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| Foto: Daniel Kresch/Gazeta do Povo

Palestinos aceitam retomar negociação

As lideranças palestinas pediram que Israel aproveite a oferta feita pelo Quarteto para o Oriente Médio [EUA, União Europeia, Rússia e ONU] e retome as negociações de paz. Os israelenses afirmaram que estão avaliando a proposta do grupo.

"Estamos preparados para assumir nossas responsabilidades em virtude da proposta e do direito internacional", disse Saeb Erekat, principal negociador palestino para o processo de paz com os israelenses. "Espe­ramos que Israel aproveite a oportunidade", concluiu.

O comunicado divulgado pelo grupo pede a apresentação de propostas compreensivas de ambos os lados em três meses para discutir as questões do território e da segurança da região. O Quarteto pede ainda "progressos substanciais" nessas reuniões dentro de seis meses.

A meta seria chegar a um acordo de paz antes do fim de 2012, indica a nota, elaborada depois da reunião entre o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, a secretária de Estado americana, Hillary Clinton, o ministro de Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, e a chefe da diplomacia da União Europeia, Catherine Ashton.

Os prazos são estabelecidos no mesmo dia em que o presidente da Autoridade Palestina (AP), Mahmoud Abbas, apresentou à Assembleia Geral da ONU sua proposta de reconhecimento do Estado palestino. Também nesta sexta, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, rejeitou a iniciativa palestina e advogou pela volta das negociações.

As negociações estão paralisadas desde setembro de 2010 e todos os esforços da comunidade internacional para impulsioná-las novamente foram em vão.

Há 20 anos, uma nova geração de israelenses e palestinos nascia sob o signo da esperança. Em 30 de outubro de 1991, pela primeira vez desde a criação do Estado judeu, representantes dos dois lados aceitavam se reunir para negociar um acordo definitivo na chamada Conferência de Madri. Parecia que a paz neste canto turbulento do Oriente Médio finalmente chegaria — e que os bebês nascidos naquele ano cresceriam em coexistência e tolerância mútua. Duas décadas depois, no entanto, jovens como a israelense Or Vardi e o palestino Rabah Khalil — nascidos em 1991 — ainda enfrentam o mesmo destino de seus pais. A Terra Santa que os dois dividem continua violenta, apesar dos cinco principais acordos de paz assinados depois da conferência — Oslo (1993), Wye Plantation (1998), Camp David (2000), Taba (2001) e Mapa do Caminho (2003). A cada frustração, a violência aumentou de nível. Além da segunda intifada palestina (de 2000 a 2005), houve ainda a Segunda Guerra do Líbano (2006) e a ofensiva à Faixa de Gaza (de dezembro de 2008 a janeiro de 2009), sem contar confrontos pontuais diversos. Agora, os dois lados enfrentam mais um momento decisivo com o apelo do presidente Mahmoud Abbas pelo reconhecimento da Pales­tina pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas — e à revelia de Israel.A israelense Or Vardi nasceu quase um mês depois da Conferência de Madri, que durou três dias e teve moderação de americanos e russos, além da participação da Síria, do Líbano e da Jordânia. O fato foi tão marcante que Or, atualmente cumprindo o serviço militar obrigatório (mulheres servem por dois anos, e homens, por três) ainda se lembra do clima de esperança que tomou conta do país naquele começo de década. Principal­mente depois de 1993, quando, impulsionados pelo fórum na Espanha, líderes israelenses e palestinos assinaram os Acordos de Oslo, que pareciam ser definitivos e deram o Prêmio Nobel da Paz ao presidente palestino Yasser Arafat, ao primeiro-ministro israelense Yitzhak Rabin e ao chanceler Shimon Peres. O famoso aperto de mão entre Arafat e Rabin, sob o olhar atento do presidente americano Bill Clinton, ficou marcado na família da menina de 2 anos.

"Eu era muito pequena, mas lembro claramente do clima de esperança. Mas me lembro mais ainda da dor do assassinato de Rabin (1995). A morte dele foi um baque. Parecia que tudo tinha acabado. Acho que é por isso que não acredito em Deus", conta Or, filha de uma família de classe mé­­dia da cidade de Hod Ha-Sharon, ao norte de Tel Aviv.

