Um filme turco que glorifica a tomada de Constantinopla revive o debate sobre a visão "neo-otomana" atribuída ao governo islâmico moderado do primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan.
Os cinéfilos se aglomeram nas salas para ver "Fetih 1453" (Conquista 1453), um afresco da tomada ao império bizantino, em 1453, de Constantinopla, que se tornou, em seguida Istambul - um episódio histórico, considerado fonte de orgulho para muitos turcos, começando pelo cineasta e produtor.
"Como produtor, estou orgulhoso de nossa história, de nosso passado, como todos no país", disse à imprensa Faruk Aksoy.
"A conquista de Istambul é um acontecimento maior, não apenas para nosso país mas no nível da história da humanidade, um fato que pôs um ponto final em uma era e abriu uma outra", acrescentou.
Desde seu lançamento, no dia 16 de fevereiro, numa hora símbólica - 14h53 -, cerca de 2,5 milhões de turcos assistiram ao filme, segundo os dados oficiais do Box Office Turkey, batendo o recorde de audiência de uma produção local.
"Não é o primeiro filme sobre a conquista de Istambul, mas é o primeiro que aparece na Turquia com uma tal dimensão, com um orçamento tão grande", de 17 milhões de dólares, afirmou o assessor de imprensa do filme, Filiz Ocal.
"Fetih 1453" ganha uma importância particular na Turquia de hoje, onde a diplomacia do governo Erdogan é com frequência classificada de "neo-otomana", com a ambição de restaurar a influência do império sobre seus antigos territórios - um termo rejeitado pelo governo de Ancara.
"Com sua economia em plena expansão e sua influência política, a Turquia é percebida como um modelo no Oriente Médio", explica Mensur Akgun, professor de Relações Internacionais na Universidade Kultur de Istambul.
"Não é surpreendente constatar que, quanto mais a Turquia se torna forte, mais ela é levada em consideração no mundo", acrescentou ele.
Nesta recuperação de influência, o cinema desempenha um papel relevante, assim como as séries turcas para televisão, muito populares no mundo árabe.
"Pode-se, sem dúvida, falar de uma tentativa de exercer uma influência cultural na região", considera Akif Kirecci, da Universidade Bilkent de Ancara, sobre o filme.
"Mas, ao mesmo tempo, os turcos redescobrem sua própria história", acrescenta.
Segundo a imprensa, Erdogan viu e gostou do filme.
Esta superprodução de 160 minutos se abre com um "flashback" em Medina, com o profeta Maomé prometendo a felicidade àquele que fará a conquista de Constantinopla. Esta chance invejável foi dada ao sultão otomano Mehmet II.
Os críticos saudaram o filme como um "acontecimento", destacando, no entanto, que não respeita a verdade histórica.
"É um acontecimento em nível de qualidade e técnica, mas a realidade histórica é sacrificada às preocupações comerciais", considera Yilmaz Kurt, que dirige a Faculdade de História da Universidade de Ancara.
Os historiadores criticam principalmente a cena na qual o imperador bizantino faz seu Exército sair das fortalezas da cidade para enfrentar os otomanos.
"Ele teria sido estúpido em fazer isso, numa cidade que estava na posição de defesa, apressando a batalha..." disse à AFP.
"É um filme que reflete as escolhas do diretor. Um drama onde o amor não está de todo ausente", diz Filiz Ocal.
Outros especialistas acusam o filme de se inspirar nos padrões hollywoodianos, com cenas do tipo "Gladiador" ou "Matrix".
O diretor diz que não liga para essas críticas, inspiradas, segundo ele, por um "complexo de inferioridade".
"Não plagiamos apenas cinco ou seis filmes, plagiamos centenas", ironiza.
"Cada filme tem seu realizador. E nós também. Eles têm roteiristas, e nós também. Têm sua própria música, e não ficamos atrás", disse ele.