"Vivos os levaram, vivos os queremos". Há dois meses esse é o grito de guerra de estudantes, pais e professores indignados no México, cobrando das autoridades uma solução para o caso dos 43 estudantes que desapareceram em Iguala, no fim de setembro, sequestrados por narcotraficantes com ajuda da polícia. Na segunda-feira à noite era possível ouvir a frase nas ruas de Guadalajara a segunda cidade mais importante do país numa marcha pacífica que saiu do Parque de exposições, que abriga atualmente a Feira Internacional do Livro de Guadalajara (FIL).
Com camisetas com o número 43 nas costas, os mais de dois mil participantes contaram com adesões de peso: os próprios intelectuais que estão na cidade por causa da feira, como os escritores mexicanos Juan Villoro, Paco Ignacio Taibo e o chileno José Donoso, vencedor do prêmio Ibero-americano de 2012.
A Feira do Livro de Guadalajara, uma das mais importantes da língua espanhola, virou mais um palco de indignação sobre o ocorrido no dia 26 de setembro, quando os jovens foram sequestrados e possivelmente massacrados a mando do prefeito de Iguala, José Luis Abarca. Na abertura do evento, no sábado, o escritor italiano Claudio Magris, o chanceler da Argentina, Héctor Timerman, e acadêmicos pediram ao governo mexicano para esclarecer o desaparecimento e possível assassinato dos estudantes.
O evento coincide com o aniversário de dois anos do governo do presidente Enrique Peña Nieto, que enfrenta sua maior crise e queda de popularidade. Para marcar a data, houve protestos violentos ao grito de "Fora Peña!". Na capital do país, na segunda-feira, encapuzados destruíram lojas e agências bancárias. Ontem, em Chilpancingo, manifestantes marcharam na estrada que liga a cidade a Acapulco. Por conta da Feira de Guadalajara, intelectuais mexicanos deram depoimentos sobre a violência ao jornal espanhol "El País".
Elena Poniatowska
Prêmio Cervantes de 2013. "O país foi tomado por grupos mafiosos; os governos municipais estão corrompidos até a morte. Desde o governo do presidente Miguel Alemán (1946-1952) este país foi o de Ali Baba. O México é agora um Estado que deslancha para outra era de crises. Esperamos que este país não se frustre e que a educação nos salve. De momento, a imagem de gente nobre nas ruas é estimulante."
Paco Ignacio Taibo
Escritor e historiador. "Estamos construindo a grande dissidência que é preciso para tirar o governo Peña Nieto, que foi uma praga para este país."
Enrique Krauze
Historiador, intelectual e ensaísta. "O que aconteceu com os estudantes reaviva um trauma profundo para os mexicanos: o crime de Tlatelolco, quando o governo massacrou centenas de estudantes."
Sara Sefchovich
Historiadora e escritora. "Ayotzinapa é uma realidade e um símbolo. Como realidade não sabemos nem o que aconteceu, como, quem e por quê. Como símbolo evidenciou o que sabemos de corrupção e impunidade. E também o que não queríamos ver: que o Estado não vai resolver isso. Que a esperança está nas famílias."
Fernando del Paso
Escritor, diplomata e acadêmico. "Tudo indica que vivemos num país onde se pode fazer desaparecer as pessoas impunemente, e isso é muito grave. Não acredito que a situação se resolva facilmente. O México precisa de uma educação nova, diferente e se possível menos nacionalista."
Brian Nissen
Pintor e escultor. "Este é um assunto que já dura mais de 50 anos. A corrupção, como se sabe, vai de cima até embaixo."
Guadalupe Nettel
Escritora, Prêmio Herralde de Novela. "A execução e a forma como fizeram revela não somente a grave situação pela qual atravessa o país, mas o sadismo que o define."