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Na floresta amazônica, que em maior ou menor proporção cobre sete estados da região Norte do Brasil, muitas vezes é a geografia que determina as rotas internas e internacionais da exploração sexual de crianças e adolescentes.

O Rio Amazonas tornou-se um marco divisor. Para quem vive abaixo dele, fica mais demorada, cara e perigosa uma investida aos países acima da linha do Equador. Daí a opção mais rápida e barata das fronteiras com a Bolívia, onde se ganha menos dinheiro e as privações são maiores. Em ambos os casos, porém, a comunicação entre as regiões emissora e receptora é feita na maioria das vezes via terrestre.

A rodovia federal que liga os estados de Mato Grosso, Rondônia e Acre sai de Cuiabá como BR-070 e chega a Rio Branco como BR-364, depois de mudar para BR-174 no meio do caminho. Independentemente da nomenclatura, esta é a única rodovia disponível à redes de exploração sexual para chegar à Bolívia. Em Rondônia, elas usam vias secundárias como a BR-425 para o acesso a Guajará–Mirim-Guayaramerín e, no Acre, a BR-317 para chegar a Brasiléia–Cobija. Nesses lugares raramente se encontra mulheres ou adolescentes de regiões acima da calha do rio Amazonas.

Para chegar à Venezuela, a única via terrestre é a BR-174, que se estende por 1.300 quilômetros de Manaus a Pacaraima, passando por Boa Vista. Dali a Santa Helena de Uairén bastam 10 minutos de carro, cruzando postos da Polícia e da Receita Federal que se limitam a carimbar passaportes e a controlar entrada e saída de mercadorias. A presença policial resume-se a vistoria de documentos e controle de velocidade, quando muito.

Principal corredor da prostituição

A despeito das péssimas condições de tráfego, a BR-156 é o principal corredor da prostituição na Região Norte. Dois terços dos 600 quilômetros entre Macapá e Oiapoque são dominados por buracos e poeira. Para vencer esse trecho são necessárias 10 horas de carro no verão, ou até 24 horas em veículo com tração nas quatro rodas no período das chuvas (dezembro a junho). Garotas de outros estados têm de vencer antes uma viagem de 24 horas de barco de Belém a Macapá. À capital paraense chega-se pelas BRs 010 e 222 vindo do Sul do estado, ou pela BR-316, vindo do Maranhão.

Na mão contrária das rotas que conduzem brasileiras à Bolívia, duas capitais brasileiras estão no meio do caminho e são locais estratégicos para o tráfico de pessoas. Uma dessas rotas inversas sai de Rio Branco para Porto Velho, de onde as traficadas chegam a Cuiabá e Manaus. Dessa última, adolescentes chegam com facilidade à Venezuela, muitas vezes pelas mãos de caminhoneiros que transportam cargas de Manaus para Boa Vista. Eles usam artimanhas para driblar a fiscalização da Polícia Rodoviária Federal. Uma delas é deixar a menina pouco antes do posto fiscal e aguardá-la mais à frente, depois de ela ter contornado o posto pelo meio do mato.

Crescente violência sexual

Em Rio Branco, há uma crescente violência sexual contra crianças e adolescentes. Em 2004, o Programa Sentinela atendeu 80 casos, que subiram para 114 entre janeiro e julho deste ano, 30 deles de exploração comercial. As vítimas têm idade entre 10 e 17 anos. Na capital de 300 mil habitantes existem 19 áreas de prostituição de menores de idade.

As mais vulneráveis estão nos bairros Papouco, Preventório e Triângulo Velho. "O problema é muito maior do que a gente imagina", observa a coordenadora do programa, Josenira Oliveira da Silva.

Já em Porto Velho, a área crítica situa-se nos arredores do Porto Cai N'Água, de onde saem barcos de cargas e passageiros para Manaus, às terças e sextas. Somente na Rua Madeira-Mamoré (leito da antiga estrada de ferro) existem 25 prostíbulos em menos de 200 metros, com uma média de quatro mulheres por casa. Uma incursão pelo lugar revela que mais da metade tem menos de 18 anos. O movimento cresce nos dias da partida de barcos, meio usado por crianças e adolescentes para ir a Manaus. São quase 2 mil quilômetros e cinco dias de viagem pelo rio Madeira.

As redes de exploração sexual usam, ainda, uma rota aérea para levar mulheres e adolescentes para fora do país. Elas saem nos dois vôos semanais da Surinan Airways de Belém a Paramaribo, de onde são despachadas para a Holanda, Espanha, Alemanha, Itália.

Conforme estimativas da Polícia Federal, pelo menos mil brasileiras vivem em regime de servidão sexual no Suriname e na Guiana Francesa, invariavelmente usadas no transporte de drogas quando enviadas para a Europa.

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