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O avanço do governo de Cristina Kirchner sobre o Banco Central aponta para o fim da autonomia da autoridade monetária argentina. O líder governista na Câmara, Agustín Rossi, confirmou as informações de parlamentares ouvidos pela AE de que o governo vai propor uma reforma da Carta Orgânica do BC (estatuto).

A comissão parlamentar especial emitirá mais tarde nesta terça-feira, a partir das 16 horas, o parecer sobre a exoneração, por decreto, de Martín Redrado da presidência do Banco Central. Mesmo após a apresentação da renúncia de Redrado na sexta-feira, a comissão vai se pronunciar sobre o assunto para tentar encerrar o caso.

"Estou certo de que durante o debate do Fundo do Bicentenário a reforma na dinâmica da Carta Orgânica do BCRA é algo que vai sair", afirmou Rossi em entrevista à imprensa, ontem. O fundo foi criado por decreto em 14 de dezembro, com recursos de US$ 6,5 bilhões das reservas internacionais para pagar vencimentos da dívida em 2010.

Redrado negou-se a transferir o dinheiro às arcas do Tesouro e, por isso, foi exonerado por decreto. Uma medida cautelar o devolveu ao cargo, de onde acabou renunciando na última sexta-feira, depois de 22 dias de idas e vindas. Na segunda-feira, Redrado retirou da Justiça a ação para manter-se na presidência do BC.

A manobra, no entanto, não evitará que a comissão parlamentar emita o seu parecer apoiando o fim antecipado do mandato de cinco anos de Redrado, que expiraria em setembro. A resistência de Redrado a cumprir os dois decretos presidenciais (o de criação do fundo e o de sua exoneração) estimulou a Casa Rosada a acabar com a autonomia do BC e transformá-lo em uma instituição subordinada às políticas do Executivo.

A primeira jogada de Cristina Kirchner e seu marido, o deputado e ex-presidente Néstor Kirchner (2003-2007), será conseguir o aval do Legislativo para reverter a decisão da Justiça de suspender a medida e, posteriormente, colocar o fundo da dívida em andamento. Uma vez conseguida a aprovação na Câmara ou no Senado do decreto de criação do fundo, os Kirchner vão tentar reformar as normas do BC.

Embora Rossi tenha admitido essa intenção do governo, ele negou a existência de um projeto para esse fim, mas o deputado aliado ao governo, Carlos Heller, ex-presidente do banco Credicoop, confirmou que trabalha em sua elaboração. "Acho pouco séria esta ideia subjacente de que o BC é uma espécie de Estado independente dentro do Estado", opinou Heller, em entrevista ao jornal "El Cronista".

"Devemos encontrar uma lei razoavelmente equilibrada onde o BC tenha responsabilidade na política monetária, cambial, etc., mas também a obrigação de coordenar políticas com o resto das políticas públicas", afirmou. Heller disse que "estuda a experiência do BC brasileiro e seu Conselho Monetário Nacional (CMN), que atua de acordo com a diretriz do presidente e está integrado pelo ministro de Economia e outros funcionários e o BC".

Segundo ele, "com estas diretrizes, o BC executa as políticas com autonomia". A reforma do BC introduziria uma norma permitindo o uso das reservas excedentes, hoje em US$ 18 bilhões, para financiar as pequenas e médias empresas com juros baixos. A oposição já levantou a acusação de que o objetivo da Casa Rosada é transformar o BC em um banco de fomento para financiar o gasto público.

Compra de dólares

O ex-presidente Néstor Kirchner confirmou a compra de US$ 2 milhões em divisas, em outubro do ano passado, em plena crise econômica mundial. Na ocasião, o BC argentino realizava fortes intervenções no mercado para manter a estabilidade da moeda nacional, o peso. No entanto, Kirchner negou que a operação tenha sido com o objetivo de obter lucro cambial. A confirmação foi feita por um e-mail que o ex-presidente e atual deputado enviou ao jornalista argentino Víctor Hugo Morales e foi divulgado pela imprensa local.

A mensagem afirma que a operação teve o propósito de concretizar a compra de um pacote acionário da Hotesur S.A, empresa proprietária do Hotel Alto Calafate, na Província Natal do ex-presidente, avaliado em US$ 10 milhões. "Para formalizar dita aquisição, cujo pagamento se realizou em dólares norte-americanos, efetuei as compras destas divisas, durante os dias 9,15 e 23 de outubro, até completar um total de 1.999 999,80 dólares, dentro do limite mensal permitido para pessoas físicas", disse Kirchner.

A mencionada operação, continuou, junto a "outros montantes provenientes de meus investimentos em dita moeda", pagaram a aquisição das ações. Kirchner disse ainda que "não existiu, obviamente, possibilidade de benefício cambial", devido ao fato de que o pagamento foi efetuado com os mesmos dólares que ele havia comprado na operação denunciada nos últimos dias, pela imprensa local. Kirchner esclarece também que os dólares, "adquiridos conforme as regras do Banco Central da República Argentina", foram depositados em uma caderneta de poupança até a concretização da compra do pacote acionário.

Por causa destes dólares, Kirchner poderá ser alvo de nova investigação da Justiça. O deputado da Coalizão Cívica, de oposição, Juan Carlos Morán, prepara uma denúncia contra o casal Kirchner por delito previsto no Código Penal argentino, cujo artigo 268 contempla sanções para "o funcionário público que, com fins de lucro, utilizar para si ou para um terceiro informações ou dados de caráter reservado dos quais tenha tomado conhecimento em função de seu cargo". O delito pode ser penalizado por um a seis anos de prisão.

No final do ano passado, a Justiça absolveu os Kirchner no processo em que eram acusados de suposto enriquecimento ilícito. Conforme a declaração de bens do casal em 2008, a fortuna dos Kirchner aumentou quase 500% desde que chegaram ao poder, em maio de 2003. No primeiro ano de mandato de Cristina, em 2008, o patrimônio cresceu 158% e saltou de US$ 4.690 milhões para US$ 12.114 milhões.

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