As relações entre os Estados Unidos e o Irã têm sido complicadas há décadas - pelo menos desde que os EUA ajudaram a derrubar o primeiro-ministro democrático Mohammed Mossadegh em agosto de 1953. Os EUA então apoiaram o longo e repressivo reinado do xá no Irã, cujos serviços de segurança brutalizaram cidadãos iranianos por décadas.
Os dois países têm sido particularmente hostis um ao outro desde que estudantes iranianos tomaram a embaixada dos EUA em Teerã em novembro de 1979, resultando em, entre outras consequências, sanções econômicas e o rompimento das relações diplomáticas formais entre as nações. Desde 1984, o Departamento de Estado dos EUA tem o Irã na lista de "estados patrocinadores do terrorismo", alegando que o governo iraniano fornece treinamento, dinheiro e armas a terroristas.
Alguns dos principais eventos nas relações entre EUA e Irã destacam as diferenças entre os pontos de vista das nações, mas outros apresentaram oportunidades reais de reconciliação.
1953: EUA derrubam Mossadegh
Em 1951, o Parlamento iraniano escolheu um novo primeiro-ministro, Mohammad Mossadegh, que levou os parlamentares a votarem a favor da apropriação da Companhia Anglo-Iraniana de Petróleo, expulsando os proprietários britânicos da empresa e dizendo que queriam transformar os lucros do petróleo em investimentos para o povo iraniano. Os EUA temiam interrupções no fornecimento global de petróleo e que o Irã se tornasse vítima da influência soviética. Os britânicos temiam a perda do petróleo iraniano barato.
Incapaz de resolver a disputa, o presidente Dwight Eisenhower decidiu que o melhor para os EUA e o Reino Unido era se livrar de Mossadegh. A Operação Ajax, uma operação conjunta entre a CIA e o Reino Unido, convenceu o xá do Irã, o monarca do país, a destituir Mossadegh e expulsá-lo do cargo à força. Mossadegh foi substituído por um primeiro-ministro muito mais amigo do Ocidente, escolhido a dedo pela CIA.
1979: Revolucionários expulsam o xá e fazem reféns
Após mais de 25 anos de relativa estabilidade nas relações EUA-Irã, o povo iraniano estava ficando insatisfeito com as condições sociais e econômicas que se desenvolveram sob o governo ditatorial do xá Mohammad Reza Pahlavi.
Pahlavi usou a ajuda americana para enriquecer e financiar as forças armadas, enquanto muitos iranianos viviam na pobreza. A discordância era com frequência violentamente reprimida pelo Savak, o serviço de segurança do xá. Em janeiro de 1979, o xá deixou o Irã, aparentemente para procurar tratamento contra o câncer. Duas semanas depois, o aiatolá Ruhollah Khomeini voltou do exílio no Iraque e liderou uma iniciativa para abolir a monarquia e proclamar um governo islâmico.
Em outubro de 1979, o presidente americano Jimmy Carter concordou em permitir que o xá viesse aos EUA para um tratamento médico avançado. Estudantes iranianos revoltados invadiram a Embaixada dos EUA em Teerã em 4 de novembro, fazendo reféns 52 americanos. Isso convenceu Carter a romper as relações diplomáticas dos EUA com o Irã em 7 de abril de 1980.
Duas semanas depois, as forças armadas dos EUA lançaram uma missão para resgatar os reféns, mas fracassaram. Quedas de aeronaves no deserto iraniano mataram oito militares dos EUA.
O xá morreu no Egito em julho de 1980, mas os reféns não foram libertados até 20 de janeiro de 1981, após 444 dias de cativeiro.
1980-1988: EUA tacitamente se aliam ao Iraque
Em setembro de 1980, o Iraque invadiu o Irã, uma escalada das rivalidades regionais e diferenças religiosas dos dois países: o Iraque era governado por muçulmanos sunitas, mas tinha uma população majoritária muçulmana xiita; o Irã era liderado e povoado principalmente por xiitas.
Os EUA estavam preocupados com a possibilidade de o conflito limitar o fluxo de petróleo do Oriente Médio e queriam garantir que o conflito não afetasse seu aliado próximo, a Arábia Saudita.
