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Curitiba – 2006 é um ano duplamente importante para um dos chefes de Estado que está há mais tempo no poder. Fidel Castro, além de completar hoje 80 anos, celebra os 50 anos do movimento revolucionário na ilha de Cuba em dezembro. Com a saúde abalada por conta de uma cirurgia no intestino, Fidel pediu para que todas essas comemorações fossem adiadas para o fim do ano. Enquanto isso, a sucessão de Castro tem sido objeto de análise do que pode vir a ocorrer com o país quando a ilha não estiver mais sob o controle de seu ditador.

O regime ditatorial de Cuba não se encerrará com a morte de Fidel Castro. A máquina do partido comunista é organizada e a adesão ao regime ainda é alta. Ou seja, a coesão no partido tende a se manter. A análise é do historiador da Unicamp, Edgar Deddeca. "É errôneo pensar que tudo está centrado em Fidel. Ao longo de cinco décadas no poder se criou uma burocracia estatal que dá sustentabilidade ao regime."

O irmão de Fidel, Raúl Castro, é o herdeiro natural da dinastia e deverá ser ungido como o novo chefe de Estado. "Não vai haver grande resistência interna em Cuba. A pressão virá de organizações anti-castristas nos Estados Unidos, que são bastante fortes."

Para Dennison de Oliveira, professor do Departamento de História da Universidade Federal do Paraná, a sucessão com Raúl Castro não vai longe. "O carisma de Fidel não é herdado. Culto à personalidade também não é transferível." A única saída para Raúl, diz Oliveira, seria abrir a economia cubana e manter o poder partidário monopolizado. Assim, o crescimento econômico legitimaria o poder, diz.

Outro senão, considera Oliveira, é que o embargo econômico e político norte-americano desde 1962 deu força para o regime de Fidel. "Se os EUA suspendessem o embargo, o comunismo acabaria em minutos."

Novo horizonte

A política dos EUA de hostilidade declarada e de isolamento não deve mudar com a morte de Fidel, diz Deddeca. Cuba é hoje um problema menor na política externa norte-americana se comparada a outras "guerras" no Oriente Médio. Não é conveniente para o presidente dos EUA, George W. Bush, abrir uma nova zona de conflito, avalia.

Com a saída de cena de Fidel, abre-se um horizonte para a definição da posição da política externa na América Latina, vislumbra o historiador. Ou seja, isso pode apontar para um novo arranjo geopolítico na América Latina e um novo impulso da esquerda nacionalista na região. "O substituto de Fidel não está na ilha, mas sim sentado em cima de barris de petróleo. Hugo Chávez é a grande preocupação dos EUA na América Latina."

Enquanto Cuba minguou, a China despontou como o maior desafio dos EUA, diz Deddeca. Não como potência bélica, mas pela sua economia. "A China vai corroer os EUA pela economia que acaba com qualquer concorrência internacional, levando a uma guerra de mercados."

Suporte soviético

O movimento popular liderado por um grupo de guerrilhas se propunha a libertar Cuba do domínio dos EUA em 1953, explica Deddeca. A adesão ao comunismo pós-Guerra Fria foi fundamental porque tudo o que Cuba desenvolveu se deve à União Soviética. O que sustentou a longa sobrevivência do regime comunista em Cuba foi o financiamento da União Soviética, diz. O regime de Fidel Castro erradicou problemas crônicos, melhorando substancialmente os setores de saúde e educação no país. "Foi uma revolução que garantiu condições de vida decente aos cubanos em troca de uma ditadura cerceadora. Com o fim da União Soviética, em 1991, o cenário se inverteu, com o aumento da pobreza, prostituição, desemprego. O perfil da ilha mudou completamente. Fidel se manteve por tantos anos no poder graças a ex-URSS, assim como outros líderes do Leste Europeu."

Oliveira considera que Fidel e seus companheiros de guerrilha representam a ruptura com um passado cubano que era praticamente colonial, no qual padrões de vida social e política semelhantes aos do Haiti eram a norma. "A elevação do nível intelectual do povo com a erradicação do analfabetismo e a democratização do acesso ao ensino superior, tudo isso – sem mencionar índices de desenvolvimento humano dos mais altos do hemisfério – são poderosas retribuições do regime à fidelidade da maior parte da população." Por outro lado, analisa Oliveira, o estatuto colonial cubano se refletia também na sua dimensão política. "A subserviência de sucessivos governos fantoches a serviço dos interesses dos investidores norte-americanos eram a regra. Com Fidel, o povo foi levado a vivenciar não só uma ruptura com os EUA, mas também o enfrentamento com aquela superpotência, no que pode ser considerada uma trajetória histórica da mais alta relevância, o que também acaba por se constituir num aglutinante social e fator de legitimação política do regime", afirma.

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