Alguém poderá dizer, e com muita razão, que ninguém teve suas chances papais mais beneficiadas pela renúncia de Bento XVI que o cardeal Luis Antonio Tagle, arcebispo de Manila, nas Filipinas. Em circunstâncias normais, a idade de Tagle seria vista como um obstáculo insuperável para a eleição. Com 55 anos, ele tem três anos a menos que João Paulo II quando foi eleito em 1978, então um voto para Tagle seria um voto por outro papado longo, talvez de até 30 anos.

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Tagle parece até mais novo. Reza a lenda que nos anos 90, quando o então cardeal Joseph Ratzinger apresentou Tagle a João Paulo II como o novo membro da Comissão Teológica Internacional do Vaticano. O então prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé brincou com o papa, assegurando a ele que o filipino já tinha feito a primeira comunhão.

Especialmente em se tratando de uma figura que muitos cardeais consideram um desconhecido, a escolha por um papa tão jovem parece uma aposta muito arriscada. Mas, agora que foi estabelecido o precedente de uma renúncia papal, o cálculo muda. Tagle poderia dar à Igreja de dez a 15 anos, e depois deixar o papado – uma possibilidade que pode induzir alguns cardeais a olhar para além da idade e considerar outras qualidades.

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Se o fizerem, eles encontrarão muita coisa para gostar sobre o homem que é anunciado como a "grande esperança asiática" para assumir o Trono de Pedro. Um comentarista filipino disse que Tagle tem "a mente de um teólogo, a alma de um músico e o coração de um pastor". Quando veio a notícia da renúncia de Bento XVI, um jornal de negócios filipino nomeou Tagle como seu "Homem do Ano", descrevendo-o como "jovem, despretensioso e sem afetação", um bispo que "mais que compreende as ideias contemporâneas".

Nascido em Manila, Tagle foi seminarista em Quezon City e depois fez seu doutorado na Universidade Católica da América, em Washington. Ele também estudou em Roma antes de voltar às Filipinas para ser pároco e professor. Ele já era visto como estrela em ascensão na Igreja asiática, o que explica sua nomeação, em 1997, para o principal órgão de consultoria doutrinal do Vaticano. Ele foi nomeado bispo de Imus em 2001.

Teologicamente e politicamente, Tagle é considerado moderado. Ele se posicionou veementemente contra a proposta de lei de saúde reprodutiva nas Filipinas, que incluía a promoção do controle de natalidade. Mesmo assim, sua maior preocupação social é a defesa dos pobres, e ele ainda tem um forte interesse na questão ambiental.

Sua tese de doutorado, orientada pelo padre Joseph Komonchak, foi uma abordagem favorável do desenvolvimento da colegialidade no Concílio Vaticano II. Além disso, Tagle trabalhou por 15 anos no conselho editorial do projeto "História do Vaticano II" da Escola de Bolonha, um projeto criado por Giuseppe Alberigo, criticado por uma leitura excessivamente liberal do Vaticano II.

Na diocese de Imus, Tagle ficou famoso por não ter carro e pegar o ônibus para o trabalho todo dia, o que ele descrevia como uma maneira de combater o isolamento que um cargo importante às vezes traz. Ele também era conhecido por convidar mendigos que ficavam perto da catedral para entrar e fazer uma refeição com ele. Uma mulher conta que uma vez saiu para procurar por seu marido, cego, desempregado e alcoólatra, imaginando que o encontraria em algum bar, só para descobrir que ele estava almoçando com o bispo.

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Outro episódio típico de Tagle: pouco tempo depois de sua chegada a Imus, uma pequena capela em um bairro pobre esperava pelo padre que rezaria a missa das 4 da madrugada para um grupo de trabalhadores. Um clérigo jovenzinho apareceu em uma bicicleta barata, vestindo roupas simples e pronto para rezar a missa. Um membro da paróquia, surpreso, reconheceu o bispo e pediu desculpas por não ter preparado uma recepção melhor. Tagle disse que não havia problema algum; ele soube tarde da noite que o padre estava doente, e então resolveu rezar a missa ele mesmo.

Tagle é um comunicador nato, o que faz dele um palestrante requisitado e uma presença constante na imprensa. Ele recebeu elogios entusiasmados por sua performance no Congresso Eucarístico Internacional, em 2008, em Quebec; testemunhas dizem que ele levou um estádio inteiro às lágrimas. Ele é um autêntico prelado do século XXI, que apresenta um programa no YouTube e tem sua própria página no Facebook.

