O Hezbollah, partido formado por muçulmanos xiitas do Líbano, já arregaçou as mangas para disputar as próximas eleições parlamentares, em junho. A novidade é que, apoiado por cristãos, o grupo armado quer deixar de lado a tradição nacional de divisão religiosa de poderes, em que o presidente é sempre um cristão maronita, o premier, um muçulmano sunita e o presidente do Parlamento, um xiita. Essa é a opinião do cientista político José Farhat. Ele abriu no último dia 12 o curso "Reflexões sobre o mundo árabe contemporâneo", que continua dias 19 e 20 na Associção Comercial do Paraná. Farhat falou à Gazeta do Povo sobre a região sírio-libanesa.
De que forma a divisão territorial do Oriente influencia conflitos atuais na região?
José Farhat Durante a 1ª Guerra Mundial, os árabes se levantaram contra o Império Otomano e foram à guerra ao lado dos ingleses, mediante a promessa de independência. Ao mesmo tempo, os britânicos acordaram com a França dividir os países árabes e prometeram a Palestina aos judeus. Traíram os árabes, e isso está na raiz dos conflitos atuais.
Os conflitos do Oriente têm menos fundo religioso do que se imagina?
Muito menos. É mentira que os movimentos políticos da região sejam religiosos. A direita libanesa, por exemplo, é formada principalmente por um partido cristão e pelo Hezbollah, formado por muçulmanos xiitas. O maior grupo aliado do governo é um partido cristão onde há muçulmanos sunitas. Isso prova que o que manda são posições ideológicas, e não religiosas.
Existe possibilidade de diálogo entre as religiões?
O Hezbollah e seu partido aliado cristão estão tão grandes que são capazes de ganhar as eleições de junho. E eles pretendem acabar com a tradicional divisão religiosa dentro do governo.
Como se formou a associação entre o mundo árabe e o terror?
Você recebe notícias da Al-Jazeera? Não, só recebemos notícias do Ocidente. Há um fundamentalismo cristão de extrema direita contra o Oriente. Espero que Obama envie emissários para conversar... e não mais soldados.
A Síria acaba de anunciar abertura de embaixada em Beirute, no Líbano. Como ocorreu o avanço da diplomacia entre os países?
No pós-Guerra, a França criou duas repúblicas. Os libaneses eram de maioria cristã, mais educados, e tinham menos filhos, enquanto os muçulmanos tinham o dobro... Houve então um desequilíbrio demográfico. Quando veio a independência, os cristãos do Líbano quiseram permanecer dependentes da França e falando francês. A Síria enviou tropas para a região e, após a guerra, continuou lá, só se retirando quando foi acusada pelo assassinato do premier Rafic Hariri. Quando foi eleito o presidente libanês Michel Suleiman, seu primeiro passo foi ir à Síria apertar mãos e trocar embaixadas.