Três de novembro chegou. A terça-feira que marca o ápice do processo eleitoral americano. Em todos os Estados Unidos, os eleitores terão sua última oportunidade de votar para escolher seu presidente para os próximos quatro anos: o republicano Donald Trump ou o democrata Joe Biden. Também vão definir o destino do Senado e da Câmara de Deputados ao entregar o controle das casas legislativas para republicanos ou democratas.
Independentemente de quem ganhar, essa eleição vai entrar para a história como uma das mais importantes do século. Prova disso é que a eleição caminha para ter a maior participação popular em mais de cem anos. Até domingo (1.º), de acordo com o US Election Project, mais de 93 milhões de americanos já tinham depositado seu voto, um número que a três dias da data oficial da eleição representa mais dois terços de todos os votos contabilizados no pleito presidencial de 2016 (136 milhões). Michael McDonald, professor da Universidade da Flórida e coordenador do US Election Project, estima que 150 milhões de americanos votarão em 2020, ou seja 65% dos 239 milhões de eleitores registrados no país.
Pesquisas de opinião também mostram o grande interesse da população na eleição presidencial deste ano. Um levantamento do Pew Research Center mostrou que 83% dos eleitores acreditam que “realmente importa quem vai vencer a eleição”, um número que não era visto desde 2000 nas pesquisas conduzidas pelo instituto.
Há muitos dramas envolvidos: a profunda polarização entre democratas e republicanos, a pandemia do novo coronavírus e seus impactos sociais e econômicos, a promessa de um resultado da disputa presidencial contestado na justiça - e a sombra de que isso possa levar violência para as ruas. Até mesmo a idade avançada e a saúde dos candidatos já foram motivos de nervosismo nesta campanha.
O que também deixa o mundo ansioso é a diferença entre as plataformas dos dois candidatos para as políticas internas, pautas de costumes, estratégias para as relações internacionais. Trump continua apostando em seu “America First” de viés conservador, enquanto os democratas, embora não tenham escolhido o socialista Bernie Sanders como candidato, estão concorrendo na plataforma mais progressista do que o esperado para um centrista Joe Biden – muito mais do que a de Hillary Clinton ou de Barack Obama.
“É a plataforma mais progressista de qualquer candidato democrata na história moderna do partido", disse à Vox Waleed Shahid, diretor de comunicações do Justice Democrats, um grupo que apoia candidatos democratas com viés de esquerda para o Congresso americano.
Alguns dos assuntos mais importantes das plataformas de campanha foram tratados em reportagens aqui na Gazeta do Povo:
- As diferenças do posicionamento dos candidatos em relação ao aborto e às pautas LGBT, inclusive sobre a questão da objeção de consciência religiosa.
- As propostas para o sistema de saúde americano e o quão longe os democratas estão dispostos a ir para socializá-lo.
- A disputa sobre a Suprema Corte e a possibilidade de expandi-la.
- A Segunda Emenda e o direito de acesso às armas nos Estados Unidos.
- O multilateralismo, o “America First” e as expectativas para as relações com os aliados europeus.
- Como a postura dos EUA mudaria com Joe Biden na presidência, em relação à ditadura de Nicolás Maduro, ao ditador norte-coreano Kim Jong-un, ao Partido Comunista Chinês e à expansão militar da China.
Por que a eleição americana importa para o Brasil
O Brasil também aguarda ansioso o resultado da eleição presidencial americana. O presidente Jair Bolsonaro tem o mesmo alinhamento ideológico de Donald Trump e nos últimos dois anos isso ajudou a fortalecer os laços comerciais e políticos entre os países. Com Joe Biden despontando na frente na corrida presidencial americana, como isso poderia impactar as relações com o Brasil?
Esse assunto também foi tema de reportagens da Gazeta do Povo. No Itamaraty, não é esperada uma ruptura caso os democratas voltem à Casa Branca. Por parte dos americanos, há pelo menos dois bons motivos para que a cordialidade se mantenha: a campanha contra o uso da tecnologia chinesa para os sistemas de internet 5G no Brasil, os governos de esquerda na América Latina, especialmente na Venezuela.
Contudo, o ritmo das negociações não deve ser o mesmo, segundo o embaixador do Brasil em Washington, Nestor Forster. Temas como meio ambiente e direitos humanos podem atrapalhar o andamento de negociações comerciais, especialmente se os democratas assumirem o governo e o Congresso. As reportagens a seguir aprofundam essas questões:
- Vitória de Biden tende a impor menos desafios diplomáticos ao Brasil do que pode parecer
- Biden pode desacelerar, mas não travar relações com Brasil, diz embaixador
- Amazônia é peça-chave para entender como a eleição nos EUA afeta o Brasil
- O que Trump e Biden falaram sobre a Amazônia, e qual foi a reação do governo Bolsonaro
- Como políticos brasileiros se relacionam com a política e os partidos dos EUA
A pandemia nas eleições americanas
Sem sombra de dúvida, a crise de saúde desencadeada pelo novo coronavírus foi o assunto mais relevante da campanha presidencial de 2020. As questões raciais, os protestos e tumultos anti-polícia e o aumento da violências em grandes cidades ocuparam as manchetes dos jornais americanos por um bom tempo durante o verão do hemisfério norte, mas a relevância disso para as eleições americanas de 2020 nem se compara ao impacto que a pandemia de Covid-19 causou.
A grande participação popular dias antes da eleição é um reflexo da crise de saúde. Governadores em vários estados adotaram medidas para controlar a doença, que acabaram ampliando a votação por correio e a votação presencial antecipada. E a votação por correio em massa promete trazer algumas consequências que, por enquanto, são apenas perguntas: ela vai de fato impulsionar a candidatura de Joe Biden? Haverá fraudes? Muitos votos serão rejeitados por não cumprirem os requisitos das autoridades eleitorais estaduais? Quanto tempo levará para contar os votos que chegarem pelos correios? Um vencedor só vai ser anunciado depois que eles forem contados?
Mas além de influenciar o processo eleitoral deste ano, a pandemia também tem sua importância política. O fato de os Estados Unidos serem o país com o maior número de casos e mortes pela Covid-19 coloca o presidente Trump em uma situação complicada. Biden fez da resposta de Trump à pandemia - e à decorrente crise econômica que se seguiu - sua principal arma de ataque ao republicano.
Se o presidente perder a reeleição, certamente a pandemia será apontada como um dos principais motivos. Se ele ganhar, dirão que a vitória poderia ter sido maior se a crise sanitária não tivesse acontecido, afinal de contas, antes de o vírus circular pelo país, a economia americana estava de vento em popa, o desemprego em nível baixíssimo, Trump havia se libertado das acusações sobre conluio com os russos – uma sombra que o acompanhou durante os três anos de sua presidência – e tinha acabado de se livrar de um impeachment no Senado, o que melhorou sua popularidade momentaneamente.
Então, de um jeito ou de outro, a pandemia será apontada como um divisor de águas das eleições americanas em 2020. E mais do que isso: promete influenciar políticas econômicas e sociais adotadas pelo próximo governo, seja republicano ou democrata.
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