A privacidade está virando um sonho impossível até para uma das partículas mais nobres do Universo, o fóton, que compõe as várias formas de luz. Pesquisadores da França e da Alemanha conseguiram a proeza inédita de trancafiar um único fóton numa cavidade e observá-lo do "nascimento" à "morte". O feito abre novas janelas para o misterioso mundo da mecânica quântica e pode até ajudar, no futuro, a criar computadores muito melhores do que os atuais.

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A pesquisa foi coordenada por Michel Brune, do Departamento de Física da Escola Normal Superior de Paris, e está na edição desta semana da revista científica "Nature". Até agora, espionar de forma contínua um único fóton (partícula que não é considerada parte da matéria, ao contrário de elétrons e prótons, por exemplo) era muito difícil por um motivo básico: os detectores de luz normalmente absorvem luz. Ao fazê-lo, destroem os fótons que estão chegando.

Era preciso criar um sistema experimental que não engolisse fótons e, ao mesmo tempo, fosse capaz de aprisioná-los um a um por tempo suficiente para realizar medições. Para isso, Brune e companhia usaram uma 'armadilha de luz': uma cavidade de 2,7 cm de comprimento, cujas paredes eram feitas com vidros ultra-refletivo. Nesse espaço, é possível segurar um fóton por 0,13 segundo -- o mesmo tempo que ele levaria para andar um décimo da distância entre a Terra e a Lua na velocidade da luz. Não é brincadeira.

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Depois disso, dois experimentos foram feitos, explicou Brune ao G1. "No primeiro, durante a maior parte do tempo nós observamos uma cavidade vazia. Mas, de quando em quando, um fóton aparece espontaneamente, ou seja, nasce, e desaparece espontaneamente, ou seja, morre", diz o pesquisador.

Mundo quântico

Não entendeu? Não se preocupe: ninguém entende. Assim é o mundo quântico, como é conhecida a escala de tamanho das partículas fundamentais de matéria e energia. No mundo quântico, as coisas não se comportam do jeito como nós, seres macroscópicos, esperaríamos. Uma das esquisitices quânticas é justamente o fato de que as partículas estão sendo criadas e destruídas espontaneamente o tempo todo, mesmo num local que teoricamente está vazio. Daí o aparecimento espontâneo dos fótons de Brune.

Como a temperatura na cavidade é mantida muito perto do zero absoluto -- ou seja, por volta de 270 graus Celsius negativos --, a baixa energia impede que mais de um fóton apareça por vez, diz o físico. "No segundo experimento, nós passamos a injetar intencionalmente um fóton na cavidade, e então observamos a morte desse fóton", conta ele.

Para conseguir fazer mais de 100 medições das características quânticas de cada partícula sem destruí-la, os pesquisadores usaram como detectores um conjunto de átomos do elemento químico rubídio, que eram influenciados pelo campo elétrico produzido pelo fóton sem, ao mesmo tempo, absorver a energia dele. Depois, os átomos é que eram analisados, permitindo que os cientistas estimassem as propriedades do fóton do "nascimento" à "morte".

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Segundo Brune, o principal interesse do experimento é refinar a teoria quântica das medições das propriedades dos fótons. Mas o sistema também ajudaria a usar as propriedades quânticas de uma partícula como forma de guardar dados ou realizar operações matemáticas -- um esboço de um computador muito mais potente e seguro que os atuais.