O líder cubano Fidel Castro tomou a frente do discurso crítico da imprensa na última semana contra as declarações do presidente americano Barack Obama em Havana, com um artigo em que afirma que a ilha não precisa de presentes dos Estados Unidos.
No artigo publicado nesta segunda-feira (28) no jornal oficial Granma, com o título “O irmão Obama”, uma semana depois da histórica visita do presidente americano ao país, Fidel afirma que Obama utilizou “palavras mais melosas” em seu discurso.
Durante a estadia em Havana entre 20 e 22 de março, Obama afirmou em um discurso transmitido ao vivo pela televisão cubana que “é hora de esquecer o passado, deixar o passado, de olhar para o futuro, olhar juntos, um futuro de esperança”.
“Se supõe que cada um de nós corria o risco de um infarto ao escutar estas palavras do presidente dos Estados Unidos”, escreveu Castro, que completará 90 anos em agosto e que governou Cuba durante 48 anos, até 2006, quando se afastou do poder por uma grave crise de saúde e foi substituído na presidência por seu irmão Raúl Castro.
“Que ninguém tenha a ilusão de que o povo deste nobre e abnegado país renunciará à glória e aos direitos, e à riqueza espiritual que ganhou com o desenvolvimento da educação, da ciência e da cultura”, reafirmou o histórico líder cubano, recordando o embargo imposto por Washington em 1962 e seu respaldo a ações violentas contra o governo da ilha.
“Não necessitamos que o império nos presenteie com nada. Nossos esforços serão legais e pacíficos, porque é nosso compromisso com a paz e a fraternidade de todos os seres humanos que vivem neste planeta”, concluiu o líder cubano.
Página da história
Nos últimos dias, vários artigos foram publicados na imprensa cubana afirmando, segundo a opinião de acadêmicos e jornalistas, que Obama fez omissões em seu discurso.
Nos artigos, os autores rejeitam o apelo feito por Obama - primeiro presidente dos Estados Unidos a visitar Cuba em 88 anos - a virar a página da história e esquecer os confrontos anteriores entre os dois países.
“Sua lógica discursiva deixa espaços de ar que escapam, minimizam ou manipulam os fatos”, afirmou o acadêmico e jornalista Enrique Ubieta.
No entanto, embora o presidente Raúl Castro tenha ouvido da plateia o discurso de Obama, o governo cubano não reagiu oficialmente a sua fala, já que Fidel não faz mais parte do Executivo, ainda que mantenha sua influência.
Cuba e Estados Unidos restabeleceram relações em julho, depois de mais de cinco décadas de confronto, e a visita de Obama visava promover o processo de “normalização” dos vínculos, que ambos os governos admitem que será lento e gradual.
Depois de enfrentar o antagonismo de nove administrações consecutivas, Fidel Castro considerou que o “bloqueio cruel” já dura “quase 60 anos.” Ele também questionou: “o que acontece com aqueles que morreram em ataques mercenários a barcos e portos cubanos, um avião cheio de passageiros que explodiu no ar, as invasões mercenárias, vários atos de violência e de força?”.
O pedido de Obama para deixar o passado para trás também encontrou resposta fora do âmbito oficial. Em sua homilia na última Sexta-feira Santa na catedral de Havana, o cardeal Jaime Ortega também respondeu a estas palavras.
“Entre os países, entre nós, precisamos de perdão, por quê? Porque a história não é facilmente esquecida, existem mágoas que não são esquecidas, uma página não é virada facilmente, porque precisamos perdoar as ofensas”, disse Ortega.
O cardeal afirmou que “há uma grande dificuldade” em esquecer o passado: “Não se vira a página e não se deixa a história para trás, porque a história é necessária e a história é mestre da vida como disse o pensador grego e precisamos tê-la sempre presente e, contudo, viver reconciliados”.