Governo impõe toque de recolher em duas cidades de Mianmar
Monges ignoram ameaça e continuam protestos pelas ruas do país.Leia a matéria completa
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Constrangidos com os vídeos e as fotografias divulgados clandestinamente exibindo o povo se rebelando contra o governo, os generais no comando de Mianmar simplesmente bloquearam a internet.
Até a última sexta-feira, 28 de setembro, televisões e jornais internacionais se viram inundados por cenas de milhares de monges com túnicas vermelhas nas ruas em meio ao caos e a violência, enquanto o governo militar continha a maior insurgência popular ocorrida em 20 anos. Eles querem liberdades democráticas, em um país controlados por governos militares há 45 anos.
No entanto, as imagens, as mensagens de texto e as publicações pararam de circular, bloqueadas pelos generais que tardiamente se apoderaram da internet impondo uma sanção severa ao meio de comunicação.
"Eles acabaram percebendo que esse era seu principal inimigo e o derrotaram", declarou Aung Zaw, editor da revista "Irrawaddy", publicada no exílio, cujo site serviu como fonte principal de notícias nas últimas semanas. O site sofreu ataque de um vírus, o que leva à possível conclusão de que o governo militar mantenha hackers qualificados em seus postos.
A eficiência dessa mais recente sanção faz questionar se o significativo papel da internet no enfraquecimento da repressão seria de fato capaz de confrontar um governo obstinado e inclemente, ou se um país minúsculo e economicamente isolado como Mianmar seria uma exceção.
"A sanção da mídia e do fluxo de informações acontece paralelamente à sanção física", disse David Mathieson, especialista em estudos sobre Mianmar na organização de proteção dos direitos humanos Human Rights Watch. "Parece que fizeram isso com bastante eficácia. Desde sexta-feira não chegam novas imagens". Existem apenas dois provedores em Mianmar, e não foi difícil fechá-los, disse ele.
Além da internet, a Junta Militar interrompeu a maior parte do acesso telefônico ao mundo exterior. Soldados nas ruas confiscaram câmeras fotográficas e celulares com câmeras de vídeo.
Como no mundo real
Ao manter o isolamento do país auto-imposto nos últimos cinqüenta anos, o governo militar pareceu preparado para se desvincular do mundo virtual da mesma forma como o fez em relação ao mundo real.
Ao mesmo tempo, o governo ditatorial recorreu à mais antiga tática para silenciar a oposição: o medo. Jornalistas locais e outras pessoas flagradas transmitindo informações ou usando câmeras estão sendo ameaçadas e presas, segundo grupos de birmaneses exilados.
Em um último telefonema apressado, como conta o editor Aung Zaw, uma de suas fontes de muitos anos se despediu. "Fizemos o suficiente", disse-lhe a fonte. "Não podemos mais circular. Acabou tudo, não há mais nada que possamos fazer por vocês. Fomos capturados. Somos caçados por soldados, fomos pegos".
Ainda há imagens a caminho, contou Aung Zaw, e assim que ele as receber e seu site voltar ao ar, o mundo as verá.
No entanto, Mathieson contou que os dissidentes do país estão lançando mão de antigas estratégias. Eles exportam imagens clandestinamente pelos celulares primeiro desmembrando os arquivos e, em seguida, reunindo-os novamente.
Difícil de esconder
Não se sabe ao certo, porém, por quanto tempo os generais ainda conseguirão adiar o futuro. A tecnologia está fazendo com que seja mais difícil ditadores e governos militares esconderem segredos por trás da cortina que fecham em volta de seus países.
"Sempre há maneiras de as pessoas enviarem informações para fora do país e as autoridades se vêem na obrigação de combatê-las", explicou Mitchell Stephens, professor de jornalismo da New York University e autor de "A History of News" ("A História das Notícias", em português).
"É cada vez menor o número de acontecimentos não registrados em vídeo: o mundo está cheio de Zapruders", disse ele, referindo-se a Abraham Zapruder, a única pessoa a registrar imagens do assassinato do presidente John F. Kennedy em 1963.
Antes do blecaute de informações da última sexta-feira (28), os jornalistas de Mianmar que trabalhavam na clandestinidade estavam protagonizando uma demonstração primorosa do poder da internet no combate a um governo repressor.
Um exército de guerrilha formado por repórteres civis divulgava fotos clandestinamente ainda no transcorrer dos acontecimentos, e o mundo estava assistindo.
"Para nós que estudamos a história da tecnologia da comunicação, o que acontece agora tem importância equivalente à do telégrafo, que foi o primeiro meio a separar comunicações de transporte", declarou Frank A. Moretti, diretor executivo do Center for New Media Teaching and Learning da Columbia University.
Desde o início dos protestos, em meados de agosto, as pessoas estão enviando imagens e textos via mensagens SMS e e-mails, além de blogs diários, de acordo com alguns grupos de exilados que receberam essas mensagens. Publicaram notícias no Facebook, a rede social da web. Enviaram mensagens minúsculas em cartões eletrônicos. Atualizaram a enciclopédia on-line Wikipedia.
Usaram também as versões de internet de "pombos-correio", os repórteres usados antigamente para transportar imagens e notícias, encaminhando seu material para embaixadas ou organizações não-governamentais que tivessem acesso a conexões por satélite.
Em questão de horas, as imagens e reportagens eram transmitidas de volta para Mianmar por estações de rádio e emissoras de televisão estrangeiras, informando e conectando um público que só tinha acesso à propaganda do governo.
Como a tecnologia faz com que qualquer pessoa seja um repórter em potencial, o desafio em locais perigosos como Mianmar é a exatidão da notícia, segundo Vincent Brossel, diretor do departamento especializado em Ásia da organização Repórteres sem Fronteiras.
"Os boatos são os piores inimigos do jornalismo independente", explicou ele. "Nós já estamos escutando um monte de histórias estranhas. Por isso, se não há fluxo de informações e ocorre uma disseminação de boatos em um país que se vale de propaganda, acabou. Você está destruindo a história e minando-a dia após dia".
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