Os EUA apoiaram o líder iraquiano Saddam Hussein em sua luta contra o regime iraniano antiamericano. Como resultado, os EUA praticamente ignoraram o uso "quase diário" de armas químicas pelo Iraque contra o Irã.
As autoridades americanas moderaram sua oposição habitual a essas armas ilegais e desumanas porque o Departamento de Estado dos EUA "não desejava cair no jogo do Irã alimentando sua propaganda contra o Iraque". Em 1988, a guerra terminou em um impasse, com um total combinado de mais de 500 mil militares mortos e 100 mil civis mortos de ambos os lados.
1981-1986: EUA secretamente vendem armas ao Irã
Os EUA impuseram um embargo de armas depois que o Irã foi designado patrocinador do terrorismo em 1984. Isso deixou os militares iranianos, no meio de sua guerra com o Iraque, desesperados por armas, aeronaves e peças de veículos para continuar combatendo.
O governo Reagan decidiu que o embargo provavelmente levaria o Irã a buscar apoio da União Soviética, rival dos EUA na Guerra Fria. Em vez de encerrar formalmente o embargo, as autoridades dos EUA concordaram em vender secretamente armas para o Irã a partir de 1981. Mais tarde, as transações foram justificadas como incentivos para ajudar o Irã a convencer os militantes a libertar reféns dos EUA que estavam sendo mantidos no Líbano.
O último carregamento, de mísseis anti-tanque, foi em outubro de 1986. Em novembro daquele ano, uma revista libanesa expôs o acordo. Essa revelação provocou o escândalo Irã-Contras nos EUA, no qual se descobriu que autoridades do governo Reagan coletaram dinheiro do Irã para as armas e enviaram ilegalmente esses fundos a rebeldes anti-socialistas - os Contras - na Nicarágua.
1988: A Marinha dos EUA abate o voo 655 da Iran Air
Na manhã de 8 de julho de 1988, o USS Vincennes, um cruzador de mísseis guiados que patrulhava as águas internacionais do Golfo Pérsico, entrou nas águas territoriais iranianas durante um conflito com embarcações armadas iranianas.
Durante ou logo após a troca de tiros, a tripulação do Vincennes confundiu um jato civil de passageiros da Airbus com um caça F-14 iraniano. Eles abateram a aeronave, matando todas as 290 pessoas a bordo.
Os EUA disseram que foi um "acidente trágico e lamentável", mas o Irã acreditava que a queda do avião tinha sido intencional. Em 1996, os EUA concordaram em pagar US$ 131,8 milhões em compensação ao Irã.
1997-1998: Os EUA buscam contato
Em agosto de 1997, um reformista moderado, Mohammad Khatami, venceu as eleições presidenciais do Irã.
O presidente dos EUA, Bill Clinton, percebeu uma oportunidade para melhorar as relações entre os dois países. Ele enviou uma mensagem a Teerã através do embaixador suíço no país, propondo conversas diretas entre os governos.
Pouco tempo depois, no início de janeiro de 1998, Khatami deu uma entrevista à CNN, na qual expressou "respeito pelo grande povo americano", denunciou o terrorismo e recomendou um "intercâmbio de professores, escritores, acadêmicos, artistas, jornalistas e turistas" entre os Estados Unidos e o Irã.
No entanto, o líder supremo aiatolá Ali Khamenei não concordava, e portanto as aberturas mútuas não deram muito resultado durante o mandato de Clinton. Em 2000, a secretária de Estado dos EUA Madeleine Albright conversou com o Conselho Americano-Iraniano, com sede nos EUA, e reconheceu o papel do governo americano na deposição de Mossadegh em 1953, mas pontuou suas declarações com críticas à política doméstica iraniana.
Em seu discurso do Estado da União de 2002, o presidente George W. Bush caracterizou o Irã, o Iraque e a Coreia do Norte como constituintes de um "Eixo do Mal" que apoia o terrorismo e busca armas de destruição em massa, deteriorando ainda mais as relações.
