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Shameik Moore como Malcolm, o protagonista do filme “Dope” | Rachel Morrison/Open Road Films
Shameik Moore como Malcolm, o protagonista do filme “Dope”| Foto: Rachel Morrison/Open Road Films

Quando Shameik Moore conseguiu o papel de Malcolm, o sujeito mole em um mundo duro que é o centro do filme “Dope” [droga], ele teve um problema.

“Dope” é uma reação, um repúdio e também uma reconciliação com o cinema negro urbano do início dos anos 1990, de filmes como “Uma Questão de Respeito”, “Boyz N the Hood” e “Perigo para a Sociedade”.

Moore, que tem apenas 20 anos e passou grande parte da juventude em escolas cristãs, não tinha visto nenhum desses filmes. Por isso, durante uma semana antes do início das filmagens, ele embarcou em um curso intensivo conduzido por Rick Famuyiwa, o autor e diretor de “Dope”.

O que Moore encontrou foi contexto, mas não inspiração. “Eu acho que o que Rick fez, o modo como ele gravou e editou, torna o filme parecido”, disse Moore, “mas nossa interpretação foi totalmente contrária.”

Isso foi porque “Dope”, em exibição nos EUA e em alguns cinemas da Europa, é uma espécie de fotonegativo desses filmes, mantendo sua estrutura enquanto subverte suas convenções. As dificuldades daquela era do cinema, e sua dependência das histórias de gângsteres, são substituídas por alegria e perspicácia.

No início dos anos 1990, os anti-heróis eram tão atraentes, ou mais, que os heróis. Em contraste, “Dope” adota um tipo de personagem que era efetivamente invisível naquela época —o “nerd” negro— e o reveste de glória.

É uma história de amadurecimento na era moderna, em que os heróis têm mais probabilidade de ser experimentadores criativos, como Kanye West, Pharrell Williams e Donald Glover, do que os rapeiros bandidos de décadas passadas.

“Há alguns gângsteres, mas não foi filmado pela perspectiva de um gângster”, disse Williams, o superastro da música e da moda que serviu como um dos produtores-executivos do filme e também escreveu e produziu sua música.

“Ele se concentra na mentalidade de alguém que é de lá, mas não está lá, sem excluir o bairro.”

Do mesmo modo que os filmes do início dos anos 1990, “Dope” foi feito com orçamento relativamente pequeno. Depois da estreia no festival Sundance em janeiro, tornou-se um dos filmes mais elogiados no circuito de festivais deste ano, iniciando uma guerra de ofertas entre as distribuidoras (Open Road e Sony ganharam, pagando US$ 7 milhões).

O que “Dope” faz é revigorar o meio com novos personagens e perspectivas. Malcolm e seus dois amigos, Diggy (Kiersey Clemons) e Jib (Tony Revolori), são fetiches do hip-hop dos anos 90: tocam em uma banda punk, Awreeoh (pronuncia-se “orio”), e tentam evitar confusões. Eles estão no fundo da cadeia alimentar do colégio, quase anônimos exceto quando são atacados pelos valentões locais.

Malcolm deseja ir para a Universidade Harvard. Em sua busca, uma série de acontecimentos improváveis o conduz, com seus amigos, a um golpe que os leva ao submundo das gangues e da droga que eles passaram anos evitando.

No entanto, todas as pedras angulares do crime são reviradas: eles usam os laboratórios de ciências e de informática da escola como local de trabalho, adotam a internet para ajudar na distribuição, principalmente para jovens brancos de classe média, e os lucros acabam revertidos em Bitcoins.

Malcolm nunca se torna totalmente um anti-herói —assim como o filme, ele joga mais com as expectativas, mudando de atitude e de abordagem conforme a situação permite.

“Dope” não apenas reposiciona o marginal como herói, mas também remove a camada exterior do personagem durão para revelar algo muito mais complexo. Malcolm se vê sob o domínio de Dom, um traficante de droga que entre as transações discute ataques de drones à Al Qaeda e é preciso no uso das palavras.

O que Famuyiwa —que faz 42 anos este mês e passou a adolescência em Inglewood, Califórnia, onde “Dope” é ambientado— quis capturar foi uma simpatia pelas circunstâncias que poderiam levar até um jovem bem-intencionado a um caminho ruim e irreversível.

Isso fala a alguns sobre os matizes que se perderam quando filmes como “Perigo para a Sociedade” e “Boyz N the Hood” tornaram-se um fenômeno. No início dos anos 1990, “a coisa mais pop que você poderia ser era um gângster”, disse Allen Hughes, que com seu irmão Albert escreveu e dirigiu “Perigo...”, o filme mais inclemente daquela era. “Não havia o menor otimismo.”

Famuyiwa apresenta os Bottoms —a área dura de Inglewood onde se passa a maior parte da ação— com intensidade e amor.

Ele disse que “Dope” joga com suas ambições criativas e ao mesmo tempo permite que feche o círculo com os filmes do início dos anos 90 que ajudaram a formá-lo e com a discussão mais ampla sobre o cinema negro.

“Eu deixei muito claro que queria ‘Dope’ naquele gênero “, disse Famuyiwa.

“Queria usar os preconceitos de todo mundo e também a linguagem que aqueles filmes introduziram para perguntar por que, como público, nós aceitamos aquelas convenções tão facilmente.”

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