Negociação
EUA fazem pressão sobre o Brasil
Apesar do clima de cooperação que permanece entre as diplomacias brasileira e norte-americana, quando o assunto é Irã os EUA não deixam de enviar recados duros ao Itamaraty. Foi assim nesta semana, quando a subsecretária de Estado para Controle de Armas dos EUA, Ellen Tauscher, afirmou não ver motivos para um país preocupado com a proliferação de armas nucleares querer adiar novas sanções contra o Irã.
Justamente o que o presidente Lula havia proposto na semana anterior ao colega Barack Obama: dar mais tempo a Ahmadinejad.
"Já houve muita demora por parte do Irã, com sua falta de transparência, e eles precisam dar confiança à comunidade internacional sobre o que eles estão fazendo", disse Ellen.
A subsecretária de Estado americana também deixou claro que os EUA esperam que o Brasil assine um protocolo adicional ao Tratado de Não Proliferação (TNP), em maio, durante o encontro de revisão da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), em Nova York. O Brasil é um dos poucos países que ainda não assinaram o protocolo.
Mesmo tendo recuado e dado mais espaço para inspeções da AIEA em suas instalações nucleares na semana passada, o Irã insiste que alguns protocolos do TNP sejam revistos.
A diplomacia da mediação da paz do governo Lula já colhe resultados, mas não exatamente positivos. Um deles é que Barack Obama não vem mais ao Brasil neste ano, o que foi em parte motivado pela insistência brasileira em apoiar o programa nuclear iraniano, que quase ninguém mais acredita ser pacífico. A informação parte de fontes ligadas à Embaixada dos EUA em Brasília.
"Eu estou convencido de que a paz está ao nosso alcance. É com a mesma confiança no diálogo que irei em maio a Teerã", garantiu o presidente Lula ao receber na última quinta-feira o presidente libanês Michel Suleiman.
O presidente iraniano Mahmoud Ahmadinejad veio ao Brasil em novembro do ano passado, pouco depois de Lula ter sido um dos únicos chefes de Estado a reconhecer sua contestada reeleição. Desde então, era esperado que o brasileiro pagasse a visita, o que ocorrerá entre 15 e 17 de maio, em viagem de nove dias que inclui ainda Rússia, Catar, Espanha e Portugal.
A polêmica visita até poderia ter saldo positivo para a diplomacia brasileira. "Se o presidente se encontrasse com a oposição seria um passo à frente", disse à Gazeta do Povo o presidente do think tank Inter-American Dialogue, Peter Hakim.
"A reação dele em Cuba desapontou muito", diz o analista, referindo-se ao desprezo mostrado por Lula pela morte de um opositor cubano após greve de fome, o que ocorreu justamente quando o brasileiro visitava a ilha dos irmãos Castro.
"Ahmadinejad tem tentado usar o Brasil como exemplo de respaldo. O resultado dessa visita irá depender muito da agenda e da postura que o presidente Lula adotar em relação à oposição", disse à reportagem o coordenador do curso de Relações Internacionais da UniCuritiba, Juliano Cortinhas. "Se (Lula) for até lá só para defender a soberania e o programa nuclear iranianos, isso será visto de forma mais crítica. Provavelmente haveria uma resposta dos EUA", pondera.
O encontro com a oposição poderia ser encarado como uma tentativa de recuperar terreno perdido no campo dos direitos humanos, que já foi seara do Brasil, mas hoje é uma área em que o país recebe críticas pela abstenção em votações importantes do Conselho de Direitos Humanos da ONU. "Nesse ponto específico, Lula provocou um retrocesso na agenda do Brasil", afirmou à reportagem o professor de história contemporânea da Universidade Federal Fluminense Bernardo Kocher.
Apesar de ter sido aventado no início do ano, o encontro com a oposição não é considerado provável. "Quando é um governo com o qual (Lula) tem afinidade ideológica, ele não visita a oposição. Foi assim em Cuba e na Venezuela", disse à Gazeta do Povo o professor de filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul Denis Rosenfield.
Mediador
A visita de Lula ao Irã, cuja agenda ainda está sendo acertada, é polêmica porque o Brasil está cada vez mais isolado em seu posicionamento de defesa do programa nuclear iraniano, que Teerã afirma ser pacífico.
"A política de arco-íris pode estar chegando ao seu limite e corre inclusive o risco de minar os planos de o Brasil conquistar um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU", criticou o comentarista John Paul Rathbone no londrino Financial Times, nesta semana.
A saia-justa talvez tenha começado a incomodar, já que o chanceler Celso Amorim partiu para o Irã em decisão tomada em cima da hora. Amanhã e terça-feira, encontra com Ahmadinejad, o presidente do Parlamento, Ali Larijani, com o chanceler Manouchehr Mottaki e com o secretário-geral do Conselho Supremo de Segurança Nacional, Said Jalili. Tudo para fazer avançar negociações sobre a questão nuclear antes da chegada de Lula.
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