O assassinato de Rabin pelo extremista judeu Yigal Amir, contrário à criação de um Estado palestino, foi um dos muitos contratempos à paz no Oriente Médio. Desde então, a esperança foi minguando. A cada acordo que não deu certo, a cada explosão de violência, atentados terroristas e guerra, as novas gerações aprenderam a duvidar mais e mais da possibilidade de paz. O estudante palestino Rabah Khalil espelha esse ceticismo:

"Podemos até ter períodos de calmaria. Mas paz mesmo, nunca vamos ter", decreta o rapaz, que estuda Administração na Uni­versidade Bir Zeit, perto de Ramallah. "Dizem que esta terra é sagrada. Mas, para mim, ela é, na verdade, amaldiçoada."

Rabah nasceu no Brasil de pais palestinos e imigrou para a Cisjordânia aos 8 anos de idade. Ele ainda se lembra do clima de euforia da época em que chegou, em 1999. Naquele ano, israelenses e palestinos pareciam mais próximos do que nunca de aceitarem uns aos outros. A cooperação entre os dois povos era quase exemplar. Mas, no ano seguinte, tudo desandou com o fracasso das negociações de Camp David entre Yasser Arafat e o então premier israelense, Ehud Barak.

A frustração deu lugar a uma onda de violência sem precedentes com a eclosão da segunda intifada. E Rabah sentiu isso na pele. Certo dia, o Exército de Israel lançou uma bomba de efeito moral — que emite um som insuportável — dentro de sua escola. Ele não esquece do pânico que sentiu.

"Voltei para casa chorando e me perguntando: ‘O que estou fazendo aqui?’. Naquele momento, entendi que a realidade do Oriente Médio é cruel", conta o jovem, acrescentando que conhece muitas famílias que perderam filhos, vítimas de soldados israelenses.

Do lado israelense, Or também experimentava traumas próprios. Em 2002, no auge da intifada que sucedeu ao fracasso de Camp David, ela sobreviveu a um atentado terrorista em Tel Aviv. Era a onda dos homens-bomba que aterrorizava as principais cidades do país.

"Estava numa loja fazendo compras e assim que saí, um suicida se explodiu lá dentro. Foi por pouco. Desde aquele dia, tenho medo de andar de ônibus e vejo supostos terroristas nas ruas", afirma. "Meu vizinho perdeu um filho num desses atentados."

Or já sonha com a vida civil e em viajar pelo mundo. Segundo ela, em Israel há uma sensação de sufocamento. O país pequeno, menor que o estado do Sergipe, rodeado por vizinhos hostis, leva-a a querer fugir da região. Mas, ao mesmo tempo em que sonha deixar para trás a realidade, ela sabe que pode receber olhares enviesados no exterior.

"As pessoas me olham diferente, com desaprovação, quando eu digo que sou israelense. Eles só veem nas notícias o que Israel faz de errado. A mídia não mostra nosso lado bom ou os nossos motivos", reclama a jovem.

A menos de 100 quilômetros de distância, em Ra­­mallah, o palestino Rabah pensa exatamente o contrário. Para ele, o mundo só vê o viés de Israel, sem se importar com o sofrimento dos palestinos. Como muitos jovens de sua geração, Rabah já foi humilhado em postos de controle israelenses pela Cisjordânia. Certa vez, conta ter sido apalpado e interrogado por três horas só porque mostrou seu passaporte brasileiro. Os soldados desconfiaram que era falso.

A distância entre Or e Rabah, que provavelmente nunca vão se encontrar, parece diminuir quando os dois jovens — vítimas de uma realidade que não escolheram — falam sobre o desejo de ambos os povos por um futuro melhor.

"Tenho certeza de que a maioria absoluta, tanto entre nós quanto entre eles, quer a paz. São os governos que não conseguem se entender", acredita Rabah.

A israelense completa, quase em uníssono:

"Sei que os palestinos são pessoas boas, que querem a paz justamente como nós. O que falta por aqui são líderes capazes de concretizar essa esperança."

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