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Vitória democrata

Quem é Kamala Harris, vice-presidente eleita dos Estados Unidos

A vice-presidente eleita dos Estados Unidos, Kamala Harris, em evento de campanha em Detroit, Michigan, em 25 de outubro (Foto: JEFF KOWALSKY / AFP)

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Após a eleição da chapa democrata para a presidência dos EUA, Kamala Harris será a primeira mulher - e a primeira pessoa negra ou de origem asiática - a ter o título de vice-presidente do país norte-americano.

Harris fez sua primeira manifestação pelo Twitter depois do anúncio da projeção da vitória de Joe Biden nas eleições, dizendo que essa eleição "é sobre muito mais do que Joe Biden e eu. É sobre a alma da América e nossa boa vontade em lutar por ela". Ela também publicou um vídeo em que aparece telefonando para Biden e comemorando a vitória: "Conseguimos, Joe! Você será o próximo presidente dos Estados Unidos!".

Harris, considerada pela campanha de Trump como pertencente à "esquerda radical" do Partido Democrata, apoia algumas das principais propostas progressistas partido, como o Medicare para todos e a política climática chamada de Green New Deal.

Com a eleição, o nome de Harris se torna automaticamente o mais cotado para a nomeação do Partido Democrata para as eleições presidenciais de 2024 - já que Biden, aos 77 anos, não deve buscar um segundo mandato.

Desde que Biden, 77, anunciou em agosto que teria uma mulher como companheira de chapa, a senadora passou a ser vista como uma escolha natural para o Partido Democrata, principalmente por causa da importância que as questões raciais ganharam nas eleições deste ano após o assassinato do afro-americano George Floyd por um policial branco e os protestos que ocorreram na sequência.

Desta maneira, Kamala Harris se tornou a primeira mulher negra a compor uma chapa presidencial e a terceira mulher a concorrer como vice nos Estados Unidos. Ela adicionou à cédula presidencial a diversidade que faltava na pessoa de Joe Biden, homem branco, idoso e moderado – para os atuais padrões do partido – com décadas de experiência na política americana.

Filha de pai jamaicano e mãe indiana, Kamala foi a aposta do partido para atrair o voto de negros, latinos, mulheres e jovens. Em 2016, a ausência desse eleitorado, que tradicionalmente é cativo dos democratas, foi crucial na derrota de Hillary Clinton para Donald Trump.

A escolha também aponta para o caminho mais progressista que o partido democrata pretende seguir ao sair vencedor das eleições de 2020, com Harris já sendo apontada pelos mais ansiosos como uma potencial sucessora de Biden, devido à idade avançada dele.

Quem é Kamala Harris

Hoje com 56 anos, Kamala é senadora dos Estados Unidos pela Califórnia. Sua carreira política começou nos anos 2000, quando foi eleita a primeira promotora distrital negra de São Francisco. Mas foi quando assumiu a promotoria do estado, em 2010, que seu trabalho ganhou destaque e a tornou alvo de críticas tanto da esquerda quanto da direita.

A campanha democrata exaltava que, durante aquele período, Kamala “lutou pelas famílias e ganhou um acordo de US$ 20 bilhões para proprietários de casas na Califórnia contra grandes bancos que estavam executando injustamente as hipotecas”, resultado da crise econômica de 2008.

Contudo sua atuação em outros casos tiveram repercussão negativa. Pela esquerda, foi acusada de defender interesses policiais. A primeira campanha dela para a promotoria de São Francisco foi apoiada pelo sindicato da polícia local e, quando foi promotora da Califórnia, evitou intervir em casos envolvendo assassinatos pela polícia e foi criticada por não brigar por reformas policiais – uma pauta que agora vem sendo levantada por diversos promotores progressistas.

Em um debate democrata no início do ano, a deputada Tulsi Gabbard afirmou que Harris "bloqueou evidências que teriam libertado um homem inocente do corredor da morte até que ela fosse forçada a fazê-lo".

Porém, a boa relação com os policiais não foi duradoura. Acabou quando ela se recusou a pedir pena de morte para o membro de uma gangue que assassinou um policial, ainda em seu primeiro mandato como procuradora em São Francisco. Ela defendia que a sentença era desproporcionalmente aplicada a negros.

Pela direita, Kamala foi acusada de abusar de seus poderes de investigação e promotoria para perseguir grupos políticos de tendência conservadora, como a Fundação Americanos pela Prosperidade, que critica as propostas democratas para as mudanças climáticas, e a Organização Nacional para o Casamento, que é contra o casamento homossexual e a adoção de crianças por casais gays. Segundo o National Review, ela fez parte de uma aliança de procuradores-gerais democratas que tentaram tornar crime o “negacionismo climático” .

Em 2016 foi eleita para o Senado americano, onde defendeu, entre outras coisas, o aumento do salário mínimo, os direitos de imigrantes e refugiados e o aborto. Também foi bastante crítica ao governo de Donald Trump e co-patrocinou uma legislação que tiraria a maconha da lista de substâncias controladas e eliminar o registro de crimes relacionados à droga.

