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Argentina

Kirchnerismo fica nervoso com possível segundo turno presidencial

A presidente Cristina Kirchner | Ueslei Marcelino/Reuters
A presidente Cristina Kirchner (Foto: Ueslei Marcelino/Reuters)

A Argentina nunca teve segundo turno numa eleição presidencial e não estava nos planos do kirchnerismo disputar o primeiro da História. No entanto, de acordo com a maioria das pesquisas que circularam no país nos últimos dias, esse parece ser o cenário mais provável. Depois de ter sido o candidato mais votado nas Primárias Abertas Simultâneas e Obrigatórias (Paso) de 9 de agosto, o candidato do kirchnerismo, Daniel Scioli, não decolou como esperava a Casa Rosada, e a possibilidade de eleger-se presidente no primeiro turno, no dia 25 de outubro, está cada vez mais distante.

As versões sobre a ira da presidente Cristina Kirchner são intensas e, segundo analistas ouvidos pelo GLOBO, ela não faz o menor esforço por esconder a irritação e refere-se a Scioli como “o inútil” em conversas com aliados e colaboradores.

O resultado final das primárias ficou abaixo das expectativas kirchneristas: Scioli obteve 38,67%, e os três candidatos da aliança opositora Mudemos somaram 30,12%, considerado o piso eleitoral do prefeito portenho, Mauricio Macri, que ficou em primeiro e tornou-se o mais forte da oposição.

Para vencer no primeiro turno, como imaginava Cristina quando o escolheu, Scioli - governador da província de Buenos Aires - precisa alcançar mais de 45% dos votos ou uma vantagem de pelo menos dez pontos percentuais sobre o segundo colocado. Atualmente, Macri tem 32% das intenções de voto, contra 40% de Scioli.

“Scioli é um bom candidato, mas enfrenta muitas limitações, sobretudo a falta de autonomia”, disse o analista Carlos Fara, da Fara e Associados.

Para ele, o governador kirchnerista ainda tem chances de obter um triunfo no primeiro turno, mas “não será nada fácil”. Nos próximos dias, Scioli buscará respaldo externo, entre outros, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que chegará a Buenos Aires em meados da semana para inaugurar uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA, um modelo que Scioli importou do Brasil) ao lado de Cristina e seu candidato. Apesar dos escândalos de corrupção no PT, assessores de Scioli confiam que “na Argentina Lula ainda tem boa imagem e sua presença vai ajudar na campanha”.

“O candidato kirchnerista está muito condicionado pelo kirchnerismo, e essa dependência política está prejudicando sua candidatura”, comentou Fara, que lembrou, ainda, os “golpes” sofridos pelo candidato kirchnerista nas últimas semanas.

Para começar, uma inundação trágica em sua própria província, que coincidiu com uma viagem do governador à Itália por questões médicas. O timing de Scioli não poderia ter sido mais desastroso e o obrigou a retornar às pressas à Argentina, em meio a um clima de profunda irritação do kirchnerismo e, principalmente, de Cristina. Pouco depois, Scioli presenciou as eleições para governador na província de Tucumán, que terminaram com repressão e denúncias de fraude contra o candidato kirchnerista. Esses e outros tropeços atrapalharam a campanha do governador, que acaba de trocar, para surpresa de muitos, seu slogan: “Scioli para a Vitória” (em referência ao partido Frente para a Vitória, fundado pelo ex-presidente Néstor Kirchner) foi substituído pelo simples “Scioli Presidente”.

“O kirchnerismo está nervoso, e Cristina, muito incomodada com a situação: primeiro, de deixar o poder; segundo, com o mau desempenho de seu candidato”, apontou o analista Sergio Bereztein.

Para Berenztein, “Scioli pensou que esta eleição seria quase um passeio, mas ela se tornou algo muito complicado”.

“Vejo o governador tentando se descolar de Cristina, mostrar certa personalidade própria, que é mais moderada. O governo te dá uma base, mas, também, um teto muito claro”, assegurou o analista.

O segundo turno presidencial é um terreno desconhecido para os políticos argentinos.

“Existem riscos reais de derrota”, disse Marcelo Canton, editor de política do “Clarín”. “O projeto de poder de Cristina está em xeque. A presidente apostou em Scioli porque pensou que ele captaria votos de fora do kirchnerismo, mas isso não está muito claro hoje. Esta campanha não tem um candidato-estrela, e o resultado ainda é incerto”.

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