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Os Estados Unidos vão comprar 500 milhões de doses da vacina Pfizer contra a Covid-19 para serem compartilhadas por meio da aliança global Covax para doação a 92 países de baixa renda e à União Africana no próximo ano. A informação é da imprensa americana, que afirmou que o presidente Joe Biden deve fazer esse anúncio na quinta-feira, em um discurso antes do início da cúpula do G7.
Segundo jornais americanos, 200 milhões de doses - o suficiente para proteger totalmente 100 milhões de pessoas - serão compartilhados este ano, com o restante a ser doado no primeiro semestre de 2022.
Biden havia dito nesta quarta-feira, 9, mais cedo, que anunciará um plano de vacina para o mundo enquanto se dirige à Europa para sua primeira viagem ao exterior como presidente. "Eu tenho um (plano) e irei anunciá-lo", disse Biden a repórteres antes de embarcar no avião presidencial Força Aérea Um.
A estratégia de compartilhamento de vacina contra o coronavírus do governo Biden foi criticada por congressistas democratas e alguns integrantes da área da saúde como "tímida". O que gerou uma enxurrada de esforços da Casa Branca para responder às críticas, com novos anúncios para reforçar o plano esperado antes da ida do presidente para a cúpula do G7 no Reino Unido neste fim de semana.
"Os EUA estão trabalhando com nossos parceiros do G7 em um esforço maior para ajudar a acabar com a pandemia, para que as democracias do mundo ajudem as pessoas em todos os lugares. E teremos mais a dizer sobre isso na reunião do G7", disse Jake Sullivan, conselheiro de Segurança Nacional de Biden.
A Casa Branca tem explorado maneiras de aumentar o fornecimento global de vacinas, e pessoas familiarizadas com os planos dizem que um anúncio pode ser feito ainda esta semana.
A cúpula do G7
A primeira viagem internacional de Biden como presidente apresenta vários desafios diplomáticos para a Casa Branca, que busca restaurar a presença internacional dos Estados Unidos em meio a uma pandemia que abalou o planeta.
Mesmo com o recuo do surto nos Estados Unidos, as infecções aumentaram em países em desenvolvimento que não têm vacinas, o que levou alguns especialistas em saúde pública e autoridades a acusar os países ricos de acumular doses e promover o "apartheid de vacinas". Menos de 2% das pessoas na África receberam pelo menos uma dose de uma vacina contra o coronavírus, em comparação com mais de 50% nos Estados Unidos e no Reino Unido.
Mas Biden, como outros líderes políticos, teve de se equilibrar entre a necessidade de vacinar o mundo enquanto precisava imunizar seu próprio país.
A decisão de Biden de apoiar a quebra temporária das patentes para fabricação de vacinas contra o coronavírus para impulsionar a produção no mundo em desenvolvimento criou novas tensões com a União Europeia, que criticou a ideia como errada e inadequada porque não aumentaria a produção de vacinas. A UE, na semana passada, ofereceu uma contraproposta que preservaria a propriedade intelectual das empresas farmacêuticas na maioria dos casos, estabelecendo um confronto com os Estados Unidos.
Enquanto os países do G7 se preparam para se reunir, mais de 200 figuras proeminentes - incluindo mais de 100 ex-líderes governamentais - pediram que os EUA gastassem US$ 44 bilhões para ajudar a vacinar países de baixa renda.
"É hora de tomar uma grande decisão", disse Gordon Brown, o ex-primeiro-ministro do Reino Unido, que pediu aos mais ricos países do grupo que concordassem com um plano de financiamento global, citando um número de mortos que muitas vezes chega a 10 mil por dia. "Seria uma falha moral catastrófica e imperdoável se não tivéssemos um plano para vacinar o mundo neste fim de semana."
Biden também está enfrentando pressão dos congressistas democratas, que elogiaram o compromisso do presidente de compartilhar 80 milhões de doses neste mês, mas alertaram que rivais como China e Rússia usaram acordos de vacinas com dezenas de países para defender seus próprios interesses.
Quatro democratas apresentaram uma legislação na terça-feira, 8, que pretende ajudar a vacinar pelo menos 60% das pessoas que vivem em países elegíveis para receber a vacina através da Covax, a iniciativa da OMS para distribuir a vacina. A proposta de US$ 34 bilhões criaria um novo programa para coordenar a resposta à pandemia dos EUA, baseado no programa global de combate à HIV/AIDS iniciado no governo George W. Bush, de acordo com o texto legislativo compartilhado com o The Washington Post.
