Maria Ángeles não tinha apenas um, mas três pretendentes: três combatentes do Estado Islâmico (EI) que a mantinham conectada ao computador há meses. Em seu quarto, na casa de sua mãe na cidade de Almonte (em Huelva, na Espanha), escondida e a portas fechadas, transformava-se em Maryam Al-Andalusiya (María de Andalucía), uma jovem de 22 anos que havia se convertido ao islamismo secretamente em uma mesquita em Sevilha, em abril de 2015. E que se deixava seduzir pelas palavras — em inglês — e pela imagem de homens barbudos que prometiam uma vida no “paraíso dos irmãos”.
Em menos de um ano e sem sair de casa, deixou de postar vídeos do Metallica, uma de suas bandas favoritas, em seus perfis das redes sociais e começou a buscar dicas sobre como usar o hijab (lenço na cabeça) com estilo. Com essa peça islâmica, depois de um processo de “radicalização express”, foi presa na quarta-feira no aeroporto de Barajas, em Madri, quando estava prestes a embarcar em um voo para Istambul (Turquia).
“Falavam (com mensagens criptografadas) da responsabilidade do Ocidente no conflito sírio, da importância das mulheres no novo estado”, dizem os investigadores.
Além de um Corão em espanhol — só havia tido tempo de receber algumas aulas particulares de árabe — a jovem levava na mala vários endereços e números de telefone de pessoas que, já na Turquia, lhe ajudariam a atravessar a fronteira com a Síria para se reunir com seus captores no califado de Abu Bakr al-Baghdadi.
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Seu caso chamou a atenção dos investigadores da Guarda Civil espanhola que combatem o terrorismo islâmico, especialmente pela rapidez e conversão radical:
“É relativamente compreensível que uma mulher da cultura islâmica possa dar um passo em direção ao radicalismo, mas uma garota cristã, de uma família normal, que não sabe nada da cultura islâmica... É como passar do estado sólido ao gasoso e em tempo recorde”, relata a investigação.
Na opinião dos investigadores, o caso destaca a brutal campanha que vem sendo conduzida pelo EI nas redes sociais — o grupo tem 44.000 perfis no Twitter — para trazer mulheres para suas fileiras e dar estabilidade à criação de famílias a esse autoproclamado estado que, em questão de poucos anos e semeando o terror em seu rastro, já ocupou boa parte do Iraque e da Síria.
A edição mais recente da revista Dabiq, editada digitalmente em vários idiomas pelo EI, inclui, pela primeira vez, uma mensagem para as mulheres e exalta o papel de mães e esposas para conduzir a jihad.
Só na Espanha, já são 18 — de acordo com dados atualizados do Real Instituto Elcano — as mulheres que foram presas como aliciadoras ou aliciadas desde o início da escalada vertiginosa do califado em 2013. Desse total, outras duas haviam se convertido, como uma chilena presa pela polícia de Barcelona, que havia se “apaixonado” por um mujahid (combatente) que vivia na Síria, mas de origem francesa.
A diversidade de contatos é infinita em um mundo global no qual a Internet já é considerada como o sexto continente. Até 2012, não havia nenhuma mulher condenada por jihadismo na Espanha. Agora, há 13 na prisão, segundo o juiz da Audiência Nacional, José Luis Castro.
Na intimidade do seu quarto, Maryam al-Andalusiya vivia outra vida. E, embora ninguém na família suspeitasse de nada, seu irmão confirmou aos agentes que a havia visto assistindo a vídeos de terroristas.
“Está estranha, passa muito tempo no computador”, disse aos investigadores uma colega do instituto Doñana, onde estudou.
A polícia estava “monitorando” Maria Ángeles há quase um ano, depois de notar contatos com endereços de risco. Na segunda-feira passada, saiu de casa com roupa normal. Pegou pegou um ônibus para Sevilha. E, depois, outro para Madri. Chegando na estação de Barajas, já vestia um lenço preto dos pés à cabeça e tinha uma passagem de turista só de ida.
“Daria na mesma se também tivesse reservado a volta, nenhuma voltou”, dizem os investigadores.