O ano de 2016 reacendeu o desejo humano de conquistar Marte, com interesses públicos e privados competindo para dar o primeiro passo no Planeta Vermelho, possivelmente com uma escala na Lua. A maioria das nações que desenvolvem programas espaciais têm a mesma visão de Marte como a próxima fronteira, e muitas compartilham seu dinheiro e suas experiências para tornar esse sonho uma realidade.
Mas a eleição de Donald Trump – com impactos inevitáveis na política científica, nos orçamentos e nas relações diplomáticas – tem gerado dúvidas sobre o futuro da exploração espacial. O setor espacial aguarda com tensão que o presidente eleito dos Estados Unidos revele seus planos para a Nasa e para saber se o futuro será de cooperação ou concorrência.
Em outubro, durante um comício na Flórida, Trump disse que queria “libertar a Nasa de servir principalmente como uma agência de logística para as atividades de órbita baixa”. Os programas de órbita baixa incluem a Estação Espacial Internacional (ISS), o Telescópio Espacial Hubble e os satélites de observação da Terra. Entre eles estão os orbitadores da Nasa para monitoramento do clima, um programa que Trump também ameaçou suprimir.
Em Stanford, Trump disse às multidões que a missão central da Nasa será a exploração espacial, e prometeu: “Os Estados Unidos vão liderar o caminho para as estrelas”, o que poderia ser uma boa notícia para as ambições marcianas.
Obama já estabeleceu o objetivo de uma missão de ida e volta para o Planeta Vermelho até a década de 2030, com a “ambição final” de criar um assentamento lá.
Esse é também o objetivo do empresário e fundador da SpaceX, Elon Musk, que em setembro apresentou um plano ambicioso para estabelecer uma colônia em Marte, no qual enviaria cem 100 humanos de cada vez, por 100.000 dólares a passagem, a partir de 2024.
A empresa holandesa Mars One, da mesma forma, planeja enviar exploradores a Marte em 2031, um programa que seria financiado em grande parte por um reality show televisivo sobre a missão.
Ir para Marte “depende de quão rápido o esforço internacional para voltar à Lua pode ser organizado, de quanto dinheiro os Estados Unidos gastam com isso e do orçamento da Nasa”, disse John Logsdon, do Instituto de Política Espacial da Universidade George Washington.“E todos esses fatores são desconhecidos neste momento”, acrescentou.
A rota para Marte pode passar pela Lua, de acordo com analistas. A Agência Espacial Europeia (ESA) planeja a criação de uma aldeia lunar - uma escala para as naves espaciais com destinos mais distantes -, que poderia suceder a ISS.
“É possível que os Estados Unidos respondam esta proposta da ESA estabelecendo uma espécie de acordo com vários países para voltar à superfície da Lua”, afirma Logsdon.
Nova corrida espacial?
Após anos de cooperação multinacional, “a tendência atual é que as nações que operam no espaço fortaleçam e aumentem a autonomia nacional para ter sucesso no espaço”, diz um documento do Instituto Europeu de Políticas Espaciais. Os países querem seus próprios foguetes e lançadores no caso de que “desenvolvimentos geopolíticos desfavoráveis” coloquem seus programas espaciais em risco.
Desde que a corrida espacial entre os Estados Unidos e a União Soviética lançou o primeiro ser humano na órbita terrestre em 1961 e colocou o primeiro homem na Lua em 1969, a tendência foi em direção ao trabalho em equipe galáctico.
Um dos pontos altos dessa cooperação foi a ISS, continuamente habitada desde 2000, um projeto conjunto dos Estados Unidos, Europa, Rússia, Japão e Canadá.
Como hoje apenas a Rússia é capaz de transportar os astronautas para o laboratório científico em órbita, os países trabalham juntos no envio de carga. Há também experiências conjuntas no espaço profundo, como o rover ExoMars europeu-russo planejado para 2020.
“Eram os Estados Unidos e a União Soviética que tinham a capacidade de entrar no espaço. Agora, a Índia e o Japão também podem fazer isso”, disse à AFP Sa’id Mosteshar, diretora do Instituto de Política e Direito Espacial de Londres.
Apenas a China não participa de nenhum grande projeto internacional, principalmente devido à sua relação diplomática complicada com os Estados Unidos. Pequim está, no entanto, gastando “uma quantidade significativa” no espaço, disse Mosteshar. O país asiático tem um laboratório espacial em órbita, planos para uma estação espacial tripulada até 2022, e poderia se tornar o segundo país a colocar um ser humano na Lua. O último foi um americano, em 1972.
Mas observadores dizem que hoje não há uma corrida como tal, visto que é improvável que países ou até corporações privadas cheguem a ter dinheiro suficiente para empreender sozinhos.
A maioria acha que a cooperação espacial continuará - como aconteceu até mesmo no auge da guerra fria entre os Estados Unidos e a União Soviética - apesar do que os políticos fazem na Terra. O futuro governo de Trump é visto como mais próximo à Rússia de Vladimir Putin do que o de Obama, mas já incorreu na ira diplomática da China.
“Os projetos espaciais internacionais colaborativos são, por natureza, compromissos de longo prazo”, disse Mosteshar. “Se no meio de um projeto surgem diferenças políticas entre os países envolvidos, é difícil parar a experiência em curso ou outra atividade”.
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