2002: Programa nuclear do Irã acende alertas
Em agosto de 2002, um grupo rebelde exilado anunciou que o Irã estava trabalhando secretamente em armas nucleares em duas instalações que não haviam sido reveladas publicamente anteriormente.
Isso era uma violação dos termos do Tratado de Não-Proliferação Nuclear, assinado pelo Irã, que exige que os países divulguem suas instalações relacionadas a desenvolvimentos nucleares a inspetores internacionais.
Um desses locais anteriormente secretos, Natanz, abrigava centrífugas para enriquecimento de urânio, que poderia ser usado em reatores nucleares civis ou enriquecido ainda mais para armas.
A partir de meados de 2005, invasores cibernéticos dos governos dos EUA e de Israel juntos atacaram as centrífugas de Natanz com um software malicioso personalizado que ficou conhecido como Stuxnet.
Essa ação, que desacelerou o programa nuclear do Irã, foi uma das muitas tentativas norte-americanas e internacionais - a maioria delas sem sucesso a longo prazo - de reduzir o progresso do Irã na construção de uma bomba nuclear.
2003: O Irã escreve para o governo Bush
Em maio de 2003, altas autoridades iranianas entraram em contato discretamente com o Departamento de Estado através da embaixada suíça no Irã, buscando "um diálogo 'em respeito mútuo'", abordando quatro grandes questões: armas nucleares, terrorismo, resistência palestina e estabilidade no Iraque.
Os linha-dura do governo Bush não estavam interessados em nenhuma grande reconciliação, embora o secretário de Estado Colin Powell tenha favorecido o diálogo e outras autoridades se reuniram com o Irã para discutir a al-Qaeda.
Quando o radical iraniano Mahmoud Ahmadinejad foi eleito presidente do Irã em 2005, a oportunidade morreu. No ano seguinte, Ahmadinejad fez sua própria abertura a Washington em uma carta de 18 páginas ao presidente Bush. A carta foi amplamente rejeitada; um alto funcionário do Departamento de Estado me disse em termos profanos que ela não significava nada.
2015: Acordo nuclear com o Irã é assinado
Após uma década de tentativas frustradas de conter as ambições nucleares do Irã, o governo Obama adotou uma abordagem diplomática direta a partir de 2013.
Dois anos de negociações secretas e diretas inicialmente bilaterais entre os EUA e o Irã e, posteriormente, com outras potências nucleares culminaram no Plano de Ação Conjunto Global, comumente chamado de acordo nuclear do Irã.
O acordo foi assinado por Irã, EUA, China, França, Alemanha, Rússia e Reino Unido em 2015. Ele limitava severamente a capacidade do Irã de enriquecer urânio e determinava que inspetores internacionais monitorassem e garantissem que o Irã estivesse em conformidade com o acordo.
Em troca, o Irã recebeu alívio das sanções econômicas internacionais e dos EUA. Embora os inspetores certificassem regularmente que o Irã estava cumprindo os termos do acordo, em maio de 2018, o presidente Donald Trump retirou os EUA do acordo.
2020: Drones dos EUA matam o major-general iraniano Qasem Suleimani
Em 3 de janeiro de 2020, por ordem do presidente Trump, um drone americano disparou um míssil que matou o major-general Qasem Suleimani, líder da Força Quds de elite do Irã, enquanto ele se preparava para deixar o aeroporto de Bagdá. Suleimani é descrito por analistas como o segundo homem mais poderoso do Irã, depois do líder supremo aiatolá Khamenei.
Na época, o governo Trump afirmou que ele estava coordenando um ataque iminente contra ativos dos EUA na região, mas as autoridades não forneceram evidências claras para apoiar essa alegação.
O Irã respondeu lançando mísseis balísticos que atingiram duas bases americanas no Iraque. Enquanto o Irã estava em estado de alerta máximo, preparando-se para uma possível retaliação dos EUA, seus militares derrubaram acidentalmente um avião civil ucraniano que partia de Teerã para Kiev, matando todas as 176 pessoas a bordo.
*Jeffrey Fields é professor associado de Relações Internacionais na University of Southern California - Dornsife College of Letters, Ars and Sciences
Artigo original em inglês no site The Conversation.
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