Crescem os rumores de que o governo e a oposição estejam negociando a antecipação das eleições presidenciais na Venezuela - até uma data estaria sendo discutida nos bastidores: entre fevereiro e março de 2020. De que maneira isso poderia ocorrer ainda é exercício de imaginação, mas fontes em Caracas afirmam que o Partido Socialista Unido da Venezuela (PSUV), diante desse cenário hipotético, já teria o seu candidato preferido para encarar o pleito - e não é Nicolás Maduro.
Seu nome é Héctor Rodríguez. Governador de Miranda, um dos estados mais importantes da Venezuela, desde outubro de 2017, este advogado de 37 anos já liderou vários ministérios durante os mandatos de Maduro e do ex-presidente falecido Hugo Chávez. Foi deputado na Assembleia Nacional e recentemente assumiu a tarefa de dialogar com a oposição uma saída pacífica para a crise política venezuelana - junto com o ministro da Comunicação, Jorge Rodríguez, e o chanceler, Jorge Arreaza, que também fazem parte da comitiva oficialista.
É chavista da ala pró-Maduro, mas não depende de uma facção dentro do partido. Esta autonomia, segundo explicou o jornalista Franz von Bergen em um artigo publicado logo após a eleição de 2017, se dá por ele ter sido um dos “escolhidos” de Chávez. Em 2007, ficou conhecido como “a peça central da resposta que o chavismo criou para fazer frente ao movimento estudantil” do qual Guaidó fez parte. Um ano depois, Rodríguez assumiu como ministro de Despacho da Presidência de Chávez.
Em uma entrevista concedida ao canal Globovision em março, o governador de Miranda defendeu Maduro, mas admitiu que mudanças radicais eram necessárias no governo. “A situação do país não é a mesma [do período] da bonança petroleira. A situação do país agora é outra”, disse ao elencar as áreas que considera prioritárias para a Venezuela: economia, serviços públicos, políticas sociais, democracia protagonista e segurança. Depois da crítica branda, veio o afago: “o presidente tem mostrado, com muita capacidade de diálogo e muita tolerância, uma grande liderança”.
Rodríguez também tem contato com a oposição. Disse certa vez, em uma entrevista, que tem “amigos como Stalin ou Pizarro”, deputados da oposição, e “colegas que são oponentes”, com os quais se dá muito bem.
Por que ele seria uma aposta melhor do que Maduro? Apesar de ter menos apoio popular do que o ditador, segundo pesquisas de opinião pública, seria muito mais fácil impulsionar seu nome em uma corrida presidencial, já que sua rejeição também é menor - inclusive diante de outros nomes fortes dentro do PSUV, como Diosdado Cabello, presidente da Assembleia Nacional Constituinte - e ele não faz parte da lista de autoridades chavistas sancionadas pelos Estados Unidos. Além disso, ele é jovem e tem um perfil mais parecido com o de Guaidó, o que seria uma vantagem em uma eventual disputa nas urnas.
“Embora seja vinculado ao chavismo, ele é uma figura relativamente nova e não muito atrelada a grupos do partido que são vistos de uma maneira desfavorável pela opinião pública, como os próprios militares”, conta Pedro Silva Barros, que atualmente realiza estudos de pós-doutorado sobre integração da América do Sul na Universidade de São Paulo (USP).
Oficialmente, porém, o nome de Héctor Rodríguez nunca foi mencionado pelo governo chavista como um potencial sucessor.
A negociação com a oposição e a possibilidade de eleição
Esta foi mais uma semana de conversas entre representantes do regime e a oposição. Em continuidade aos diálogos mediados pela Noruega, iniciados em junho, os dois grupos se encontraram em Barbados. Voltaram para a Venezuela nesta quinta-feira sem muitas coisas a dizer, mas com muita especulação de bastidores. O que se tem por certo, por enquanto, é que o diálogo vai continuar e que ambas as partes farão consultas para avançar as negociações - algo que, considerando a polarização na Venezuela, é bastante positivo.
A eleição antecipada está na pauta dessas reuniões e inclusive se discute a permanência de Maduro no Palácio Miraflores durante o período de transição ou uma possível candidatura de Maduro - o que só aconteceria se o PSUV tivesse certeza de que teria o controle total sobre o processo eleitoral, já que sua imagem está muito desgastada para concorrer em uma eleição democrática.
Contudo, analistas políticos avaliam que, neste momento, são pouquíssimas as chances de que isso ocorra.
Um dos motivos para o ceticismo, segundo Benigno Alarcon-Deza, cientista político e professor da Universidade Católica Andrés Bello (UCAB, na Venezuela), é o histórico da postura do regime em negociações com a oposição, que usa o diálogo como uma forma de ganhar tempo e desprestigiar a oposição, “porque se sabe que entre a população há uma crítica muito forte à oposição que se senta para negociar com o governo. Ela passa a ser vista como derrotada e incapaz de propor uma solução”.
Mas o principal motivo que o faz desacreditar nesse processo de diálogo é que, em sua opinião, Maduro ainda sente que tem espaço de manobra para conseguir continuar governando. “Esta pressão que está sobre o governo, tanto interna quanto externa, ainda não é suficiente para que ele abra mão e convoque eleições democráticas. Ninguém convoca eleições sabendo que vai perder, a não ser que não haja outra opção, como aconteceu com o Pinochet no Chile, por exemplo”.
Barros tem outra visão, mas igualmente cética quanto aos diálogos intermediados pela Noruega. Segundo ele, é de interesse de vários atores envolvidos na crise venezuelana que Maduro continue no poder: para a oposição é mais interessante enfrentá-lo do que a outro candidato, porque a imagem de Maduro é muito desgastada; para os grupos do chavismo, ele é uma espécie de escudo às críticas - e dezenas de militares estão protegidos por este escudo; para os atores internacionais, como Brasil, Chile e Estados Unidos, a crise da Venezuela tem peso na política interna e pode ser usada para atrelar a imagem de Maduro a adversários.
Então por que Guaidó aceitou conversar com o regime novamente? Bom, não restaram muitas opções depois do fracassado levante de 30 de abril. E também porque não é de interesse da oposição fazer uso da força para derrubar Maduro.
Além das eleições antecipadas, fontes com conhecimento das conversas afirmam que estão sendo discutidas a criação de um novo Conselho Nacional Eleitoral, a dissolução da Assembleia Nacional Constituinte, a incorporação do PSUV na Assembleia Nacional e o levantamento de sanções contra a Venezuela - soluções estas que teriam o apoio da China.
Parece haver um clima de otimismo que parte de ambos os lados, segundo análise da imprensa venezuelana e uma publicação do próprio ministro Jorge Rodríguez, que classificou como “intercâmbio exitoso” a viagem a Barbados. Mas por enquanto, o entendimento entre regime e opositores é apenas um entre os tanto cenários que podem ocorrer na Venezuela.
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