Menino menor de cinco anos recebe dose da vacina contra Covid-19 no Rio de Janeiro, julho de 2022. Não há um consenso na ciência médica sobre a necessidade dessa vacina para crianças saudáveis.| Foto: EFE/ André Coelho
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A Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (FDA) autorizou nesta terça-feira o uso da vacina bivalente da Pfizer-BioNTech como dose de reforço contra a covid-19 para crianças de entre 6 meses e 4 anos de idade.

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A agência destacou que essa dose poderia ser utilizada pelo menos dois meses depois de completado o ciclo vacinal de três doses monovalentes da mesma marca.

A autorização desta terça-feira é para os menores que já haviam completado o ciclo de três doses com a vacina monovalente da Pfizer-BioNTech antes da autorização da bivalente como terceira dose.

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“Os dados atuais mostram que a vacinação continua a ser a melhor defesa contra uma doença grave, a hospitalização ou a morte causada pela covid em todas as faixas etárias”, afirmou o diretor do Centro de Pesquisa e Avaliação Biológica da FDA, Peter Marks.

Na última semana, segundo dados dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) desta terça-feira, foram registrados 170.576 novos casos e 1.862 mortes por Covid-19 nos Estados Unidos, um número inferior em relação ao da semana anterior.

É necessário?

Não se pode dizer que há um consenso científico na recomendação. Dados de qualidade ainda são escassos, especialmente os coletados com o maior grau de rigor possível. A bivalente foi aprovada com base apenas em estudos com animais de laboratório. Paul Offit, cientista especialista em vacinas do Hospital Pediátrico da Filadélfia, disse em editorial publicado na revista New England Journal of Medicine em janeiro que perseguir novas variantes “com uma vacina bivalente é um jogo perdido”.

Peter Marks, junto a Robert Califf, também da FDA, criticou a posição de Offit com uma carta de dois parágrafos para a mesma publicação. Na carta, eles citaram um estudo que encontrou um incremento de geração de anticorpos contra subvariantes atuais do vírus na dose bivalente, acima da dose monovalente. “Reforços bivalentes são eficazes para reduzir incidências de doença sintomática, hospitalização e morte em todas as idades”, disseram Marks e Califf, mas os estudos que citam valem mais para maiores de 18 anos.

Vinay Prasad, professor de epidemiologia na Universidade da Califórnia e crítico da atuação da FDA e do CDC (Centros de Controle e Prevenção de Doenças) na pandemia, apresentou uma tréplica em publicação própria. Sobre o incremento de anticorpos, “o nível de aumento foi tão pequeno que é improvável que seja importante”, rebate o especialista. Ele acrescenta que as duas agências não costumam remover hospitalizações incidentais dos dados — pessoas internadas com Covid, não por Covid.

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“Esses estudos são de baixa qualidade. Nenhum é ensaio randomizado”, um tipo mais rigoroso de estudo científico. “Paul Offit concede [que há] uma redução na [Covid] sintomática, mas argumenta que ela decai com o tempo”, diz Prasad, “mas eu não concedo porque o método não é capaz de afastar vieses. Somente estudos randomizados e controlados poderiam mostrar isso”. Ele termina aplaudindo dois ex-conselheiros da FDA, Marion Gruber e Phil Krause, que abdicaram de suas posições em protesto pela agência baixar seus critérios de rigor na recomendação da terceira dose para toda a população.

Muitos países não estabeleceram vacinação obrigatória, e alguns, como a Suécia, não recomendam as vacinas contra Covid-19 para crianças saudáveis, somente para aquelas que têm comorbidade. As agências sanitárias americanas raramente consideraram a proteção conferida pela imunidade natural e pela imunidade de rebanho em suas recomendações. Mais de 75% das crianças americanas já tiveram a doença, a ampla maioria sem sintomas graves.

É seguro?

Uma revisão para a faixa etária dos seis meses a cinco ou seis anos, publicada em fevereiro na revista Annals of Pharmacotherapy, com primeira autoria de Jeremy Stultz, doutor em farmacologia afiliado ao Centro de Ciência da Saúde da Universidade do Tennessee, reconhece que “os dados são limitados” sobre a eficácia da dose de reforço, inclusive a monovalente. Quanto à segurança, a revisão diz que “devido a critérios estritos de inclusão [de casos], tamanhos relativamente pequenos de amostras e períodos curtos de acompanhamento, eventos adversos raros podem ser difíceis de detectar”.

Nas crianças, explica a publicação, os eventos adversos mais comuns são reações imunológicas locais e sistêmicas como febre, dor no local de aplicação, dor de cabeça e fadiga. É o mesmo padrão de outras vacinas, dizem os autores. A dor e vermelhidão no local de aplicação ocorrem em 94% dos casos, e o inchaço em menos de 21%. A dor de cabeça afeta até 70% dos adolescentes, e é mais difícil de aferir em crianças pequenas. Cerca de 40% das crianças têm fadiga ou sonolência, menos de um quarto têm náusea, vômito ou diarreia. A maioria dos efeitos duram de um a dois dias. Para crianças, a dose é diluída.

Quanto aos efeitos mais sérios, o mais preocupante dos quais é a inflamação do coração (miocardite) especialmente nos meninos, a revisão diz que na faixa de menores de cinco anos há “relatos mínimos” do problema. Se estiver correta a hipótese de que a miocardite afeta o sexo masculino nas faixas etárias em que o organismo produz a maior quantidade de hormônio masculino, faria sentido que menores de cinco anos estivessem menos vulneráveis. Há, porém, uma fase de desenvolvimento conhecida como “minipuberdade” em que meninos em torno dos seis meses de idade têm picos de testosterona.

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Stultz propõe uma análise custo-benefício da miocardite comparada à Covid e outros problemas que ela traz e conclui que vale a pena a dose de reforço para essas crianças — sua revisão presume que a dose bivalente, para a qual há escassez de estudos, se comporta como a monovalente, o que não é irrazoável, pois as propriedades químicas da bivalente são pouco alteradas em comparação à monovalente.

Outros especialistas como Prasad discordam dessa conclusão e propõem que doses de reforço da vacina de mRNA não se mostraram necessárias ou recomendáveis na análise custo-benefício para grupos como os universitários, e acham digno de nota que um estudo tailandês encontrou sinais de miocardite em 3% dos garotos, até assintomática, após doses aplicadas em uma amostra de cerca de 300 adolescentes.

A primeira parte deste texto contou com informações da agência EFE.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]