Com o olho esquerdo roxo e inchado e dois pedacinhos de esparadrapo em forma de cruz sobre o nariz, o rei Juan Carlos não alterou sua agenda dos últimos dias. Na versão oficial, o monarca se machucou após ir de encontro a uma porta quando um funcionário a abria na direção contrária. Mas o contratempo não é o único a atingir a família real espanhola.
Aos 73 anos, Juan Carlos precisa lidar com as acusações de corrupção enfrentadas pelo genro e com os crescentes rumores sobre a anorexia de sua nora. "A família real está afetada", declarou a infanta Pilar de Borbón, irmã de Juan Carlos. Nada mais natural quando o cerco judicial a Iñaki Urdangarín, duque de Palma de Mallorca, marido da infanta Cristina (sétima na linha de sucessão ao trono), se fecha a cada dia.
Genro perfeito até agora por ser simpático, educado, bonito, louro, corpo atlético, de boa família, carinhoso com seus quatro filhos e uma estrela nacional do handebol, o duque pode ser indiciado a qualquer momento pela Justiça da Espanha após investigações apontarem para quatro delitos no já chamado Caso Urdangarín: falsificação de documentos, prevaricação, fraude à Administração Pública e desvio de verba.
O processo tem oficialmente o nome de Operação Babel, pela complexa rede de negócios e sociedades supostamente ligada ao genro do rei. O Instituto Nóos de Estudos Estratégicos de Patrocínio e Mecenato, dirigido pelo duque entre 2004 e 2006, está no epicentro do desvio de dinheiro público, embora seja uma entidade, teoricamente, sem fins lucrativos. Nesses dois anos, Nóos recebeu 5,3 milhões de euros de dois governos regionais, dos quais mais de 3 milhões de euros foram depositados nas contas de duas empresas de Urdangarín: a imobiliária Aizoon S.L. e a consultoria Nóos, homônima do instituto.
Mas a trama não para por aqui, já que outras quatro empresas também estariam vinculadas a este escândalo. Todas compartilham endereço, sócios e empregados. "O rei deve estar muito zangado. Isso não afeta diretamente a sua imagem, mas sim a da monarquia como instituição", afirma o historiador Ricardo Mateos Sáinz de Medrano, autor de vários livros sobre a família real espanhola.
Se em 1997 a monarquia era a instituição melhor avaliada pelos espanhóis, hoje ela ocupa o terceiro lugar atrás das Forças Armadas e da imprensa, de acordo com levantamento do Centro de Investigações Sociológicas. Os especialistas lembram, no entanto, que todas as instituições do país andam pior avaliadas por causa da crise e a monarquia vai a reboque delas. Mesmo assim, 60% do povo ainda prefere o sistema à república e Juan Carlos é querido acima de tudo: 80% dos espanhóis acham que o rei foi fundamental na redemocratização.