• Carregando...
A diversidade das famílias dos Estados Unidos: acima, Harini Indrakrishnan, que está no último ano do ensino médio | David Walter Banks para The New York Times
A diversidade das famílias dos Estados Unidos: acima, Harini Indrakrishnan, que está no último ano do ensino médio| Foto: David Walter Banks para The New York Times

Kristi e Michael Burns têm muito em comum. Eles adoram palavras cruzadas, futebol americano, visitar museus e ler cinco ou seis livros ao mesmo tempo. Eles descrevem a si mesmos como introvertidos que sofrem de uma série de problemas médicos crônicos. Os dois também compartilham históricos conjugais semelhantes. No dia de seu casamento, em 2011, o noivo tinha 43 anos e a noiva, 39, e aquele era o terceiro casamento para ambos.

Hoje, a família reunida é um conjunto extenso e às vezes inquieto de dois filhos de olhar penetrante dos dois casamentos anteriores dela, uma filha e um filho do segundo casamento dele, ex-cônjuges com vários graus de envolvimento, os parceiros dos ex-cônjuges e os sogros confusos.

Se os Burns parecem atípicos como uma família nuclear norte-americana, que tal os Schulte-Wayser, um alegre bando formado de dois homens, seis filhos e dois cachorros? Ou os Indrakrishnan, casal imigrante bem sucedido que vive em Atlanta, Geórgia, cuja filha adolescente divide o tempo entre a prosaica lição de casa e a precisão dos passos de dança hindu antiga.

A típica família norte-americana se tornou tão multifacetada e cheia de surpresas como o "turducken" – a combinação festiva tipicamente norte-americana de peru recheado com pato e frango. Pesquisadores que estudam a estrutura e a evolução da família norte-americana expressam um espanto genuíno quanto à velocidade com que a família mudou nos anos recentes, com transformações que muitas vezes excedem ou contrariam as previsões de alguns artigos científicos publicados anteriormente.

"Esse movimento, essa rotatividade nas nossas parcerias íntimas está criando famílias complexas numa escala que nunca vimos antes", disse Andrew J. Cherlin, professor de políticas públicas na Universidade Johns Hopkins. "É um erro pensar que este é o ponto final de uma enorme mudança. Ainda estamos no meio dela."

Do Sri Lanka a Atlanta

Ao conhecer Indran Indrakrishnan, 53, um gastroenterologista que vive com o consultório lotado nos arredores de Atlanta, as pessoas notam seu nome incomum, a cadência vívida e animada do sotaque e o cabelo preto ondulado e perguntam: "De onde o senhor é, doutor?".

"Vamos ver se você consegue adivinhar", responde Indrakrishnan com um sorriso. Índia? Não. Paquistão? Não. Irã, Egito, Turquia, Afeganistão? Só respostas negativas. "Nessa hora elas ficam espantadas e passam para a América do Sul. Quando eu finalmente conto que nasci no Sri Lanka, elas ficam mais confusas do que nunca. ‘Sri Lanka? Onde fica isso?’"

Esse tipo de analfabetismo geográfico casual pode em breve ser sobrepujado pela mera força dos números. Indrakrishnan integra a nova onda de imigração que está varrendo os Estados Unidos, derrubando antigos blocos eleitorais, reconfigurando bairros, diversificando opções de restaurantes locais e lançando uma nova perspectiva em relação ao significado dos valores familiares tradicionais.

Embora boa parte do debate imigratório tenha se concentrado nos latinos, os grupos de imigrantes de crescimento mais veloz não são hispânicos, mas asiáticos. A população asiático-americana subiu 46 por cento entre 2000 e 2010, comparado a apenas 43 por cento de hispânicos e 1 por cento de brancos não-hispânicos, e a parcela asiática de novos imigrantes quase dobrou, passando de 19 a 36 por cento.

Em particular, as famílias asiático-americanas são excepcionalmente estáveis. Elas têm metade da probabilidade de se divorciar dos norte-americanos em geral, segundo dados do instituto Pew Research. Muitos dos novos imigrantes asiáticos têm um histórico sólido de classe média, e muitos, embora não todos, se saem bem ou muito bem após se mudar para os EUA.

Indrakrishnan vive com a esposa Gayathri, de 49 anos, contadora tributária, e a filha, Harini, que está terminando o ensino médio, em um enclave fechado com portão às margens de um resplandecente lago artificial. Toques pessoais são encontrados em todo canto: em um deles, uma elegante escultura de bronze da deidade hindu Shiva, em outro, um saraswati vina, instrumento de cordas de corpo bulboso, o qual Gayathri Indrakrishnan gostaria de ter mais tempo para tocar e, no porão, um estúdio feito sob medida onde Harini pratica Bharatanatyam, forma de dança clássica indiana bastante estruturada, quase geométrica, que se tornou um elemento característico de uma vida completamente norte-americana.

"A dança me mantém conectada à minha cultura. E eu fico com o melhor de dois mundos", disse ela.

