
Hillary Clinton chega ao Brasil na quarta-feira com a intenção de preparar o terreno para uma provável vinda do presidente Obama no segundo semestre, o que envolve uma missão quase impossível: demover o país de seu apoio irrestrito ao programa nuclear do Irã.
"O Brasil agora é um país com alguma influência", disse à Gazeta do Povo o professor de História e Políticas Sociais da Universidade Harvard Alexander Keyssar. "Existe uma ironia aqui. O Brasil importa justamente porque tem buscado uma posição independente."
Como ficou claro com a visita prévia do subsecretário de Estado para Assuntos Políticos dos EUA, William Burns, que esteve em Brasília na última sexta-feira, o governo Obama busca convencer o governo brasileiro a mudar sua posição contrária à aprovação da quarta rodada de sanções contra o país islâmico. "Não poderia negar que o Irã estará entre as principais questões a serem discutidas com o Brasil", confirmou P.J. Crowley, porta-voz do Departamento de Estado. O Brasil ocupa vaga rotativa no órgão da ONU, com direito a voto.
A tarefa não deve ser fácil e pode resultar em momentos de tensão durante a visita. "A diplomacia brasileira resiste à adoção dessas sanções, pois está num momento de construção de uma parceria comercial com o Estado iraniano", pondera a professora de Direito Internacional da UniBrasil Larissa Ramina. "A posição brasileira é firme. Temos interesse em vender urânio e ter tecnologia para enriquecê-lo em escala industrial."
Se a missão de Hillary realmente falhar e o posicionamento brasileiro persistir, existe a hipótese de a visita de Obama ser adiada como forma de represália. "Depende do que o Brasil disser. Se for vamos trabalhar em energia nuclear com o Irã, acho que Obama não visitará o país. Mas se só disser que quer encorajar o Irã a evitar a busca por armas e que deseja continuar envolvido por razões econômicas, não seria suficiente para dissuadir Obama", disse à Gazeta do Povo o presidente do Interamerican Dialogue, Peter Hakim. "Eu ficaria surpreso se ele cancelasse a viagem para repreender o Brasil, mas não tenho certeza", diz Keysar.
Algodão
Com o tempo que sobrar depois dessa discussão mais delicada, Hillary deve abordar com o presidente Lula e o chanceler Celso Amorim a represália brasileira aos subsídios norte-americanos ao algodão (veja no quadro ao lado). "Quanto menos falarem do relacionamento entre os países e mais de coisas concretas na área econômica, melhor", considera Peter Hakim.
O professor de Economia e Negócios Internacionais da UniFAE Antoninho Caron concorda. "O que a gente precisa colocar em pauta é o protecionismo, na questão do suco, álcool, ferro e outros produtos agrícolas", afirma.
Ainda na área econômica, deve ser feito o lançamento formal de um acordo de cooperação econômica. Não significa que os países caminhem para um acordo de livre comércio, o que seria competência do Mercosul.
O que pode ser discutido é a facilitação burocrática, reduzindo barreiras não tarifárias e procurando um acordo de eliminação de bitributação.
O fato de haver uma visita ao Brasil marcada para maio do secretário de Defesa americano Robert Gates, segundo Hakim, significa que os EUA ainda acreditam que o Brasil pode comprar caças militares da Boeing enquanto a opção política do governo brasileiro pela francesa Dassault já ficou explícita. O espinhoso assunto também pode vir à tona durante a visita de Hillary.
Para encerrar, uma garantia de que haverá algo positivo nas conversas: os dois países devem firmar um memorando conjunto sobre a violência contra mulheres, tráfico de pessoas e crianças, exploração sexual e participação política feminina.
Desafiados, governadores da oposição refutam culpa pela inflação e antecipam debate de 2026
Trump muda jogo político da Europa e obriga países a elevarem gastos com defesa
Preço dos alimentos não cai com ameaças, mas com responsabilidade
A inflação do grotesco: três porquinhos são deixados para morrer em exposição
Deixe sua opinião