Os posicionamentos atuais

A posição da vice de Joe Biden está longe de ser centrista, embora Harris pareça mais aberta ao diálogo do que figuras como o senador Bernie Sanders e a deputada Alexandria Ocasio-Cortez. Desde que entrou na corrida presidencial democrata, Kamala Harris passou a demonstrar uma tendência mais progressista, inclusive em questões relacionadas à polícia e à justiça.

Na onda dos protestos antirracismo e antipolicial, a senadora disse que “é um pensamento do status quo acreditar que colocar mais policiais nas ruas cria mais segurança. Isto é errado. É simplesmente errado”. Kamala está entre os democratas que assinaram um projeto de lei que prevê a proibição de técnicas de estrangulamentos pela polícia, bem como discriminação racial em abordagens policiais, entre outros pontos. “Como promotora de carreira e ex-procuradora-geral da Califórnia, sei que a verdadeira segurança pública exige a confiança da comunidade e a responsabilização da polícia”, declarou ao apoiar o projeto conhecido como Justice in Policing Act.

Na saúde, suas declarações sobre o controverso Medicare For All deixaram muita gente confusa. Quando era candidata à presidência, disse apoiar o projeto proposto pelo senador Bernie Sanders, de substituir completamente a cobertura privada por um sistema governamental gratuito - o que inevitavelmente levaria a um aumento de impostos. Ela chegou a afirmar em entrevista que o seguro privado de saúde nos EUA deveria ser totalmente eliminado. Porém, mudou de tática no meio do caminho e lançou a sua própria versão do programa de saúde de tendência socialista, que manteria as seguradoras privadas operando no país e cuja a implantação seria feita em longo prazo.

A sua defesa do aborto também a coloca no campo progressista do Partido Democrata. Como senadora, recebeu a avaliação máxima de uma entidade pró-escolha que dá notas aos legisladores com base nos posicionamentos a respeito do assunto. Ela votou contra um projeto de lei que limitaria o aborto às primeiras 20 semanas de gestação e apoia um projeto que torna ilegais limitações praticadas por alguns estados em relação a serviços de aborto.

“A saúde reprodutiva está sob ataque total na América hoje. Existem estados que aprovaram leis que virtualmente impedem que as mulheres tenham acesso à saúde reprodutiva. Não é exagero dizer que as mulheres vão morrer, mulheres pobres, mulheres de cor, porque essas legislaturas republicanas que estão fora de contato com a América estão dizendo às mulheres o que fazer com nossos corpos. As pessoas precisam manter as mãos longe do corpo das mulheres e deixar que elas tomem as decisões sobre suas próprias vidas”, disse Kamala. A senadora também apoia o financiamento público para serviços de aborto e opõe-se à notificação dos pais em caso de abortos em menores de idade.

Seguindo a toada esquerdista, Kamala Harris é a favor do Green New Deal, um projeto apresentado pela deputada Alexandria Ocasio-Cortez para renovar toda a estrutura do país para priorizar a eficiência energética, modernizando a rede elétrica, eliminando as emissões de gases do efeito estufa em apenas 10 anos e convertendo todo o país a fontes de energia renovável. Tanto essa proposta quanto o Medicare For All não foram endossados por Joe Biden.

A vice no debate

No debate entre os candidatos a vice-presidência dos EUA realizado em outubro, Harris e Mike Pence, vice de Donald Trump, se enfrentaram em questões como a pandemia de coronavírus, meio ambiente, China e a Suprema Corte.

Na ocasião, Harris criticou o modo como a atual gestão tem tratado o cenário de epidemia e acusou Trump de ter minimizado os riscos no início do ano. Em relação a questões ambientais, a então candidata negou a acusação de Pence de que a chapa democrata pretende acabar com o fraturamento hidráulico (fracking), uma técnica de extração de combustíveis do solo, no país. Ela também defendeu o Acordo de Paris e o Green New Deal, dizendo que Trump minimiza a ciência.

Sobre a relação com a China, Kamala foi taxativa: "Você perdeu a guerra comercial [com a China]. E o que acabou acontecendo foi que a América perdeu 300 mil empregos", disse a Pence, que respondeu dizendo que Biden é "líder de torcida da China comunista há décadas".

Relação com Biden

Algumas reservas eram feitas sobre a indicação de Kamala Harris como vice da chapa democrata por causa de seu relacionamento conturbado com Biden nas primárias do partido. Durante os debates, ela foi uma dos que mais criticaram o ex-vice-presidente sobre o seu posicionamento contrário à política de transporte entre diferentes distritos escolares para reduzir a segregação racial nas escolas americanas, na década de 1970 - uma política da qual ela mesma se beneficiou, segundo revelou em um dos debates.

Mas depois que desistiu da sua campanha, Kamala Harris passou a apoiar a candidatura Biden, quando ele ainda era ameaçado pelo socialista Bernie Sanders na corrida democrata. “Farei tudo que estiver em minhas mãos para ajudá-lo a se tornar o próximo presidente dos Estados Unidos", escreveu em um tuíte em 9 de março.

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