O governo do presidente americano Donald Trump alertou, nesta terça-feira (6), a Rússia, a China e "qualquer pessoa" que continue apoiando o ditador venezuelano Nicolás Maduro, que está preparado para penalizá-los como parte do novo bloqueio econômico contra a Venezuela, anunciado na segunda-feira.
"Tanto para a Rússia quanto para a China, dizemos que o seu apoio ao regime de Maduro é intolerável, particularmente para o regime democrático que substituirá Maduro", disse o conselheiro de segurança nacional da Casa Branca, John Bolton, em um discurso durante reunião dos países do Grupo de Lima, Peru, nesta terça-feira. Assim como o Brasil, os Estados Unidos e outros países da América Latina e da Europa reconhecem o líder da oposição Juan Guaidó como presidente interino e pedem novas eleições democráticas na Venezuela.
Descrevendo o regime de Maduro como enormemente corrupto e responsável por "pessoas morrendo de fome nas ruas" na Venezuela, Bolton disse: "Você tem que se perguntar… quem apoiaria tal tirano? Basta olhar para Cuba, Rússia, China e Irã".
"Dizemos novamente à Rússia, e especialmente àqueles que controlam suas finanças: não aumente uma aposta ruim. Para a China, que já está desesperada para recuperar suas perdas financeiras", incluindo bilhões em empréstimos à Venezuela, "a rota mais rápida para ser restituído é apoiar um novo governo legítimo ", disse ele.
A medida americana proíbe empresas e indivíduos de fazer negócios com o governo Maduro e suas figuras mais próximas. Trata-se da primeira ação do tipo no Hemisfério Ocidental em mais de três décadas. "Enviamos uma mensagem a terceiros que queiram fazer negócios com o regime de Maduro: ajam com extrema cautela", afirmou Bolton. "Não têm por que arriscar seus interesses comerciais com os Estados Unidos para se beneficiar de um regime corrupto e agonizante", complementou.
Embora o decreto não seja um embargo comercial absoluto e não atinja o setor privado venezuelano, representa a ação mais dura dos EUA para retirar Maduro desde que o governo do presidente Donald Trump reconheceu o líder oposicionista Juan Guaidó como presidente legítimo da Venezuela, em janeiro.
Alguns países europeus, como a Espanha com sua petroleira Repsol e a França com a companhia aérea Air France, continuam a ter operações na Venezuela e poderiam ter confiscado seus ativos nos Estados Unidos, a menos que cortem relações com o governo de Maduro. A Índia e a China são ainda os principais compradores do petróleo da estatal PDVSA. Todas as empresas dependem dos EUA para processar os pagamentos financeiros.
Reações de Caracas, de aliados e da oposição
Em Caracas, o ministro das Relações Exteriores de Maduro, Jorge Arreaza, denunciou o que ele disse ser uma tentativa de "intimidar" o regime de Maduro e chamou o presidente Donald Trump de "um magnata racista e supremacista".
Em Cuba, um dos aliados mais próximos de Maduro, o presidente Miguel Díaz-Canel disse que o governo americano recorreu à ação "covarde" porque estava "frustrado diante da bravura e resistência do povo venezuelano".
O ministro de Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, chamou de terrorismo econômico as novas medidas norte-americanas.
O presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó, afirmou nessa terça-feira que a petrolífera Citgo e seus ativos estão protegidos pelas sanções impostas pelos EUA. "Qualquer dívida que o regime pretenda incorrer com ativos da nação será ilegal", afirmou, por meio do Twitter.
"A ação anunciada tem exceções humanitárias em relação a alimentos e medicamentos. Também protege o setor privado que não faz negócios com uma ditadura que sempre atacou o aparato produtivo", declarou o líder oposicionista.
Guaidó completou sua série de tuítes dizendo que o governo de Nicolás Maduro não tem apoio popular. "É uma estrutura cuja fidelidade é mantida na ponta do dinheiro roubado à República. Esta ação visa proteger os venezuelanos".
O que diz a ordem executiva
Trump assinou uma ordem executiva na segunda-feira que, segundo Bolton, impõe "sanções de bloqueio total aos ativos do governo da Venezuela dentro de nossa jurisdição… congela todos os ativos do governo venezuelano e proíbe transações com eles, a menos que estejam especificamente isentos".
"Criticamente", disse ele, a ordem "também autoriza sanções a pessoas estrangeiras que fornecem apoio ou bens ou serviços a qualquer pessoa designada, incluindo o governo da Venezuela".
O decreto também proíbe vistos para funcionários do governo e outros apoiadores do regime, muitos dos quais já eram proibidos de entrar nos Estados Unidos.
A Casa Branca divulgou um comunicado nesta terça-feira repetindo que "todas as opções estão sobre a mesa" para lidar com a Venezuela, uma sugestão de que ainda está considerando o uso de forças armadas para alcançar seus objetivos. Autoridades do Pentágono têm resistido a qualquer envolvimento militar, que também é combatido pela maioria dos governos latino-americanos.
O novo embargo foi anunciado após meses de escaladas de sanções dos EUA, incluindo o congelamento geral de todos os bens oficiais venezuelanos nos Estados Unidos e a proibição de quaisquer transações com o governo de Maduro.
