Centenas de milhares de manifestantes voltaram às ruas de Hong Kong na quarta-feira (12) para manifestar sua oposição a um projeto de lei que eles temem que causaria grande impacto na autonomia já frágil da cidade.
Os organizadores dos protestos em Hong Kong pretendem realizar outra manifestação de grandes proporções no domingo, 16, anunciaram seus líderes na quinta-feira, um dia depois dos violentos confrontos na cidade entre a polícia e os ativistas que criticam um projeto de lei de extradição à China.
A Frente de Direitos Humanos Civis também convocou uma greve em toda a cidade para segunda-feira, 17, com o objetivo de manter a pressão sobre o governo de Hong Kong. Os manifestantes desejam que o projeto de lei seja abandonado. "Convocamos os cidadãos a se unir às greves trabalhista, escolar e do comércio", afirmou Jimmy Sham, coordenador do grupo.
O governo de Pequim voltou a denunciar como "distúrbios" as manifestações da véspera em Hong Kong contra o projeto de lei que abre caminho para extradições à China.
"Não foi uma manifestação pacífica, e sim distúrbios organizados", disse o porta-voz da diplomacia chinesa, Geng Shuang. Pequim "condena firmemente" a violência e "apoia a reação" das autoridades de Hong Kong, completou ele.
Por que estão protestando?
Os protestos, que segundo muitas estimativas são maiores do que os protestos em massa que exigiam reformas democráticas em 2014, se concentram em emendas à lei de extradição de Hong Kong que permitiria que fugitivos fossem enviados à China, potencialmente expondo dissidentes e críticos de Pequim a uma imensa onda de processos politicamente motivados.
As manifestações têm focado sobre a crescente influência da China em Hong Kong, que tem tido um grau de independência sob a política de "um país, dois sistemas" acordada pela China como parte da entrega de Hong Kong pelo Reino Unido em 1997.
Muitos em Hong Kong dizem que aprovar uma lei de extradição ampliada seria a sentença de morte dessa política.
O que é a lei de extradição?
Hong Kong tem acordos com cerca de 20 países para entregar pessoas procuradas por certos crimes. Mudanças propostas na lei expandiriam essa lista para incluir a China e Taiwan, sujeitando qualquer pessoa que viva em Hong Kong ao sistema legal chinês, que é conhecido por usar detenções arbitrárias e tortura.
Por que o governo de Hong Kong está propondo essa mudança?
Autoridades em Hong Kong disseram que a emenda é necessária para evitar que Hong Kong se torne um refúgio para criminosos. O caso que incentivou essa discussão foi o de um residente de Hong Kong de 20 anos que admitiu ter matado sua namorada quando os dois estavam em Taiwan. Embora ele esteja sob custódia, ele não enfrentou julgamento porque Hong Kong não tem jurisdição sobre crimes cometidos em Taiwan, e as leis atuais impedem que ele seja enviado para lá.
Por que tantos em Hong Kong se opõem a essa mudança?
Manifestantes e ativistas disseram que expandir a lista de países para os quais Hong Kong pode enviar supostos criminosos e incluir a China dará a Pequim outra ferramenta para restringir as liberdades e moldar a cidade de acordo com as normas políticas e sociais restritivas da China.
O executivo-chefe de Hong Kong, que é apoiado pela China, diz que a lei só afetará pessoas acusadas de crimes graves e não será aplicada a violações relacionadas à liberdade de reunião ou liberdade de expressão. Mas os oponentes do projeto estão céticos, dizendo que isso abre a porta para a China reprimir a sociedade mais aberta de Hong Kong.
"Não acreditamos na proteção dos direitos humanos e no Estado de direito na China continental", disse Jackey Wong, manifestante de 25 anos, ao InkStoneNews.com, um site de notícias local. "Se o projeto for aprovado, não poderemos dizer o que queremos dizer. Seríamos como carne em uma tábua de cortar, à mercê do governo".
Como a China se afirmou em Hong Kong?
Desde que assumiu a ex-colônia britânica em 1997, a China foi acusada de corroer as liberdades maiores que as pessoas em Hong Kong desfrutam. Nos últimos anos, a China aumentou seu domínio sobre Hong Kong – principalmente pela pré-seleção de candidatos a cargos políticos na cidade, e atacando editoras que criticam o Partido Comunista Chinês por casos de sequestro e desestímulo à liberdade de expressão.
Ativistas em Hong Kong temem que a aprovação da lei de extradição enfraqueça ainda mais a tradição aberta da cidade, mande embora a vibrante comunidade internacional de negócios, e coloque em risco qualquer pessoa que a China considere um incômodo.
"O fato de que nós, entre outros artistas e ativistas, ainda podemos viver sem medo em Hong Kong é o que nos diferencia de qualquer cidade na China continental", escreveu Denise Ho, uma proeminente artista em Hong Kong, no The Washington Post. "Mas a nova lei de extradição instalaria o sistema de perseguição e repressão do continente em Hong Kong e ele simboliza o isolamento total do mundo".
Autonomia
Hong Kong é um território semiautônomo que por 150 anos permaneceu como colônia britânica. Em 1997, a cidade foi devolvida à República Popular da China após uma série de negociações diplomáticas.
Até 2047, Hong Kong deveria ser capaz de se governar sob uma política conhecida como "um país, dois sistemas", ou seja, Hong Kong permaneceria sob soberania chinesa, mas com independência para manter os próprios sistemas político e jurídico.
O Partido Comunista da China prometeu aos britânicos manter um "alto grau de autonomia" antes da devolução, embora questões de política externa e defesa ficassem sob responsabilidade de Pequim.
Nos últimos anos, no entanto, o governo chinês vem limitando a independência de Hong Kong. Moradores do território afirmam que as liberdades estão cada vez mais cerceadas, com a China proibindo reformas democráticas e interferindo nas eleições locais.
Os protestos pró-democracia em Hong Kong são vistos como o maior desafio à autoridade de Pequim desde as manifestações de 1989 na Praça da Paz Celestial (Tiananmen).
Líderes empresariais, grupos de comunicação, organizações de imprensa, grupos de advogados e organizações de promoção dos direitos humanos temem que a intensificação da repressão política possa minar a confiança dos investidores em Hong Kong e corroer as vantagens competitivas da cidade.
Com informações de Estadão Conteúdo e The Washington Post.