"Sair das sombras e ficar em dia com a lei". Essas foram as palavras do presidente Barack Obama dirigidas aos migrantes que se encontram nos Estados Unidos em situação irregular e podem ser contemplados nas medidas de anistia anunciadas no dia 20 de novembro, através de decreto presidencial. Não sem receber críticas agressivas dos republicanos, o novo programa deve beneficiar cerca de 4 milhões de migrantes sem documentos (equivalente a um terço dos que lá se encontram nessa situação), que poderão solicitar, a partir de 2015, uma permissão de trabalho de três anos, além da proteção contra a deportação.
Para se beneficiarem, os migrantes devem estar presentes em território americano há pelo menos cinco anos e ter filho com cidadania americana, ou residência permanente (green card), nascido antes de 20 de novembro de 2014, sem importar a sua idade. Em relação aos jovens, devem estar presentes em território americano desde 1.º de janeiro de 2010, ter chegado aos Estados Unidos antes dos 16 anos, ter diploma do ensino médio e não apresentar antecedentes criminais. Foi eliminado o teto anterior de 31 anos de idade em 2012 para ingressar no programa.
Não são poucos os critérios exigidos e tais medidas não significam conceder a nacionalidade ou cidadania. Também não evitam outras iniciativas xenófobas, já em curso. As autoridades federais dos EUA concentrarão seus recursos na saída compulsória dos migrantes em situação irregular considerados perigosos, detidos na fronteira ou que chegaram a partir de 1.º de janeiro de 2014, inclusive aqueles que são menores de idade.
Mais recursos serão alocados para reforçar a fronteira com o México e para acelerar o processo de deportação, através do sistema judicial.
Nessa seleção de migrantes desejáveis, o governo Barack Obama vai aumentar também a concessão de vistos a trabalhadores muito qualificados e estudantes cientistas, o que atingirá em torno de outras 500 mil pessoas. Estrangeiros com diploma superior de universidades americanas em carreiras com maior demanda como engenharia, ciência e matemática também poderão trabalhar por mais tempo nos Estados Unidos, em função do programa Optional Practice Training.
A iniciativa do presidente Obama é muito positiva. Certamente são muitos que vão "sair das sombras e ficar em dia com a lei". Mas também é verdade que o "sair das sombras", como já disse Zygmund Bauman em O Segredo Mais Bem Guardado da Sociedade de Consumidores, em geral significa atrair pessoas "com mais dinheiro para investir e mais habilidades para ganhá-lo", reduzindo-se os seres humanos à regra do mercado "de escolher o melhor produto da prateleira", a qual vem sendo usada sob o nome de "imigração seletiva", nas palavras do autor. Daí que, em nossa opinião, o "ficar em dia com a lei", significa trazer a pessoa não só à legalidade, mas à formalidade, ao pagamento de imposto e ao consumo, ou seja, "ficar em dia com a lei", a lei do mercado.
Tatyana Friedrich, professora de Direito Internacional Privado da UFPR
