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Manifestação batizada de “Estamos juntos”, a favor da anexação da Crimeia, na Praça Vermelha, no centro de Moscou | Maxim Shemetov/Reuters
Manifestação batizada de “Estamos juntos”, a favor da anexação da Crimeia, na Praça Vermelha, no centro de Moscou| Foto: Maxim Shemetov/Reuters

Opinião

Surpreendente é a falta de habilidade dos EUA e da Europa na situação

Vivian Oswald, jornalista e autora do livro Com vista para o Kremlin, para a Agência O Globo

O impasse a que o mundo assiste na Crimeia — hoje, na prática, já anexada à Rússia — era previsível como foram poucas crises contemporâneas. O que, sim, surpreende, é a falta de habilidade com que a Europa ocidental e os EUA lidaram com a situação. Esses países são, a rigor, co-responsáveis pelo alto grau de tensão que agora leva tantos analistas a falarem em uma reedição da Guerra Fria.

A União Europeia nunca hesitou em tomar partido nas disputas internas — e se apressou, junto com os EUA, em reconhecer um novo "governo", apesar das credenciais democráticas mais que duvidosas de seus integrantes. O presidente deposto, Viktor Yanukovich, embora sabidamente corrupto, fora eleito democraticamente — à maneira que faz gosto ao Ocidente. Ou nem tanto, a depender do caso.

A hipocrisia das reprimendas vindas de Washington e Londres é particularmente desconcertante. A Rússia, é verdade, age movida pela beligerância que lhe impregna o DNA. Mas nenhum governo pode ser acusado de intervencionismo sem estrilar quando quem acusa tem na biografia a invasão unilateral do Iraque, as aventuras no Afeganistão, entre outras passagens pouco nobres e uma retórica pontilhada por dois pesos e duas medidas.

A diplomacia ocidental se mostra bem mais cuidadosa ao lidar com a China, por exemplo.

O fato é que, entre russos desejosos de restabelecer glórias passadas e ocidentais ávidos para impedi-los, restam desamparados 45 milhões de ucranianos, em seu jovem Estado nacional que, ao que tudo indica, será fracionado — com sorte, sem derramamento de sangue. Entre promessas desastradas e remotas de adesão à União Europeia e à Otan, ou sanções risíveis contra Moscou, o que o Ocidente impotente pode mesmo oferecer de concreto aos ucranianos hoje é um empréstimo — nas condições sempre "camaradas" impostas pelo FMI. O cabo de guerra, como toda corda, vai arrebentar no ponto mais fraco.

G7

Os Estados Unidos convocaram ontem seus parceiros no Grupo dos Sete (G7) para se reunir na próxima semana em Haia e analisar a crise na Ucrânia. Eles advertiram Moscou contra novas incursões no território ucraniano após a oficialização da anexação da Crimeia à Rússia. O G7 é formado por Alemanha, Canadá, EUA, França, Itália, Japão e Reino Unido. A reunião do bloco "estará focada na situação na Ucrânia e em novas medidas que o G7 pode tomar para responder à evolução dos eventos e apoiar a Ucrânia".

No dia em que o presidente da Rússia, Vladimir Putin, deu aval à anexação da Crimeia, a Ucrânia acusou tropas russas de atacarem uma de suas bases militares na região e matarem um soldado.

Após a ação, o premiê ucraniano, Arseni Yatseniuk, disse que começou a fase militar do conflito pela região de maioria russa, que domingo votou pela junção a Moscou.

O Ministério da Defesa da Ucrânia diz que homens com roupas militares russas, mascarados e armados, invadiram a base, em Simferopol, capital da Crimeia. Outros dois soldados teriam ficado feridos.

A Crimeia, porém, afirma que a base não foi invadida, mas alvejada por atiradores que estavam em um prédio em frente ao local. Os homens teriam baleado um militar ucraniano e um miliciano pró-Rússia. A polícia informou ter prendido um dos supostos atiradores.

Para o primeiro-ministro da Ucrânia, o ataque foi um "crime de guerra" cometido pela Rússia. O presidente ucraniano, Oleksander Turchinov, autorizou os soldados a usarem suas armas em legítima defesa.

O governo russo não se manifestou sobre o caso.

Além da ligação histórica com a Rússia, que integrou até 1954, a Crimeia abriga a principal base militar russa no mar Negro. Tem também relevância econômica, ao sediar campos de gás.

Justo

O ataque aconteceu horas depois que Putin ratificou a anexação da Crimeia. Em discurso no Parlamento, ele disse que corrigiu uma injustiça histórica.

"Nos corações e nas mentes das pessoas, a Crimeia sempre foi uma parte inseparável da Rússia", disse.

A sessão foi interrompida várias vezes por aplausos e gritos. Deputados russos e da Crimeia choraram com as palavras de Putin, que, em meio ao ambiente nacionalista, fez duras críticas ao Ocidente.

Para ele, EUA e União Europeia "passaram dos limites" ao apoiar o novo governo da Ucrânia. "Atuaram de forma grosseira, irresponsável e pouco profissional."

Embaixador da Ucrânia afirma que referendo foi uma "farsa política"

Da Redação

O embaixador da Ucrânia no Brasil, Rostyslav Tronenko, divulgou ontem um comentário acerca do referendo realizado na Crimeia, que terminou com 97,6% dos eleitores a favor do retorno da península para a Rússia, o que implica no rompimento com a Ucrânia.

"[O referendo] foi uma farsa política orquestrada pela Federação da Rússia", diz Tronenko. Para o diplomata, a consulta popular na Crimeia viola leis internacionais "fundamentais".

"A maioria dos observadores que participaram desta farsa representam as forças marginais de esquerda e de direita", diz o embaixador. "A Ucrânia está profundamente e dolorosamente ciente do fato de que a agressão da Rússia trouxe o mundo à beira de um conflito fatal."

Tronenko afirma haver indícios de que a Rússia está a ponto de fazer uma intervenção militar "de grande porte" no leste e no sul do território ucraniano. "Moscou está usando sua vantagem incomparável em força militar e seu estatuto nuclear", argumenta.

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