Curitiba Depois de 20 anos, o Paraná volta a receber o Simpósio Nacional de História. A 23.ª edição do encontro começa hoje e vai até o dia 22, na Universidade Estadual de Londrina (UEL). O evento, que ocorre a cada dois anos, terá como tema "Guerra e Paz", com mini cursos, mesas-redondas, grupos de trabalho e conferências que reunirão quase 5 mil estudiosos, entre professores, pós-graduandos e estudantes de graduação vindos do Brasil e do exterior. O coordenador do Simpósio, professor José Miguel Arias Neto, do departamento de História da UEL, falou à Gazeta do Povo sobre as razões para a escolha do tema em 2005 e questões ligadas à guerra, especialmente na atualidade.
Gazeta do Povo Por que a escolha do tema "Guerra e Paz" para o simpósio de 2005?
José Miguel Arias Neto Este tema foi escolhido há dois anos, na Paraíba, e foi sugerido por um professor da Universidade Federal Fluminense. Naquela época, estávamos sob o impacto da guerra do Iraque, de ataques terroristas como o de 11 de abril na Espanha, e achamos que aquele assunto era o mais interessante para discutirmos. Em 2005 também temos eventos como os 60 anos do fim da Segunda Guerra Mundial, mas o fator determinante foi realmente a realidade atual. Está enganado quem pensa que o historiador é uma pessoa que olha apenas para o passado.
Quais são os destaques do simpósio?
Vamos discutir conflitos desde a Antigüidade, passando por todos os períodos históricos. O modo de fazer guerra mudou muito, as guerras não são todas iguais. Temos duas palestras que eu gostaria de destacar. O cubano Hernán Delgado vem falar das guerras de independência na América Latina, e Geoff Eley, da Michigan State University, nos Estados Unidos, tem como tema a consolidação da democracia.
Algum episódio da História do Brasil terá maior destaque?
O professor André Toral, da Universidade de São Paulo (USP), dará uma palestra sobre a guerra do Paraguai, um assunto que anda muito esquecido no país. Curiosamente, ainda há vários documentos deste período que são confidenciais, assim como os arquivos da ditadura militar. Teremos uma discussão também sobre esse período recente da história, porque o simpósio não tratará apenas da Guerra formal e entre países. O terrorismo, a guerrilha, os conflitos sociais, a luta no campo e até a violência urbana também são formas de guerra.
Em milênios de guerra, o que o ser humano aprendeu?
Acho que não aprendemos muita coisa. Veja, estamos no século 21, quando tantas questões básicas deveriam estar resolvidas e não estão. O mundo está muito longe daquele ideal pensado na Ilustração, de uma comunidade internacional. Talvez a única coisa construtiva que tenhamos aprendido é que uma guerra nuclear realmente acaba com tudo e não deixa vencedor. Mas, por outro lado, a indústria bélica está cada vez mais sofisticada, então aprendemos a destruir melhor.
Os historiadores identificam percepções erradas, mas que são comuns, sobre o cenário atual?
Há algumas, e certamente a mais importante é o estigma que os palestinos e os muçulmanos em geral passaram a carregar. O islamismo ficou associado ao terrorismo, quando na verdade o Islã é uma religião pacífica. Depois do 11 de Setembro, havia muçulmanos sendo agredidos na rua. Para saber que o Islã não significa barbárie, é só olhar para o Brasil, onde existe um convívio harmonioso entre os vários povos.
Qual papel as organizações internacionais vem desempenhando na missão de evitar a guerra e promover a paz?
Especialmente a Organização das Nações Unidas (ONU) tem um papel fundamental na construção do diálogo internacional, apesar de todas as suas deficiências. Ruim com a ONU, pior sem ela, eu diria. Seu fortalecimento é fundamental, mas com reformas. A ONU respondeu bem à realidade na qual ela foi criada, no pós-guerra. Mas, de lá para cá o mundo mudou muito, mas a ONU continuou igual. Por isso as reformas na instituição são urgentes.
Há algumas décadas, os conflitos eram encaixados no paradigma da Guerra Fria, de capitalismo contra comunismo. Hoje existe algum outro critério para determinar o surgimento das guerras?
Acredito que a expansão do capitalismo ainda esteja por trás das guerras contemporâneas mesmo depois da queda dos regimes comunistas. A economia é mais importante do que nunca, e podemos ver o exemplo do Iraque. Os Estados Unidos dizem que estão lá para levar a civilização e a democracia, mas não vemos nem uma coisa, nem outra. Agora, quanto ao futuro, se haverá um novo paradigma para as guerras, é impossível dizer.
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