Bombaim A fotógrafa Payal Parekh estaciona seu carro ao lado da favela de Cuff Parade, em Bombaim. Filha do dono de uma grande confecção de tecidos de seda, Payal não sabe o que é ter medo de sua cidade. Uma das coisas que mais gosta de fazer é se perder pelas estreitas ruas dos bairros mais miseráveis de Bombaim coração financeiro da Índia e, ao mesmo tempo, uma das cidades onde há mais favelas e miseráveis no país. Com sua Pentax, ela retrata, em preto e branco, seu povo. Com a máquina pendurada no pescoço, uma câmera digital nas mãos, óculos escuros Chanel, a moça entra sorrindo pelas vielas.
"Eu não tenho o menor medo de entrar nas favelas. O único cuidado que tenho é pedir permissão para bater a foto antes de clicar, porque muita gente é tímida e não gosta", conta.
Lixo e esgoto
Payal começou a fotografar bairros pobres de Bombaim após voltar de Nova Iorque. Viveu 10 anos em Manhattan, onde estudou marketing e negócios internacionais. Enquanto perscruta os becos da favela é cercada por crianças, que brincam em meio ao lixo e ao esgoto a céu aberto. Mas apesar da miséria, nas favelas da maior metrópole da Índia não há tensão ou medo. Coordenador de uma ONG que trabalha numa favela mais ao norte de Bombaim, Bahujan Hittay fica surpreso ao saber que no Brasil muitas favelas de metrópoles vivem em pé de guerra por causa do tráfico de drogas.
"Mas no Brasil as pessoas podem ter arma de fogo?", pergunta.
Sharad é um dos dalits (antigamente chamados de intocáveis, indianos que no sistema de casta hindu estão no degrau mais baixo).
"Muitos que moram nas favelas são ex-intocáveis como eu", diz.
Todos reverenciam Babasaheb Ambedkar, líder histórico dos dalits. Sua foto está pendurada na parede de quase todos os barracos das favelas indianas. Sharad pede licença e entra na casa de Shila Kambli, uma professora de 43 anos, que ganha 1 mil rúpias por mês (cerca de US$ 25). Ela divide o espaço com o marido, eletricista, e dois filhos já adultos.
"Nós vivemos com muito sacrifício, a vida é muito dura aqui. Mas pelo menos é seguro, não tem tráfico de drogas, não tem armas de fogo. Isso não é permitido", diz Shila.
Reflexo
A poucos metros dali, num casebre, outra família de dalits é o reflexo da Índia que tenta conquistar um espaço no crescimento econômico. Com um sári vermelho, muito sorridente, Ladibai, 50 anos, conta que ela e o marido Bhimrao, de 60, vieram para Bombaim em 1954, para tentar melhorar de vida. Eram agricultores num vilarejo miserável no estado de Maharashtra, do qual Bombaim é capital. Com eles vive o filho do casal, Vishwas, que trabalha como contador de uma empresa de logística, recém-casado com Vaishali.
"Meus pais mendigavam nas ruas de Bombaim quando chegaram. Não tinham o que comer", conta Vishwas, em bom inglês.
Os pais só falam hindi, mas o jovem casal já é o reflexo da nova geração indiana, mesmo nas favelas: cada vez mais aprendendo inglês, idioma falado hoje por cerca de 15% da população indiana.