A Casa Branca reconheceu que sua resposta atual é insuficiente para acabar com a pandemia, com Sullivan e outras autoridades dizendo que estão buscando planos para doar mais doses dos EUA, ajudar a aumentar a capacidade de produção global e tomar outras medidas para liderar a resposta mundial ao coronavírus.
O governo também reagiu com uma enxurrada de atividades diplomáticas antes da cúpula, com Biden na semana passada delineando seu plano inicial de compartilhar 25 milhões de doses globalmente e o Departamento de Estado na terça-feira reduziu os alertas de viagens para dezenas de nações em meio a demandas de aliados.
Autoridades dos EUA dizem que estão mudando depois de priorizar uma resposta doméstica que vacinou mais da metade dos americanos e fez com que os casos despencassem.
"Os EUA estão entrando no G7 em uma posição boa", disse Jeff Zients, coordenador do coronavírus da Casa Branca, em um comunicado. "O presidente usará esse impulso para reunir as democracias do mundo em torno da resolução desta crise globalmente, com os Estados Unidos liderando o caminho para criar o arsenal de vacinas que será fundamental em nossa luta global contra a Covid-19."
Os funcionários do G7 têm se tornado cada vez mais ativos na questão do compartilhamento de vacinas, prometendo ações ousadas mas sem apresentar planos detalhados. O primeiro-ministro britânico Boris Johnson disse no fim de semana que exortaria seus colegas a "enfrentar o maior desafio da era pós-guerra" e vacinar "o mundo até o final do ano que vem" - sem mencionar precisamente como.
Com o aumento da lacuna de disponibilidade de vacinas entre os "ricos" e os "pobres", o mundo deseja e precisa que elas produzam grandes resultados, disse Stephen Morrison, diretor do Global Health Policy Center do Center for Strategic and International Studies.
"O argumento está sendo vencido em um nível conceitual", disse Morrison. "Mas, além de vencer a discussão e ter um acordo conceitual, está a questão: 'Quem faz o quê?'". Dias antes do encontro, tudo isso ainda parecia pairar no ar.
"Essa discussão ocorre no G7 porque esses são os países que têm vacinas excedentes", disse Mara Pillinger, associada sênior em política de saúde global e governança do Instituto O'Neill de Legislação Sanitária Nacional e Global da Universidade de Georgetown.
No entanto, não está claro se o grupo compartilha uma visão comum sobre o que fazer a seguir. Parte do problema é que os membros estão em estágios diferentes de seus próprios esforços de vacinação. Aproximadamente 62% da população do Canadá, 60% da população do Reino Unido e 51% da população dos EUA receberam pelo menos uma dose da vacina, de acordo com estimativas do Our World in Data. Alemanha, Itália e França têm entre 40% e 45% dos residentes que recebem uma dose. No Japão, cerca de 11% das pessoas já tomaram uma dose.
Especialistas em saúde pública global divulgaram listas de desejos, e John Nkengasong, diretor dos Centros Africanos para Controle e Prevenção de Doenças, pediu dois compromissos específicos.
"Um é redistribuir as doses excessivas de vacinas que estão disponíveis imediatamente, para que possamos colocá-las nas mãos das pessoas na África", disse ele, citando as taxas de vacinação atrasadas do continente. "E o segundo é trabalhar com a África e outras partes do mundo para começar a descentralizar e regionalizar nossa capacidade de fabricar vacinas, diagnósticos e terapêuticas."
Nkengasong também ecoou um apelo de outros especialistas que pediram ao G7 para criar uma nova organização coordenada semelhante ao Fundo Global de Combate à Aids, Tuberculose e Malária, que as nações ricas ajudaram a criar quase duas décadas atrás para combater o HIV/AIDS em todo o mundo.
"Esta é a crise mais severa de nosso tempo", acrescentou Nkengasong. "E a história vai se lembrar de nós se fizermos as coisas certas e rapidamente."
Brown, o ex-primeiro-ministro do Reino Unido, compartilhou essa avaliação, dizendo que espera que os Estados Unidos deem um passo à frente "como sempre fazem em momentos críticos e decisivos".
"Este é um ponto da virada", disse Brown. "Vamos provar nos próximos meses se a cooperação internacional vai funcionar ou se é inadequada e insuficiente."