O embargo chega em um momento em que a Venezuela já está em colapso. A produção de petróleo caiu para níveis não vistos desde a década de 1940, devido a longos anos de má administração, mas também devido à proibição de envios para os Estados Unidos imposta este ano que tirou da Venezuela sua maior fonte de moeda forte.
Mais de 4 milhões de venezuelanos deixaram o país, a maioria deles para países vizinhos da América do Sul. Além de relatar uma grave escassez de alimentos e remédios, a ONU informou no mês passado que milhares de venezuelanos foram vítimas de "tortura e maus-tratos, violência sexual, assassinatos e desaparecimentos".
Em uma carta à presidente da Câmara dos EUA, Nancy Pelosi, na noite de segunda-feira, Trump disse que o congelamento dos bens era necessário "à luz da usurpação contínua do poder pelo regime ilegítimo de Nicolás Maduro, bem como dos abusos dos direitos humanos, prisão e detenção arbitrária de cidadãos venezuelanos, cerceamento da imprensa livre pelo regime e as tentativas constantes de minar" Guaidó.
As negociações entre Venezuela e aliados
Sanções anteriores dos EUA bloquearam navios que transportam petróleo entre a Venezuela e Cuba, que apoia os serviços de segurança da Venezuela.
A China concedeu empréstimos substanciais a Maduro, assim como a Rússia, que forneceu crédito em troca de propriedade de partes dos ativos de energia da Venezuela, inclusive campos de petróleo e gás natural. A Rússia também é o principal fornecedor de armas da Venezuela.
O governo quase falido vendeu ouro - a maior parte para a Turquia - e outros ativos em um esforço para sobreviver, mas o que tem não chega nem perto dos recursos necessários para enfrentar os sérios problemas estruturais, que incluem escassez de energia e água em todo o país. Os venezuelanos também enfrentam uma hiperinflação recorde que quebrou as cadeias de fornecimento e tornou os bens básicos cada vez mais difíceis de se pagar.
Estima-se que 5.500 migrantes venezuelanos estejam saindo do país todos os dias, muitos deles tão desnutridos que os grupos de ajuda estão cada vez mais preocupados com o surgimento de uma situação de fome na Venezuela.
O destino de Maduro e da oposição
Desde uma tentativa fracassada de derrubar Maduro em abril, a oposição tem tentado se reagrupar. Várias rodadas de diálogo político mediado pela Noruega com o governo ocorreram, com os opositores de Maduro exigindo eleições presidenciais e a criação de condições para uma eleição livre e justa.
O destino de Maduro é um dos principais pontos de discórdia nas negociações, que continuaram na semana passada em Barbados. Alguns argumentaram que ele poderia permanecer no cargo, ou pelo menos permanecer no país, enquanto novas eleições são realizadas e até mesmo que ele poderia se candidatar. O governo Trump e muitos outros zombaram dessa sugestão.
Mas o governo Trump parece estar frustrado pela permanência no poder de Maduro apesar da forte pressão, e o novo bloqueio parece ser mais uma tentativa de aumentar o custo de seu mandato e talvez forçar rachaduras mais profundas dentro de seu círculo interno.
O clube dos sancionados pelos americanos. Onde as medidas funcionaram?
A nova ação dos EUA coloca a Venezuela em situação similar à de Cuba, Irã, Coreia do Norte e Síria, os outros países sob um embargo total semelhante.
Em seu discurso, Bolton comparou a medida a outros congelamentos de ativos contra governos ocidentais, incluindo o embargo de Cuba, imposto em 1962. Sanções semelhantes e temporárias foram impostas ao governo panamenho de Manuel Antonio Noriega em 1988 e contra a Nicarágua em 1985.
"Funcionou no Panamá; funcionou na Nicarágua uma vez e vai funcionar lá de novo; e funcionará na Venezuela e em Cuba", disse Bolton.
O embargo de Cuba até agora não conseguiu retirar o regime revolucionário que tomou a ilha em 1959. Na Nicarágua, as sanções rigorosas foram acompanhadas por uma guerra fracassada, financiada pelos EUA e promovida pelos "contras" da oposição contra um governo esquerdista que foi derrotado nas urnas em 1990, reeleito em 2006 e continua no poder.
No Panamá, Noriega foi finalmente expulso por uma invasão militar norte-americana em 1989.
O efeito prático das sanções
As novas sanções americanas, embora sejam uma ação importante de pressão sobre o regime de Maduro na Venezuela, podem ter alcance limitado na prática, já que os negócios lucrativos da ditadura venezuelana são ilegais - narcotráfico, mineração ilegal e extorsão - e não levam o nome de Nicolás Maduro nem de seus principais funcionários no governo, disseram políticos opositores e especialistas ao jornal Folha de S. Paulo.
Mesmo assim, venezuelanos expressaram preocupação com um possível agravamento da crise após as novas sanções. "Nenhum ditador foi derrubado devido a um embargo", disse Neyda London, 54 anos, gerente de uma loja em Caracas. "Não funcionou em Cuba e, infelizmente, não vai trazer o fim de Maduro e seus aliados."
Mas José Rángel, 63 anos, dono de uma loja de móveis em Caracas, acredita que as condições vão ficar piores e disse que os venezuelanos precisam se sacrificar "se quisermos derrubar essa ditadura".
"Se não estamos dispostos a sofrer", ele disse, "acho que não poderemos superar isso", disse Rángel.
Com informações do Washington Post e Estadão Conteúdo.
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