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Existem personagens que acabam entrando na história sem desejar isso. Parece ser o caso de Edmundo González Urrutia, o ex-candidato à presidência da Venezuela cuja prisão foi decretada na segunda-feira (2) pela Justiça do país, dominada pelo chavismo.
O ex-diplomata, que completou 75 anos na semana passada, sempre teve um perfil discreto e nunca havia sido um nome de grande destaque da oposição da Venezuela, para onde migrou após ter sido embaixador do país na Argentina entre 1998 e 2002, pegando os primeiros anos da ditadura de Hugo Chávez.
À época, chegou a publicar um artigo no jornal La Nacion elogiando o governo da Argentina por ter se oposto a uma tentativa de derrubada do chavista em abril de 2002.
Depois, González foi para a oposição e foi presidente, entre 2013 e 2015, da Mesa da Unidade Democrática (MUD), que daria origem à coalizão Plataforma Unitária Democrática (PUD), pela qual concorreu à presidência em 28 de julho deste ano.
O ex-diplomata só foi o candidato porque a PUD não conseguiu inscrever suas primeiras opções. María Corina Machado, líder da coalizão, não pôde concorrer devido à inabilitação política imposta pelo regime chavista, e o bloco não conseguiu inscrever Corina Yoris, candidata escolhida para substituí-la, porque o sistema do Conselho Nacional Eleitoral (CNE) da Venezuela não permitiu.
González foi registrado apenas provisoriamente, com o objetivo de assegurar vaga para a PUD nas cédulas de votação, e acabou ficando.
Simpático, de fala mansa, conquistou o eleitorado venezuelano. Segundo cópias de mais de 80% das atas de votação, ele foi o vencedor em 28 de julho, mas o CNE, sem apresentar documentação para comprovar, apontou vitória do ditador Nicolás Maduro.
No dia seguinte à eleição, a PUD disponibilizou em um site essas atas, que conseguiu recolher por meio de fiscais eleitorais e apoiadores, e a ditadura chavista encontrou a desculpa que queria para perseguir González.
A Procuradoria-Geral da Venezuela, fiel a Maduro, abriu uma investigação criminal contra ele pelo site e o intimou três vezes para que prestasse depoimento. González não compareceu e, após a terceira e última intimação não atendida, na sexta-feira (30), o Ministério Público pediu uma ordem de prisão contra ele nesta segunda-feira. Poucas horas depois, a Justiça chavista atendeu ao pedido e determinou sua detenção.
González já se tornou um símbolo da resistência venezuelana. Caso seja preso, seu nome ganhará ainda mais força internacionalmente – Estados Unidos, a secretaria geral da ONU, a Organização dos Estados Americanos (OEA), a União Europeia e países latino-americanos (incluindo Brasil e Colômbia) criticaram a ordem de detenção.
“Eles [chavistas] perderam toda a noção da realidade. Ao ameaçar o presidente eleito, apenas conseguem nos unir mais e aumentar o apoio dos venezuelanos e do mundo a Edmundo González”, escreveu Machado no X, segundo informações do jornal venezuelano El Nacional.
Nesta terça-feira, o advogado de González, José Vicente Haro, disse à imprensa venezuelana que o ex-candidato oposicionista ainda não pediu asilo em nenhuma embaixada em Caracas e que ele está indo “de casa em casa para resguardar sua vida”.
“Neste reinado de medo que quer impor, o governo talvez não veja agora um custo adicional [perante a comunidade internacional] em prender Edmundo González. A questão é até onde isso vai, se realmente o prenderão ou permitirão que procure refúgio numa embaixada. Se o prenderem, o próximo passo será prender María Corina Machado, que é a joia da coroa”, afirmou o analista político Luis Remiro, ao site Efecto Cocuyo.