Vai aí uma dica para quem quiser bolar uma equipe de super-heróis brasileiros e, quem sabe, faturar tanto quanto Stan Lee, o criador do Quarteto Fantástico. Que tal batizá-la de "Liga Quase Invisível"? Foi assim que um trio de pesquisadores resolveu apelidar uma curiosa associação entre pequenos peixes e camarões encontrada em vários rios do país. Os bichos "desenvolveram" corpos transparentes ou muito bem camuflados e costumam andar juntos, como forma de tentar iludir seus predadores.

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É preciso lembrar que talvez haja também um desagradável jeitinho brasileiro na superequipe aquática. É que os peixes podem ter assumido sua forma transparente para que fossem confundidos com os camarões, que são mais numerosos que eles e também parecem ser presas mais duronas. Assim, um dos membros da Liga Quase Invisível poderia estar se aproveitando dos demais para fugir dos caçadores.

"Os peixes parecem ser os maiores beneficiados", diz a pesquisadora Lucélia Nobre Carvalho, que atualmente faz seu doutorado no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), em Manaus. "Mas não se pode esquecer que parte da proteção conseguida com essa estratégia vem do efeito de confusão que ela causa no predador, de forma que todos podem estar lucrando também." Carvalho é uma das responsáveis por estudar o comportamento da Liga Quase Invisível, junto com Jansen Zuanon, também do Inpa, e Ivan Sazima, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A união faz o sumiço

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A associação entre os bichinhos aquáticos é um caso particularmente curioso de um fenômeno já bem conhecido. Animais de espécies diferentes que habitam o mesmo ambiente e são igualmente vulneráveis à predação tendem a adotar aspectos parecidos (e capazes de escondê-las) ao longo do tempo, já que isso aumenta as chances de que elas consigam se reproduzir e deixar descendentes.

O trio de pesquisadores encontrou três conjuntos de espécies em que peixinhos e camarões parecem ter adotado essa estratégia. A primeira está presente na bacia do rio Negro, estado do Amazonas; a segunda ocorre tanto no Tocantins quanto em Roraima, envolvendo as mesmas espécies; e a terceira foi achada num córrego de Ubatuba, litoral paulista.

Nos dois últimos casos, a associação parece ser uma estratégia temporária dos peixes durante migrações rio acima. Parece funcionar um bocado bem, já que os peixes têm praticamente o mesmo tamanho e coloração (aliás, falta dela, já que são transparentes) que os crustáceos, e fica praticamente impossível localizá-los em meio ao grande número de camarões.

Já o conjunto de espécies da bacia do rio Negro vive num igapó (área de mata alagada) e apresenta uma associação ainda mais sofisticada. Um dos peixes, o Microphilypnus amazonicus, é parcialmente translúcido e tem as escamas pintadas, mesclando-se ao fundo coberto de folhas, barro e areia do igapó; as três espécies de camarão da "equipe", entre elas a Palaemonetes carteri, também vivem no fundo e são transparentes, mas possuem marcas douradas ou castanhas no corpo; e a piaba Priocharax ariel costuma nadar com mais liberdade pela coluna d'água e é transparente. Todos, porém, têm mais ou menos o mesmo tamanho.

Não é por acaso que essa última associação também parece ser a mais duradoura, aparecendo o ano inteiro: o trio apresenta uma espécie de gradiente complementar de estratégias de defesa, com os camarões servindo como uma espécie de transição entre a camuflagem de fundo do M. amazonicus e a transparência móvel da piaba. É como se, atuando "juntos" - embora quase certamente de forma inconsciente - os bichos aumentassem sua chance de escapar dos predadores.

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Os pesquisadores, porém, acreditam que o truque possa funcionar de duas maneiras diferentes. Uma delas é conhecida pelo termo "mimetismo social": nesse caso, é a simples semelhança entre os vários membros do conjunto que atrapalha o predador. Ficaria difícil distinguir os indivíduos e atacá-los de forma eficaz.

A outra possibilidade leva o nome de "mimetismo batesiano". "Ele se baseia no fato de que uma das espécies do conjunto é considerada mais nociva pelo predador", explica Carvalho. Justamente essa espécie mais perigosa seria "copiada" pelas demais. No caso, diz a pesquisadora do Inpa, os camarões serviriam de "modelo", já que podem usar suas pinças contra os predadores, atacando-os. Além disso, possuem uma estratégia de fuga muito eficiente, na qual dobram seu abdômen e dão um salto para trás. Sem conseguir divisar os peixes no meio do enxame de camarões, os predadores tenderiam a deixar o grupo em paz.