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A chocante tentativa de assassinato contra o escritor Salman Rushdie na sexta-feira passada (12) em Nova York não foi somente um ataque criminoso ao autor, mas também um provável ato de terrorismo inspirado no Irã (e possivelmente direcionado pelo Irã).
Rushdie, depois de publicar o controverso romance “Os Versos Satânicos” em 1988, foi marcado para morrer com uma fatwa (ou édito islâmico) emitida em fevereiro de 1989 pelo Aiatolá Ruhollah Khomeini, supremo líder da revolução islâmica iraniana.
Khomeini convocou os muçulmanos a matar o escritor anglo-americano por blasfêmia, junto com quaisquer outras pessoas envolvidas na publicação do livro.
Organizações iranianas, inclusive muitas afiliadas ao governo, ofereceram uma recompensa de US$2,8 milhões pela cabeça de Rushdie e o forçaram a se esconder sob a proteção do governo britânico. Um homem libanês que forjou um plano para matar Rushdie com um livro-bomba explodiu a si mesmo acidentalmente em um hotel de Londres em agosto de 1989, antes que ele pudesse aplicar a fatwa contra o autor.
Livrarias que vendiam “Os Versos Satânicos” foram alvo de bombas incendiárias nos Estados Unidos, Reino Unido, Noruega e Austrália. Um tradutor japonês do livro foi assassinado em 1991; um tradutor italiano e um editor norueguês tiveram sorte de sobreviver a tentativas de assassinato.
Apesar de o governo do Irã ter dito em 1998 que a fatwa não estava mais em vigência, o Aiatolá Ali Khamenei, sucessor de Khomeini na qualidade de supremo líder do Irã, repetidamente insistiu que a fatwa não havia sido revogada.
Em 2019, o Twitter suspendeu a conta de Khamenei depois que ele tuitou que a fatwa contra Rushdie era “irrevogável”.
Irã culpa a vítima
O regime islâmico do Irã negou responsabilidade pelo esfaqueamento de Rushdie, de 75 anos, em um palco quando ele começou a palestrar em Chautauqua, Nova York, e culpou a vítima por provocar o ataque.
O agente literário de Rushdie disse que o escritor sofreu danos a seu fígado, seus nervos de um braço foram cortados e ele provavelmente perderá um olho, conforme relatou a agência de notícias Associated Press. O escritor foi tirado do respirador no último sábado.
Um porta-voz do governo iraniano alegou que Rushdie insultou “a santidade do islã” e passou “dos limites de mais de um bilhão e meio de muçulmanos”.
A polícia está investigando se a tentativa de assassinato contra Rushdie foi ordenada pelo Irã ou inspirada no Irã.
O perpetrador, identificado pela polícia como Hadi Matar, de 24 anos, e reside em Fairview, Nova Jérsei, teria elogiado o Exército de Guardiães da Revolução Islâmica e grupos extremistas xiitas em suas contas nas redes sociais. Apesar de Hadi ter nascido e crescido nos Estados Unidos, seus pais emigraram para Yaroun, Líbano, uma vila predominantemente xiita que é um foco de apoio à revolução islâmica do Irã.
Há relatos não confirmados de que Hadi estava em “contato direto” online com membros do Exército de Guardiães da Revolução Islâmica, mas esses relatos não foram verificados publicamente pelas autoridades.
Uma das principais indicações das lealdades de Hadi é a carteira falsa de motorista que ele carregava com o nome Hassan Mughniyah, um pseudônimo que combina o primeiro nome do líder libanês do Hezbollah, Hassan Nasrallah, e o sobrenome do notório líder terrorista do Hezbollah Imad Mughniyah, que foi morto em uma operação secreta da CIA em 2008.
Mughniyah planejou vários ataques terroristas que mataram centenas de americanos, inclusive uma bomba em 1983 em um quartel de fuzileiros navais americanos no Aeroporto Internacional de Beirute que matou 241 americanos que participavam de operações de paz no Líbano.
Os terroristas do Hezbollah de Mughniyah executaram aquele ataque e muitos outros sob o direcionamento do Irã.
O Coronel Timothy Geraghty, comandante da unidade de fuzileiros que foi bombardeada, escreveu depois que a Agência de Segurança Nacional havia interceptado uma mensagem de agentes de inteligência iranianos ao embaixador do Irã em Damasco (um conhecido terrorista) com instruções que ele ordenasse o ataque contra os fuzileiros.
