Manifestação contra a construção de um centro cultural islâmico nas proximidades do local onde ficavam as torres do World Trade Center, em agosto de 2010| Foto: Creative Commons

Tolerância

Estados Unidos incluem estrangeiros, diz cientista

"O mundo quebrou o estigma e está consciente de que existem diferenças, de que nem todos os muçulmanos são radicais", diz o cientista político Heni Ozi Cukier, que trabalho na ONU.

Junto com essa compreensão, segundo Cukier, "o mundo demanda que os muçulmanos avaliem aspectos culturais e procurem apaziguar pontos de tensão com o Ocidente".

Bush filho pode ter alimentado a imagem do americano intolerante e beligerante. No entanto, a realidade do país é diferente. "Nos EUA, a islamofobia é mais retórica do que prática", diz o cientista político. Para ele, a Europa é mais violenta com os muçulmanos. "Se você nasce europeu em uma família islâmica, será sempre muçulmano. Se nascer nos EUA, você é americano, pouco importa de onde veio ou qual a sua crença religiosa. Os EUA têm um processo institucionalizado de receber, assimilar e incluir grupos", compara Cukier.

Nessa lógica, os americanos estão entre as nações que melhor entendem o que se passa no globo. As sociedades que recebem imigrantes, sejam eles muçulmanos ou não, experimenta mudanças constantes.

O professor Paulo Daniel Farah, da Universidade de São Paulo (USP), cita o antropólogo norte-americano Edward Hall, cujo argumento defendia que o respeito a culturas estranhas era uma forma eficiente de autoconhecimento. Se assim for, o medo do Islã é também um medo de conhecer a si mesmo.

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"É fundamental conhecer o islamismo e respeitá-lo"

Respondendo a perguntas por e-mail à Gazeta do Povo, Paulo Daniel Farah, professor de Língua, Literatura, História e Cultura Árabe e Islâmica na Universidade de São Paulo (USP), fala sobre o Islã e as reações causadas pelo 11 de Setembro. Autor do livro O Islã, parte da série Folha Explica (Publifolha), Farah argumenta que os países que recebem imigrantes muçulmanos precisam reconhecer o caráter multicultural de suas sociedades.

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No 11 de Setembro, a noção de que religiosos radicais eram capazes de se suicidar levando consigo milhares de pessoas inocentes – tudo em nome da fé – acabou criando uma aversão generalizada aos muçulmanos.

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A islamofobia é um sentimento cego e ignorante, uma reação aos absurdos cometidos por um grupo de terroristas que representam um porcentual ridículo do to­­tal de seguidores do Islã (são mais de 1,5 bilhão no mundo todo).

"Na realidade, o islamismo é extremamente diverso e nada tem de monocromático. Reúne pessoas de diferentes origens étnicas, culturais e sociais; são árabes, iranianos, afegãos, turcos, chineses, indonésios, africanos, europeus e americanos", diz o professor Paulo Daniel Farah, autor do livro O Islã (Publifolha), em entrevista à Gazeta do Povo (confira a íntegra nesta página).

Embalada pelo governo de Geor­­ge W. Bush, a mídia internacional logo cunhou a expressão "terrorismo islâmico". O professor de Filosofia Jamil Ibrahim Iskandar considera as aspas da frase anterior um dos maiores equívocos do mundo pós-11 de Setembro, uma "tragédia da mídia americana", para usar suas palavras.

"É um erro epistemológico sem precedentes", diz, argumentando que a mídia acabou desconstruindo a palavra Islã, en­­quanto países islâmicos, na realidade, não pactuam com os terroristas.

O bem contra o mal

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De início, os EUA adotaram o discurso da luta do bem contra o mal e o mal era personificado pelos se­­guidores de Alá. Porém, não de­­moraram a se corrigir. Eles per­­ceberam que a islamofobia criaria um problema e tentaram, de­­pois, explicar e separar os radicais dos não radicais", explica o cientista político Heni Ozi Cukier, que trabalhou no Conselho de Segu­­rança da Organização das Nações Unidas (ONU).

O professor de Relações Exte­­riores Robert Jervis, da Universi­­dade Columbia, diz que a tomada de consciência dos EUA em relação ao Islã foi uma das atitudes corretas do país depois dos atentados de 2001. "Nós acertamos ao melhorar a segurança interna e a inteligência, criando uma cooperação maior entre o FBI e a CIA, ao trabalhar com outros países no contraterrorismo e ao destacar que o Islã não é nosso inimigo", diz Jervis.

Uma pesquisa do Pew Research Center, divulgada semana passada nos EUA, indica que quase me­­tade dos 2,75 milhões de muçulmanos que vivem em território norte-americano sofrem algum tipo de discriminação, mas, apesar disso, dizem estar satisfeitos com a vida que levam.

Embora a islamofobia tenha um lado abominável, Heni Ozi Cukier afirma que ela acabou ex­­pondo um problema até então pouco difundido. "Ela trouxe à to­­na a realidade de alguns segmentos [radicais] da sociedade muçulmana", diz. A cultura muçulmana não pactua com a radicalização, mas, segundo Cukier, não se­­ria correto negar que existem gru­­pos violentos e fanáticos.