As casas em Stanley, a capital do arquipélago das Malvinas, estão decoradas com as bandeiras das Falklands e do Reino Unido; os carros, pintados com a Union Jack (bandeira britânica). A cidade nunca esteve tão movimentada.
Os dois únicos hotéis Malvina House e Waterfront, onde funcionam também os dois únicos restaurantes andam com a lotação máxima. Com gente que busca um lugar na aguardada indústria petrolífera que surge nas ilhas, com veteranos de Reino Unido e Argentina que lutaram a guerra pelo domínio do arquipélago há 30 anos e com jornalistas, muitos jornalistas.
Culpa não apenas da efeméride, alegam todos, mas sim do fortalecimento do discurso do governo argentino de Cristina Kirchner sobre a necessidade de se voltar a discutir a soberania sobre as Malvinas.
Os 3 mil moradores do arquipélago 2,7 mil vivem em Stanley e os outros 300 vivem no campo estão tensos e não escondem de que lado estão. "Somos britânicos, estamos aqui há pelo menos nove gerações. A população descende dos colonos que vieram do Reino Unido, há somente duas famílias de argentinos vivendo aqui. Se os argentinos nos invadirem novamente, mandaremos eles para o espaço", diz Patrick Watts, único locutor de rádio no momento da invasão argentina a Stanley, em 2 de abril de 1982. "De repente [há 20 anos], passei a ter um chefe militar."
Watts traduzia para o inglês o que o militar argentino mandava. Eram mensagens do tipo: "A partir de agora há toque de recolher, haverá apagões para pouparmos energia, dirigiremos do lado direito da estrada e o peso substituirá a libra como moeda oficial".
"Foi muito difícil, acho que os argentinos achavam que seriam bem recebidos porque, na verdade, éramos dominados pelo Reino Unido contra a nossa vontade e ansiávamos em fazer parte da Argentina. Mas, quando chegaram aqui, perceberam que tudo era diferente. Ninguém falava espanhol e nem sabia direito onde ficava Buenos Aires; campos minados foram deixados para trás", conta Veronica Fowler, professora, referindo-se às cerca de 20 mil minas terrestres que ainda existem ao redor da capital, e que somente agora, 30 anos depois, começam a ser desativadas.
As palavras e o sentimento anti-Argentina de Patrick e Veronica ecoam entre os kelpers, apelido dos nativos das ilhas, cuja população é uma mistura de imigrantes britânicos, estabelecidos antes ou principalmente após 1982 a economia cresceu muito depois da guerra e os descendentes dos colonos que chegaram no século 19 ou até antes.
Nos últimos anos, as ilhas receberam cerca de 300 chilenos para trabalhar principalmente nos setores de construção e serviços. As duas famílias argentinas costumam ser reclusas e não gostam de receber a imprensa.
"Mas escreve aí: somos um povo simpático e hospitaleiro, não temos nada contra os argentinos, o que tememos é o governo de Cristina Kirchner", diz Lyn Buckland, kelper que, assim como todos, tem passaporte britânico.
Basta alguns minutos no Victory Bar para constatar o descontentamento. O pub é um dos quatro existentes em Stanley, e sair para beber é praticamente o único tipo de entretenimento noturno.
As temperaturas nas Malvinas chegam facilmente a zero grau, mesmo no verão, e os ventos são fortes. Os pubs, bem ao estilo inglês, funcionam até as 23h (respeitando as leis antigas britânicas), servem cerveja quente em pints, além dos fish and chips (peixe com batatas fritas).
No Victory fazem sucesso canecas de insulto aos argentinos que os moradores não deixam de considerar invasores. No banheiro, um vaso sanitário aparece com a imagem de Leopoldo Galtieri, o presidente da junta militar que governava o país na época da guerra.
Ryan, que jogava sinuca no bar, diz que até gostaria de ver seu país tornando-se completamente independente do Reino Unido atualmente as Malvinas só dependem dos britânicos nos setores de política externa e defesa. Mount Pleasant custa cerca de R$ 226 milhões por ano, ou 0,5% do orçamento militar do Reino Unido.
"Mas como ser totalmente independente se os argentinos vivem ameaçando a gente? Não temos como nos defender sozinhos", alega Ryan.