Os planos terroristas desbaratados do Irã
Embora o homem que atacou Rushdie possa ter se radicalizado na Internet com pouco contato público com oficiais do Irã, sua tentativa de assassinato vem na esteira de uma série de outros planos terroristas desbaratados iranianos dentro dos Estados Unidos.
Na semana passada o Departamento de Justiça revelou acusações contra um membro do Exército de Guardiães da Revolução Islâmica pela tentativa de conspirar pelo assassinato do ex-conselheiro de segurança nacional da Casa Branca John Bolton em seu lar em Maryland ou em seu escritório em Washington.
Autoridades americanas disseram que o plano desbaratado contra Bolton teria sido uma retaliação pela execução do General Qassem Soleimani, comandante da Força Quds — ramo de operações especiais de elite do Exército de Guardiães da Revolução Islâmica — pelas forças armadas americanas em janeiro de 2020 com um ataque via drone no Iraque.
Bolton não é o único ex-oficial americano que foi alvo de assassinato do Irã. O ex-secretário de defesa Mark Esper, o ex-secretário de Estado Mike Pompeo e ex-coordenador de políticas para o Irã do Departamento de Estado Brian Hook também receberam proteção extensa do Serviço Secreto por causa das ameaças iranianas.
O Departamento de Segurança Interna reforçou medidas de segurança em milhares de prédios federais depois do ataque de drone a Soleimani para se protegerem de uma possível retaliação do Irã ou do Hezbollah, seu principal assecla no terrorismo.
O Irã se tornou mais agressivo em sua busca por aterrorizar os dissidentes iranianos em solo americano. No começo deste mês, a polícia da cidade de Nova York prendeu um agente iraniano que ela diz que foi enviado para matar Masih Alinejad, uma dissidente política em exílio.
No ano passado, o Departamento de Justiça indiciou quatro agentes de inteligência iranianos e um co-conspirador residente da Califórnia por planejarem sequestrar Alinejad em Nova York e abduzi-la à força de volta para o Irã.
Parte de um padrão maior
Seria um erro ver o ataque a Rushdie como um evento isolado. É parte de uma campanha de Teerã para reprimir a liberdade de expressão e pensamento — não apenas no Irã, mas no resto do mundo — e parte do ataque mais amplo do Irã ao Ocidente e aos valores ocidentais.
O especialista em terrorismo Matthew Levitt, que documentou mais de 100 operações iranianas em solo estrangeiro para assassinar, sequestrar e espionar alvos em potencial, afirma: “O Irã percebe que os benefícios em potencial de tais operações são altos, enquanto os custos de serem pegos são baixos e tipicamente temporários”.
Já passou da hora de os Estados Unidos elevarem os custos de tais operações secretas letais do Irã com sanções econômicas, isolamento diplomático, banimento de viagens, operações secretas e represálias militares, quando necessário.
Mas o governo Biden, que quer conseguir um acordo nuclear defeituoso e arriscado com o Irã, não está propenso a fazer essas coisas.
No domingo (14), o secretário de Estado americano Antony Blinken publicou uma declaração que denunciava o “hediondo ataque” contra Rushdie.
“As instituições estatais do Irã incitaram a violência contra Rushdie por gerações, e a mídia estatal recentemente comemorou o atentado contra sua vida. Isso é grotesco”, disse Blinken.
Mas Blinken continua com seus esforços equivocados de ressuscitar o acordo nuclear de 2015 com o Irã, o mesmo governo “grotesco”.
Somado às tentativas de assassinato orquestradas pelo Irã contra oficiais americanos, o ataque a Rushdie inspirado no Irã é um alarme para que o governo Biden saia da complacência de suas políticas direcionadas ao Irã.
Infelizmente, é provável que o governo aperte o botão de soneca e volte a dormir.
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James Phillips é pesquisador sênior em assuntos do Oriente Médio no Centro Douglas e Sarah Allison de Política Externa na Heritage Foundation. É autor de extensa literatura sobre assuntos do Oriente Médio e terrorismo internacional desde 1978. Leia aqui suas pesquisas.
©2022 The Daily Signal. Publicado com permissão. Original em inglês.