O cardeal filipino também tem tomado frente no esforço para que a Igreja na Ásia tenha uma atitude firme com os abusos cometidos pelo clero. Ele foi um dos relatores em um encontro internacional sobre a crise dos abusos sexuais, realizado no ano passado na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma, e promovido por vários órgãos do Vaticano. "Nossa missão é proteger a dignidade humana, especialmente a dos mais vulneráveis, as crianças", disse na ocasião.

A defesa de Tagle se apoia em três pilares.

Primeiro, ele é um comunicador eficiente, e um missionário em uma época na qual a maior prioridade interna do catolicismo é a nova evangelização. Tagle tem uma qualidade importante: quando ele fala, as pessoas prestam atenção. Durante o Sínodo dos Bispos sobre a nova evangelização, Tagle fez uma intervenção mencionada por muitos participantes como uma das coisas mais impressionantes que eles tinham ouvido no mês inteiro. O filipino afirmou que, no contexto asiático, uma evangelização efetiva pressupõe uma Igreja que é mais humilde, mais simples e que tem uma maior capacidade de silêncio.

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Segundo, Tagle encarna o grande crescimento do catolicismo fora do Ocidente, colocando um rosto nessa forma dinâmica e despreocupada de catolicismo que se espalha pelo Hemisfério Sul. Ele certamente seria um símbolo da Igreja no mundo emergente e, considerando suas qualidades intelectuais e pessoais, não seria de uma simpatia oca.

Terceiro, Tagle agora tem a experiência de administrar uma diocese grande e complexa como a de Manila. Apesar de estar no cargo apenas desde 2011, Tagle normalmente é bem avaliado em termos de sua capacidade de fazer as coisas funcionarem direito.

Já os fatores que atrapalham a candidatura de Tagle são quatro.

Primeiro, sua idade ainda é um problema. Alguns cardeais não gostam da ideia de um papa que renuncie, e consideram que isso ou tira um pouco da aura do cargo (como uma ex-autoridade do Vaticano me disse, "agora ele [Bento XVI] pode até ser o arcebispo de Canterbury", uma referência ao líder da Igreja Anglicana), ou pode ser visto como um reconhecimento indireto de seu fracasso. De qualquer modo, a lei da Igreja diz que ninguém pode forçar um papa a renunciar, então a decisão é toda do próximo pontífice. Assim, a hipótese de renúncia não será suficiente para que muitos cardeais ignorem a juventude de Tagle.

Segundo, ele tem experiência zero no Vaticano a não ser por um ou outro Sínodo. E seu jeito tranquilo e comportamento humilde podem ser vistos por cardeais como inadequados para a limpeza que muitos acreditam ser a tarefa do próximo papa dentro do Vaticano. Mesmo para aqueles que não aderiram a teorias da conspiração – como a reportagem sensacionalista do La Repubblica segundo a qual um lobby gay estaria envolvido no "Vatileaks" e influenciou na renúncia do papa –, fica a impressão de que Bento XVI nem sempre colocou as pessoas certas nos lugares certos, e de que houve pouca cobrança por desempenhos medíocres. Como um veterano observador do Vaticano descreveu na sequência do desastre midiático do bispo revisionista em 2009, em vez de uma carta papal pedindo desculpas, "deveria ter havido uma fila de cabeças no alto de postes da Praça de São Pedro até o Castelo Sant'Angelo. Isso eles teriam entendido". Alguns podem se perguntar se Tagle seria capaz de falar grosso. Ele poderia tranquilizar eleitores ao dar dicas de quem ele estaria inclinado a escolher como secretário de Estado, mas isso seria quase o equivalente de fazer campanha para o papado.

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Terceiro, alguns cardeais podem ver Tagle como inclinado demais para a esquerda (considerando como o "centro" é definido dentro do Colégio de Cardeais), especialmente graças à sua conexão com a história do Vaticano II coordenada por Alberigo.

Quarto, e mais evidente, alguns cardeais podem olhar para Tagle e ver nele um clérigo promissor, mas alguém que ainda não está pronto para o horário nobre. Daria para imaginar um bom número de cardeais sussurrando uns para os outros: "Ele daria um grande papa... lá para frente".

Tradução: Marcio Antonio Campos

* John Allen Jr. é um dos mais experientes vaticanistas da atualidade. Jornalista do site norte-americano National Catholic Reporter (http://ncronline.org/), ele também colabora com o canal de televisão CNN e com a National Public Radio norte-americana. Allen é autor de vários livros sobre a Igreja Católica, incluindo duas biografias de Bento XVI, uma delas escrita quando Joseph Ratzinger ainda era cardeal. Duas de suas obras foram traduzidas para o português: Opus Dei, mitos e realidade, de 2005, e Conclave, de 2002, em que ele descreve os rituais que envolvem a sucessão do papa e apontava vários favoritos para assumir o posto após a morte de João Paulo II.

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