O terceiro casamento

Para Mike e Kristi Burns, agora na casa dos 40 anos, o primeiro casamento começou cedo e terminou cedo, e o segundo durou por volta de pouco mais de uma década. Ambos têm dois filhos de casamentos anteriores.

Kristi tinha 19 anos, vivia na Carolina do Sul, e seu namorado, fuzileiro naval, estava prestes a ser mandado para o Japão. "Eu não tinha um vínculo de fato com ele", disse ela, "mas por alguma razão eu senti essa poderia ser minha única chance de me casar".

No Japão, Kristi deu à luz seu filho Brandon, percebeu que estava sozinha e triste, e deixou o casamento sete semanas após o aniversário de um ano. De volta aos Estados Unidos, Kristi estudou para se tornar agente de viagens, mudou-se para Michigan e se casou com seu segundo marido, aos 23 anos. Ele era eletricista. Ele adotou Brandon, e o casal teve um filho, Griffin. O casamento durou 13 anos.

"Ficamos realmente grandes amigos, mas não nos demos tão bem como marido e mulher", disse Kristi. "Nossos estilos de educar os filhos eram muito diferentes."

Após seu segundo divórcio, Kristi foi convencida por amigos a experimentar o serviço de namoro on-line match.com, e pouco antes de seu período de teste gratuito do site expirar, ela reparou em um novo perfil.

Mike, engenheiro de uma empresa de comércio eletrônico, disse que ela entrou em contato com ele primeiro. Eles começaram a conversar. Mike contou a Kristi que tinha se casado com sua primeira esposa enquanto ainda estava na faculdade, tendo se divorciado dela dois anos depois. Ele conheceu sua segunda esposa através de amigos em comum, e tiveram um grande casamento na igreja, abriram uma empresa de softwares de publicação juntos, optaram por vendê-la e tiveram dois filhos, Brianna e Alec.

Quando o casamento começou a ir mal, Mike ignorava os sinais de problemas, como os comentários dos vizinhos que percebiam que a sua esposa nunca estava por perto nos fins de semana.

Após 15 anos de casamento, a esposa o expulsou de casa. Seus documentos do divórcio ainda não haviam sido finalizados, contou ele a Kristi na primeira noite em que conversaram. Vou ajudar você com isso, respondeu ela.

Os Burns, que vivem em Chelsea, Michigan, admitem que o seu próprio casamento, que já dura três anos, não é perfeito. Os filhos ainda estão se ajustando uns aos outros. No entanto, eles estão determinados a ficar juntos.

"Eu sei que todo mundo acha que esse casamento é uma piada e as pessoas esperam que ele não dê certo", disse Kristi.

"Mas isso só me faz me esforçar mais ainda para que ele seja bem-sucedido."

"Eu diria que nossas chances de sucesso estão acima da média", acrescentou o marido.

Seis filhos, dois pais

A família Schulte-Wayser, de Los Angeles, é uma mistura entre o tradicional de meados do século XX e o descolado pós-moderno.

Um dos pais sustenta a família, trabalhando como advogado corporativo, e é quem pega mais pesado quando o assunto é a lição de casa, a hora de dormir ou a importância das regras. O outro fica em casa para cuidar das duas filhas e quatro filhos do casal.

"Nós dois somos muito maternais, cada um à sua maneira", afirmou Joshua Wayser, de 50 anos, o advogado. Richard Schulte, de 61 anos, seu marido artista, trabalha em casa.

Wayser, Schulte e os seis filhos adotivos fazem parte de um grupo cada vez maior de homens gays e lésbicas que estão em busca da paternidade de todas as formas possíveis: adoção, barrigas de aluguel e doação de esperma.

De acordo com o Instituto Williams da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, o número de casais gays com filhos mais do que dobrou desde a década passada e já passa dos cem mil nos Estados Unidos.

O sobrenome da família Schulte-Wayser começou sem hífen, e eles assinavam apenas com o nome Wayser.

Os dois haviam se separado. Wayser vivia sozinho em Los Angeles e sua carreira como advogado estava passando por um excelente momento. "Precisava começar a me ver como pai", afirma. Em junho de 2000, ele adotou a então recém-nascida Julie. Alguns meses depois, Schulte ligou para conversar, ouviu Julie ao fundo e resolveu ir conhecê-la. "Foi amor à primeira vista", afirmou Schulte.

"Nós voltamos a ser um casal", afirmou Schulte. "Ou melhor: nos tornamos uma família", corrigiu.

Sem casamento por enquanto

Ana Perez, de 35 anos, que se mudou para Nova York vinda da República Dominicana aos cinco anos de idade, expulsou dez anos atrás o pai de seus dois filhos mais velhos do apartamento onde vive, por conta de uma traição. Há seis anos, Perez vive com Julian Hill, de 39 anos, pai de seu terceiro filho, Bubba, de 4 anos.

Hill é afro-americano. Ele é um pai dedicado para as três crianças e está envolvido com o dia a dia da vida de cada um.

Ele e Perez abriram recentemente uma pequena empresa que realiza serviços hipotecários e de cartório.

Os dois estão noivos há mais de um ano e planejam continuar assim por mais um ano antes de se casarem.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]