Guarda coletou amostras da água para medir nível de chumbo presente nela| Foto: Sarah Rice/AFP

Flint, no Estado americano de Michigan, é uma cidade em estado de emergência. O motivo é a água turva que sai das torneiras desde 2014 com alta concentração de agentes tóxicos, que tem gerado revolta e pressão crescente para que o governador do Estado, Richard Snyder, renuncie ao cargo.

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Snyder e seu governo são acusados de terem ignorado por meses as queixas de moradores sobre a cor amarelada e indícios de contaminação da água que chegava às casas. O caso começou a virar controvérsia nacional no fim do ano passado, quando a ameaça à saúde da população tornou-se inegável. Esta semana, em seu discurso anual do Estado da União, o governador pediu desculpas.

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“O governo falhou com vocês, tanto o federal e o estadual, quanto os líderes locais, ao trair a confiança que vocês depositaram em nós”, disse Snyder aos moradores de Flint. “Peço desculpas.”

Nesta quinta (21), a responsável pela região do Meio Oeste americano na Agência de Proteção Ambiental (EPA, na sigla em inglês), renunciou ao posto.

A crise teve origem em abril de 2014, quando Flint estava sob o controle de um gestor nomeado pelo Estado de Michigan para lidar com a crise financeira da cidade.

A fim de cortar custos, as autoridades optaram pelo desligamento do sistema hídrico de Detroit e passaram temporariamente a usar a água do rio Flint para abastecer a cidade, até que um novo reservatório estadual ficasse pronto. Pelas estimativas, a medida levaria a uma economia de mais de US$ 8 milhões para os cofres da cidade.

Ocorre que a água do rio era altamente corrosiva, o que levou os antigos canos da cidade a se desfazer, soltando quantidades tóxicas de chumbo. Os moradores logo notaram a mudança na cor da água e um aumento de sintomas como dores de cabeça, irritações de pele e até queda de cabelo.

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Chumbo

Em setembro passado, um grupo de médicos recomendou que o consumo de água da torneira fosse suspenso após detectar altos níveis de chumbo no sangue de crianças de Flint. Um estudo feito com amostras coletadas em 271 lares da cidade comparou a água da cidade a “lixo tóxico”. Ainda assim, as autoridades continuaram a dizer que a água era segura, para espanto dos moradores.

A pressão não cedeu e o governo de Michigan acabou decidindo reconectar o abastecimento ao sistema hídrico de Detroit. No dia 5 de janeiro, Snyder declarou estado de emergência e convocou a guarda nacional para ajudar na distribuição de garrafas d`água à população.

As autoridades de saúde estão investigando se há ligação entre a água contaminada e o aumento significativo do número de pacientes com um problema respiratório conhecido como “doença do legionário”. Entre abril de 2014 e outubro de 2015 foram registrados 87 casos da doença em Flint, com pelo menos dez mortes confirmadas.

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No último fim de semana, o presidente dos EUA, Barack Obama, assinou uma determinação que destina US$ 5 milhões em fundos de emergência federais para ajudar a contornar a crise em Flint. Em entrevista a uma emissora de TV, Obama chamou de “inexplicável e indesculpável” a demora das autoridades em suspender o abastecimento de água contaminada, mesmo diante dos indícios.

Para aplacar a revolta e demonstrar transparência, Snyder divulgou nesta semana mais de 200 páginas de emails que trocou ao longo do último ano sobre a água de Flint. Neles é possível detectar um jogo de empurra entre autoridades locais e do Estado à medida em que a crise se agravava.

Preconceito

A negligência, afirmam alguns, está ligada ao preconceito racial e ao abandono das camadas mais humildes da sociedade pelas autoridades. “Uma cidade inteira dos EUA exposta a água venenosa, como pode?”, questionou Charles M. Blow, colunista do “The New York Times”. “É difícil imaginar isso acontecendo em uma cidade que não tem o perfil demográfico de Flint, de maioria negra e desproporcionalmente pobre.”

Hillary Clinton, favorita entre os pré-candidatos do Partido Democrata à Casa Branca também tocou na questão racial. “Estaríamos indignados se isso acontecesse a crianças brancas. E deveríamos estar indignados de estar ocorrendo neste momento a crianças negras”, disse ela num discurso nesta semana.

Nascido em Flint, o controvertido documentarista Michael Moore publicou uma petição online pela demissão imediata do governador. Além disso, exorta o presidente Obama a abrir uma investigação que, se concluir responsabilidade do governo estadual, leve Snyder à cadeia.

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“As crianças de Flint, que já estão entre as mais pobres dos EUA, agora terão que levar a vida com dor, danos cerebrais irreversíveis e QI mais baixo por causa das ações do governador Snyder”, diz a petição.