Protestos de ativistas anti-imigração se espalharam pela Inglaterra na última semana, em cidades como Londres, Manchester, Sunderland, Liverpool, Nottingham e Hull. Um dos gritos de guerra dos manifestantes foi “parem os barcos”, uma alusão a um dos modos de chegada de imigrantes ilegais ao país.
O estopim foi um ataque realizado na última segunda-feira (29), em Southport, na costa noroeste da Inglaterra, contra crianças de sete a 11 anos que faziam uma aula de dança com músicas de Taylor Swift.
Axel Rudakubana, de 17 anos, esfaqueou e matou as meninas Bebe King, de seis anos, Elise Stancombe, sete anos, e Alice Dasilva Aguiar, nove anos e filha de imigrantes do arquipélago de Madeira, de Portugal. Ele feriu outras dez pessoas, oito das quais também eram crianças (cinco ficaram em estado grave).
O primeiro-ministro do Reino Unido, Keir Starmer, expressou choque e agradeceu aos serviços de emergência por sua celeridade. Ele visitou o local para deixar flores. O rei Charles III e a rainha consorte Camilla expressaram condolências às famílias. A cantora Taylor Swift também expressou pêsames e seus fãs arrecadaram centenas de milhares de libras esterlinas para as vítimas.
O nome do assassino foi divulgado pelo juiz distrital James Hatton, que condenou o rapaz por assassinato no dia 1º de agosto, que decidiu tornar público o nome de Rudakubana, ainda que fosse menor de idade ao cometer o crime, por se tratar de uma “situação excepcional” em que “o interesse público é favorecido pela transparência completa sobre os trâmites” do caso.
É uma referência à situação criada quando ativistas anti-imigração espalharam informação falsa sobre o crime: um nome falso e alegações sobre a nacionalidade, a religião e o status migratório do autor do ataque circularam.
No dia seguinte ao crime, um grupo se juntou ao redor da mesquita mais próxima e atiraram contra ela tijolos, garrafas e pedras. Os vândalos também atearam fogo em um carro da polícia e deixaram 39 policiais feridos, 27 hospitalizados e oito com ferimentos mais sérios.
A polícia disse que muitos dos responsáveis pelo tumulto faziam parte da Liga de Defesa Inglesa (EDL, na sigla em inglês), um grupo político anti-islã fundado em 2009 que falhou em se tornar um partido político, está na maior parte desativado, mas ainda tem apoiadores.
Starmer conclamou a polícia a “agir contra os extremistas nas nossas ruas que estão atacando policiais, perturbando o comércio local e tentando semear o ódio pela intimidação das comunidades”. Yvette Cooper, a ministra do Interior, prometeu mais fundos para defender mesquitas.
Ao todo, mais de 100 pessoas foram presas. Os protestos se espalharam até para a Irlanda do Norte (parte do Reino Unido). Na capital Belfast, carros e prédios foram incendiados na noite de sábado (3) depois que um grupo de manifestantes cercou um centro comunitário muçulmano.
Nascido no Reino Unido
Rudakubana nasceu no Reino Unido, filho de pais imigrantes de Ruanda. Ele chegou ao centro comunitário onde acontecia a aula às 11:45, horário local, entrou pela porta da frente e iniciou o ataque. Os adultos locais tentaram proteger as crianças, um sofreu ferimentos graves, outro escondeu um grupo de crianças no banheiro. Um terceiro, funcionário de um escritório no mesmo prédio, foi ao local ao ouvir os gritos, tentou desarmar o adolescente e foi atingido por uma facada na perna.
A polícia foi avisada por telefone dois minutos depois da chegada de Rudakubana, ambulâncias foram chamadas às 11:48. O primeiro policial a chegar esperou reforços, pois só tinha um cacetete para se proteger. Quando chegou um outro policial, os dois usaram taser (eletrochoque) contra o suspeito e o prenderam.
O assassino, que completou 18 anos dias depois do crime, foi criado em um lar cristão. Vizinhos disseram à imprensa britânica que os Rudakubana são muito envolvidos na igreja. Axel tem um diagnóstico de transtorno do espectro autista, segundo as autoridades. Sua motivação permanece não divulgada, embora a polícia local tenha negado que haja relação com atividades terroristas.
Quando criança, Rudakubana teve aspirações de se tornar ator e apareceu aos 11 anos em um vídeo promocional da BBC para crianças carentes, com tema da série de ficção científica Doctor Who. O vídeo foi deletado e a empresa responsável por agenciá-lo na época apagou todo o conteúdo sobre sua carreira nas redes sociais.
Comentaristas da política divergem sobre quem é responsável
“O que está acontecendo no Reino Unido esta semana é assustador. Também foi completamente previsível”, disse o escritor conservador e comentarista político britânico Douglas Murray, no X. “De fato, alguns de nós avisamos a respeito desse cenário por anos. Tudo foi evitável. Mas todos os avisos foram ignorados”.
Para Murray, o crime ainda tem alguma relação com imigração. “Migração ilegal em massa transforma sociedades com altos níveis de confiança em sociedades com baixos níveis. Transforma sociedades coerentes em incoerentes. Não se pode só lidar com a retaliação contra isso. É preciso lidar com a causa. Se nossos líderes não fizerem isso, vai ficar infinitamente pior”, afirmou. Ele acusou os dois principais partidos do Reino Unido, o Conservador e o Trabalhista, de criarem governos que aceleraram a migração em massa, o que “se tornaria um barril de pólvora” que “qualquer coisa poderia explodir”.
Já Alan Rusbridger, colunista do jornal The Independent, culpou Elon Musk em sua coluna. “Se alguém dissesse a Musk que ele tem alguma responsabilidade por esses tumultos, ele riria”, afirmou o jornalista, que já foi editor-chefe do jornal The Guardian.
“Mas é verdade”, afirmou Rusbridger. “Quando Musk decidiu gastar US$ 44 bilhões para comprar o que se chamava Twitter, tomou em última análise a responsabilidade pela expressão de 350 milhões de usuários da plataforma. (...) Agora chamada X, a rede social é onde um vírus fatal se espalhou após os esfaqueamentos horrendos de crianças em Southport. Musk potencializou isso”.
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