disso, a produção anual deve estar comprometida. Com as sanções ocidentais aos russos, o país poderá ter dificuldade para produzir novas armas, sem componentes essenciais estrangeiros. “A não ser que a Rússia e parceiros como a China consigam desenvolver esses componentes tão sofisticados”, alerta Minc.
Um investimento de longa data
Conforme destaca o ex-KGB Sergei Jirnov, no livro L’engrenage (A Engrenagem, em tradução livre, sem versão em português), publicado em julho de 2022 pela editora Albin Michel, o orçamento oficial russo destinado às forças armadas representa 15% do orçamento total do país, o equivalente a 60 bilhões de dólares (cerca de 311 bilhões de reais, na conversão atual).
O valor real, no entanto, é possivelmente muito maior, especialmente em período de guerra. Jirnov estima que esse investimento no exército seja o equivalente a 30% do orçamento do país.
O autor destaca que é um percentual muito maior do que o de outros países. A França, por exemplo, destina 2 a 3% do orçamento ao setor militar.
Porém, esse investimento de longa data dos russos não é destinado necessariamente aos melhores equipamentos. “Putin não conseguiu equipar o exército com armas de última geração”, descreve Jirnov.
Além disso, nos últimos anos, o país se tornou dependente de componentes estrangeiros muitas vezes fabricados em países adversários ou até inimigos, como peças eletrônicas de Taiwan e da Coreia do Sul.
Aviões e tanques foram importados, especialmente na última década, da França, dos Estados Unidos e da Alemanha.
“E, no entanto, a Rússia se mobiliza contra a Europa, o Ocidente, contra a OTAN e os Estados Unidos. Tudo estava diante dos nossos olhos, anunciado há anos”, avalia Jirnov, sobre a anunciada preparação russa para a guerra a partir de equipamentos comprados em países inimigos.
Corrida para equipar a Ucrânia
Nos novos ataques de segunda-feira (10), a defesa ucraniana conseguiu interceptar 43 mísseis e 13 drones, cerca de metade do que foi lançado pelos russos – uma grande quantidade, porém não o suficiente para evitar tragédias em todo o país.
“Nós temos que nos defender desses ataques com armas da era soviética que temos em quantidade insuficiente”, reclama o chefe do exército ucraniano, Valeri Zaloujny, no Twitter.
Diante dos novos ataques, a Alemanha prometeu enviar quatro sistemas de defesa antiaérea nos próximos dias. Os Estados Unidos também garantiram que enviarão, até o final do ano, duas baterias antimísseis.