Portugal resistiu, mas foi o terceiro país da zona do euro a recorrer à ajuda do Fundo Monetário Internacional (FMI) e da União Europeia, seguindo os passos de Grécia e Irlanda. A situação vinha se agravando desde o estouro da crise americana, em 2008, e os acontecimentos do último mês levaram os portugueses ao auge da crise, não só econômica, mas também política. O Congresso reprovou o PEC 4 (Plano de Estabilidade e Crescimento), que apresentava medidas de austeridade, e levou o primeiro ministro, José Sócrates, a renunciar ao cargo no dia 23 de março. O premier deveria permanecer no poder até 2013. Após aceitar a renúncia, o presidente Cavaco Silva anunciou a antecipação das eleições legislativas para 5 de junho.
Com o pedido de demissão já formalizado, no início de abril, Sócrates pediu ajuda ao FMI. No último dia 20, dirigentes Fundo e da União Europeia (UE) chegaram a Portugal para avaliar a situação do país e negociar como será feito o empréstimo que deve chegar a 80 bilhões de euros.
Nas ruas de Portugal, o clima é de apreensão. A brasileira Sandra Regina Santin, 43 anos, observa que as pessoas estão com a autoestima baixa, assustadas com a escalada dos juros e bastante endividadas. Muitos têm de devolver carros e até casas, especialmente os funcionários públicos, que sofreram cortes de até 10% nos salários.
Há 18 anos no país, Sandra era recém-formada em Psicologia quando resolveu se aventurar e ir com o namorado para a Europa. Nos dois primeiros anos, trabalhou como garçonete e conseguia ganhar o suficiente para tirar férias de três meses no Brasil. "O dinheiro dava e sobrava e eu ainda levava uma mala cheia de presentes", lembra. Agora, mesmo exercendo sua profissão, ela está há dois anos sem vir ao Brasil porque acha que as passagens estão muito caras.
Para muitos, ir do Brasil a Portugal com o objetivo de fazer pé-de-meia já não compensa mais. "Quem vem sozinho precisa de apoio de alguém do Brasil para se manter. O que estão pagando mal dá para sobreviver", conta o estudante brasileiro Antônio Freitas Netto. Ele mora com os pais em Lisboa há quatro anos, faz mestrado em Ciência Política e trabalha na área administrativa de um condomínio. "Eu achava que uma grande vantagem em Portugal era o custo de vida, mas agora tudo subiu", diz Freitas Netto.
Impressionado com a situação do país, o estudante relata que nunca imaginou vivenciar uma realidade como a que Portugal tem hoje: "Era coisa que a gente só via na tevê, em países com crise muito forte, e agora está acontecendo aqui".
A dívida pública portuguesa deve chegar a 86% do PIB de 2010. No dia 12 abril, o ministro da Finanças, Teixeira dos Santos, declarou em entrevista à Reuters que o país só teria dinheiro para pagar as dívidas até junho. O ministro salientou a necessidade de que a ajuda financeira seja definida até maio, e que as medidas de austeridade exigidas pelo FMI podem ser ainda mais rígidas que as do PEC 4.
Os jovens que vivem em Portugal tentam buscar alternativas para o futuro. "Planejava construir uma carreira e fazer minha vida aqui, mas agora já estou pensando em terminar o mestrado e voltar para o Brasil", reflete o brasileiro. Portugueses também pensam em vir para cá, como um amigo do estudante, que se formou em engenharia, leu sobre a necessidade de mão de obra especializada no Brasil e está animado com a oportunidade no país.
Ao contrário de Feitas Neto, Sandra não quer voltar. Ela acha que, como trabalha na iniciativa privada, não está sendo tão atingida. Seu marido aquele namorado de 18 anos atrás é músico e sente um pouco mais os efeitos da crise. "Ele toca em restaurantes e hotéis, mas as pessoas não estão mais viajando, nem saindo para comer fora", explica a psicóloga. A economia da região do Algarve, onde eles moram, também foi bastante atingida já que é voltada ao turismo. Eles não conseguiriam vender o apartamento, por exemplo, pois o mercado imobiliário está congelado, o crédito é restrito e os bancos fazem exigência difíceis de serem cumpridas. Ainda assim, o casal acha que a educação no país é melhor para o filho, de oito anos.