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Análise

Sem Mandela, África do Sul deve agora encarar a si mesma

Apenas algumas horas depois do funeral de Nelson Mandela, o céu escureceu na região no sul da África do Sul onde ele foi enterrado, e veio uma chuva forte, que representa um sinal positivo para a democracia jovem, agora sem o seu fundador, de acordo com os locais.

Se no Ocidente nuvens baixas significam problemas, na cultura tradicional sul-africana elas são vistas como uma bênção, símbolo da boa sorte, especialmente num funeral, quando indicam uma passagem tranquila para o mundo dos ancestrais.

Isso não significa que a África do Sul tem um céu claro pela frente. Como uma economia emergente de porte médio, o país ainda sofre com os efeitos da crise financeira global e luta para se recuperar da recessão de 2009, a primeira desde o fim do Apartheid em 1994.

A África do Sul também não se livrou dos problemas peculiares deixados por três séculos de dominação branca - crime, desemprego, educação de má qualidade, desigualdades social e racial.

No entanto, a distância percorrida nas duas décadas desde que Mandela assumiu como o primeiro presidente negro do país até a sua morte, aos 95 anos, em 5 de dezembro, é imensa e irreversível.

A economia triplicou de tamanho, e o número de lares com eletricidade subiu de cerca de 50 por cento das casas para 85 por cento.

Mais ainda, Mandela, que de forma deliberada governou por apenas um mandato, deixou como legado instituições fortes, de uma imprensa livre até um Judiciário independente, e uma Constituição progressista e respeitada.

A sua morte agora deve reforçar um sentimento de que o país de 53 milhões de habitantes deve procurar as próprias suas respostas, em vez de se voltar instintivamente para a agora ausente figura de Mandela ou culpar o apartheid pelos problemas.

"Não podemos mais dizer que a culpa é do apartheid", disse em abril o ex-ministro das Finanças Trevor Manuel, declaração que causou polêmica na época.

"Temos que levantar todas as manhãs e reconhecer que temos responsabilidade. Nós somos responsáveis por nós mesmos."

SEM VILÕES E HERÓIS

Tirando um ou dois problemas, os dez dias de cerimônias, velório e funeral de Madiba, nome de clã de Mandela, passaram com tranquilidade e dignidade.

Contrariando as previsões de uma pequena minoria de brancos de direita, a morte de Mandela não causou histeria em massa, as pessoas compareceram ao trabalho, e os temores de conflitos raciais não se materializaram.

Os mercados não se abalaram, refletindo o quanto a África do Sul já tinha se conformado de que Mandela era mortal, tendo acompanhado o seu envelhecimento.

A sua morte tampouco deixou um vazio na rotina do país, tendo ocorrido uma década depois que ele saiu oficialmente da vida pública, dizendo numa entrevista à imprensa: "Não me chamem, eu chamo vocês."

A sua última aparição pública havia sido em 2010, durante a Copa do Mundo no país.

Dessa forma, o significado da sua morte é mais simbólico do que real.

"É este o momento em que a história da África do Sul de fato começa?", indagou o editoral de uma revista sul-africana. "Nossos vilões míticos e nossos grande heróis se foram, e nós entramos numa outra era."

A ocasião pode ter o seu efeito mais profundo no Congresso Nacional Africano (CNA), o movimento de 101 anos que governa a África do Sul desde o fim do apartheid, mas que agora precisa buscar os votos dos que não viveram o governo de minoria branca.

Com eleições nos próximos meses, o partido viu na morte de Mandela uma oportunidade para aumentar a sua popularidade, apoio que está em declínio mesmo entre a maioria não branca do país.

No entanto, o tiro saiu pela culatra, à medida que o foco em Mandela destacou as diferenças entre ele o atual presidente, atingido por escândalos, Jacob Zuma.

Numa humilhação pública, Zuma foi vaiado na cerimônia em memória a Mandela, na presença de líderes mundiais.

O CNA classificou o episódio como uma "pequena mancha", mas as pesquisas sugerem que a impopularidade de Zuma está crescendo.

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