A guerra da Ucrânia, iniciada com a invasão em grande escala deflagrada em fevereiro do ano passado pela Rússia, ameaça a influência de Moscou em todo o mundo – a prova é a situação da Armênia, pequena ex-república soviética de cerca de 3 milhões de habitantes.
O governo armênio se queixa que o foco russo no conflito na Ucrânia está fazendo o país de Vladimir Putin virar as costas para a antiga aliada, integrante da Organização do Tratado de Segurança Coletiva (OTSC), uma espécie de “OTAN da Rússia” que, além dos dois países, tem também Belarus, Cazaquistão, Quirguistão e Tajiquistão como integrantes.
A Armênia alega que a Rússia vem se afastando do compromisso de protegê-la do vizinho Azerbaijão, que tem capacidade militar maior. Os dois países têm uma divergência histórica sobre a região de Nagorno-Karabakh, localizada dentro do Azerbaijão, mas que possui população étnica armênia.
Desde o fim da União Soviética, a área motivou duas guerras entre os dois países, e a Rússia interveio para garantir a segurança armênia e o cessar-fogo.
Moscou também deveria assegurar a livre circulação entre a Armênia e Nagorno-Karabakh, por meio de uma estrada conhecida como Corredor de Lachin, mas desde o final do ano passado o Azerbaijão tem bloqueado essa ligação, o que dificulta a entrega de alimentos, medicamentos e outros itens e gera temores de uma nova guerra.
Nesta segunda-feira (18), o governo do Azerbaijão informou que caminhões com ajuda humanitária chegaram a Nagorno-Karabakh, mas a tensão permanece.
“Tudo isto deveria estar na esfera de responsabilidade das forças de manutenção da paz russas e, considerando-se que estas questões surgiram, as forças de manutenção da paz russas falharam na sua missão”, disse o primeiro-ministro armênio, Nikol Pashinian, em entrevista ao site Politico na semana passada.
“Como resultado dos acontecimentos na Ucrânia, as capacidades da Rússia mudaram”, disse Pashinian, que acusou Moscou de evitar desagradar o Azerbaijão e o seu aliado próximo, a Turquia, por questões estratégicas.
Em razão desse afastamento, a Armênia está buscando alternativas à Rússia. Na semana passada, Pashinian anunciou que o país ratificará integralmente o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (TPI), o que o obrigaria a prender Putin caso este viaje à Armênia.
Em março, o TPI emitiu uma ordem de prisão contra o presidente russo devido à deportação de crianças de áreas ocupadas da Ucrânia para a Rússia, o que torna obrigatório que todos os países integrantes da corte de Haia o prendam em caso de visita aos seus territórios.
Porém, o governo armênio sustenta que a decisão não está relacionada às relações armênio-russas, mas sim aos problemas de segurança do país. A adesão permitiria que a Armênia levasse casos ao TPI contra o Azerbaijão pelas disputas por Nagorno-Karabakh, bem como por questões de demarcação de fronteiras.
O anúncio provocou inquietação em Moscou, que pediu explicações a Yerevan sobre a possível ratificação do estatuto.
Outro fato que gerou desgaste entre os dois países é um exercício militar conjunto da Armênia com os Estados Unidos, iniciado na semana passada e que vai até esta quarta-feira (20).
O Ministério das Relações Exteriores russo convocou o embaixador armênio em Moscou para apresentar um protesto formal contra o exercício militar e outras medidas da Armênia que descreveu como “hostis”, como as recentes declarações de Pashinian de que a Rússia está “se retirando” do sul do Cáucaso, outras manifestações de altos funcionários armênios e a prisão de jornalistas e blogueiros pró-russos.
O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, rejeitou as alegações armênias de que a Rússia estava deixando a segurança do país de lado e disse que ambos continuarão “a ser aliados e parceiros próximos”.
“Podemos ter alguns problemas, que precisam ser resolvidos através do diálogo, porque a lógica do nosso desenvolvimento e os interesses nacionais de ambos os países geram a necessidade de aprofundar ainda mais a nossa aliança e parceria”, afirmou Peskov.
Ao Politico, Pashinian disse que, apesar do exercício militar com os americanos, os armênios buscam “diminuir ao máximo” sua dependência de outros países em termos de segurança.
“O modelo segundo o qual temos problemas com os nossos vizinhos e temos que chamar outros para nos proteger, não importa quem sejam esses outros, é um modelo muito vulnerável”, disse o primeiro-ministro. (Com Agência EFE)
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