A administração Trump está se preparando para adicionar a Venezuela à sua lista de patrocinadores do terrorismo, no que pode ser uma grande investida do governo dos Estados Unidos contra a ditadura socialista de Nicolás Maduro. As informações são de autoridades americanas que falaram com o Washington Post sob condição de anonimato e de e-mails internos do governo.
A lista é reservada aos governos acusados de fornecer repetidamente "apoio a atos de terrorismo internacional" e inclui apenas Irã, Coreia do Norte, Sudão e Síria.
Parlamentares republicanos liderados pelo senador Marco Rubio, republicano da Flórida, pressionaram pela designação, citando supostos vínculos da Venezuela com o Hezbollah, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) e outros grupos.
Autoridades dos EUA se recusaram a dizer se uma decisão final sobre o assunto havia sido tomada, mas nos últimos dias o Departamento de Estado pediu feedback de várias agências, incluindo do Departamento de Saúde e Serviços Humanos (HHS), do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), que faz parte do Departamento de Saúde, e da Agência dos EUA para o Desenvolvimento Internacional (Usaid).
Um porta-voz do Departamento de Estado se recusou a comentar sobre a decisão pendente, dizendo que as deliberações são uma "questão hipotética".
Boicote ao petróleo
Rubio, cubano-americano que organizou uma carta no final de setembro pedindo a inclusão da Venezuela na lista, clama por uma postura dura dos EUA em relação ao país de Maduro, um antigo aliado do regime castrista em Cuba.
O governo Trump impôs sanções a várias pessoas próximas a Maduro, acusando a primeira-dama, Cília Flores, o ministro da Defesa, Vladimir Padrino Lopez, a vice-presidente, Delcy Rodriguez, e outros aliados de ajudar o líder socialista a "saquear" a riqueza da nação.
Autoridades disseram que outras medidas estão sendo consideradas, incluindo um embargo ao petróleo venezuelano. Apesar da queda acentuada nas exportações de petróleo nos últimos anos, a Venezuela é o quarto maior fornecedor estrangeiro para os Estados Unidos, que continua sendo o maior comprador de petróleo venezuelano.
Adam Isacson, especialista em relações militares entre os EUA e países da América Latina, disse que a designação de terrorismo pode dar impulso a qualquer pressão por um boicote ao petróleo. Republicanos no Texas e na Louisiana, que abrigam instalações para o refino do petróleo de alto teor de enxofre da Venezuela, argumentaram contra tal boicote. "Uma designação de patrocinador do terrorismo tornará suas vidas mais complicadas", disse Isacson.
Analistas divididos
Observadores internacionais estão divididos sobre a decisão de designar a Venezuela como um patrocinador estatal do terrorismo. Alguns dizem que isso poderia ser uma pressão útil contra o regime cada vez mais autoritário de Maduro, enquanto outros expressam preocupações de que isso poderia dar base ao discurso anti-EUA de Maduro ou ser usado como pretexto para uma intervenção militar.
O presidente Donald Trump, publicamente e em particular, levantou a possibilidade de ação militar norte-americana na Venezuela, embora seus assessores o tenham dissuadido.
Para David Smilde, membro sênior da ONG que atua em prol dos direitos humanos Washington Office, muitos analistas próximos ao governo dos EUA acham que a intervenção militar seria eficaz ou que uma ameaça de força credível faria com que o governo venezuelano cedesse. Mas tais ameaças, segundo ele, "contribuem para a unidade e coerência do governo Maduro e enfraquecem a organização e a unidade da oposição".
"Desde que o presidente Trump sugeriu pela primeira vez uma opção militar em agosto de 2017, a oposição venezuelana desmoronou".
Leia mais: O que falta para a oposição retirar Maduro do poder
Outros analistas expressaram apoio à adoção de uma linha mais dura contra Maduro, que chegou ao poder em 2013, prendeu opositores políticos e assumiu praticamente todo o poder legislativo e judicial no país.
"Existem vários outros governos que você poderia dizer que estão envolvidos em mais formas de terrorismo que têm muito mais impacto", disse William Brownsfield, ex-embaixador dos EUA na Venezuela e membro sênior do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. "Mas isso é uma justificativa para ir atrás de outros governos, não uma justificativa para dizer que não vá atrás da Venezuela".
"Pode-se argumentar que é um passo positivo em termos de maior pressão sobre o regime de Maduro", concluiu ele.
Preocupação com a saúde
A medida pode limitar a assistência dos EUA à Venezuela e proibir as transações financeiras enquanto o país sofre com a hiperinflação e a escassez extrema de alimentos e remédios que resultaram na fuga de milhões de pessoas para os países vizinhos. Muitos venezuelanos culpam Maduro pela corrupção desenfreada em todo o governo e pela má gestão da economia.
O sistema de saúde do país foi praticamente destruído, permitindo que ressurgissem doenças anteriormente erradicadas, como o sarampo, que matou 64 pessoas entre junho de 2017 e setembro de 2018, e a difteria, que acabou com a vida de mais de 200 pessoas entre julho de 2016 e setembro de 2018, de acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde.
Especialistas em saúde pública alertaram para picos nos casos de malária e tuberculose e uma quase absoluta indisponibilidade de tratamento anti-retroviral para pessoas com HIV na Venezuela. Níveis crescentes de desnutrição agravam a crise de saúde, tornando os venezuelanos mais suscetíveis a doenças infecciosas e mais propensos a complicações quando estão doentes.
O tópico de um telefonema entre as autoridades dos EUA foi o crescente surto de sarampo na Venezuela, uma infecção respiratória extremamente contagiosa causada por um vírus, que se espalhou para o Brasil, Argentina, Colômbia, Equador e Peru. O Brasil, por exemplo, está lidando com mais de 10 mil suspeitas de infecções apenas no Amazonas.
Os programas que podem ser afetados pela designação de terrorismo incluem o apoio dos EUA à prevenção global do HIV/AIDS, vacinas de emergência e treinamento do pessoal de saúde pública, de acordo com as fontes ouvidas pelo Washington Post. A maior parte do apoio financeiro dos EUA à Venezuela ocorre por meio da Organização Pan-Americana da Saúde, um organismo da ONU.
Brownsfield disse que o presidente poderia compensar alguns dos efeitos humanitários negativos da designação de patrocinador do terrorismo através de renúncias.
"Acredito que a lei concede ao presidente a autoridade para isentar ou renunciar provisões da lei para permitir assistência humanitária como comida ou remédios", disse ele.
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