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NOVO PAÍS

Liberlândia oferece Estado mínimo e lógica de startup

Bandeira da Liberlândia, uma nação livre de impostos. | Liberland
Bandeira da Liberlândia, uma nação livre de impostos. (Foto: Liberland)

Uma faixa de terra equivalente a um quarto da Ilha do Mel, à margem do Rio Danúbio, é o cenário de uma experiência real de estado mínimo guiado pelo libertarismo e administrado com a lógica de uma startup. Fundada há quatro meses em uma das regiões historicamente mais bélicas da Europa, a República da Liberlândia promete ser uma nação livre de impostos e com respeito absoluto à liberdade individual, em que a mão do governo se limitará a prover lei e ordem. A proposta fez quase 400 mil formulários com pedidos de cidadania encherem a caixa de mensagens do presidente Vít Jedlicka e tornou a terra de ninguém um dos países mais comentados dos últimas dias.

Jedlicka é tcheco, tem 32 anos e formação em economia e ciências políticas. Trabalhou em seu país como analista financeiro, diretor de empresa de internet e vendedor de software. Filiado ao Partido Conservador dos Cidadãos Livres, concorreu – e perdeu – a uma cadeira no Parlamento Europeu, em 2014, frustração que o fez ir em busca de alternativas para implementar seu projeto.

O ponto de virada acabou sendo a saga do fazendeiro norte-americano Jeremiah Heaton. Para realizar o desejo de sua filha de 7 anos de ser uma princesa, Heaton saiu em busca de uma terra sem dono. Encontrou entre o Egito e o Sudão, onde fundou o Sudão do Norte, coroou-se rei e fez da sua filha a princesa.

O fazendeiro se valeu do princípio da terra nullis, dispositivo do direito romano que torna sem dono qualquer território que não tenha sido reivindicado por um estado autônomo. A interpretação jurídica que ajudou na expansão do Império Romano e na realização de um sonho de criança se tornava o atalho para o nascimento de um novo país.

Uma busca na Wikipedia apresentou ao tcheco como terra de ninguém uma faixa de 7 km², entre a Sérvia e a Croácia, resultado de um lapso territorial no fatiamento da Iugoslávia após a guerra civil dos anos 90. Sérvios e croatas ignoraram o território, como também ignoraram a consulta de Jedlicka sobre a sua propriedade.

Em 13 de abril deste ano, Jedlicka, sua namorada e seu melhor amigo fincaram a bandeira amarela e preta da Liberlândia no território. A votação do primeiro presidente foi prosaica. Jedlicka foi eleito com dois votos - ele próprio se absteve. E partiu para um curioso processo de colonização.

A experiência com internet fez ele perceber na rede todas as ferramentas para a expansão. Site oficial, página no Facebook, perfil no Twitter e entrevista a veículos como Vice Media, New York Times e BBC tornaram o novo país conhecido. A consistência de algumas propostas logo descolou o seu projeto da excentricidade do fazendeiro Heaton.

Jedlicka sonha em construir uma versão europeia e ultra-libertária de Cingapura ou Hong Kong. Uma cidade-estado em que o pagamento de impostos é facultativo, o direito à propriedade é sagrado e a ação do governo é limitada a zelar pela Constituição e oferecer segurança. Serviços de saneamento básico, fornecimento de energia, educação e todos os demais serão bancados por financiamentos coletivos na internet ou por investidores.

O presidente garante já ter arrecadado US$ 45 mil em crowdfunding. A segurança da nova fronteira é bancada pela Associação dos Colonizadores da Liberlândia, entidade privada que adquiriu o direito de explorar 20 mil m² de área do novo país. Por enquanto o exército informal tem se ocupado mais de fugir da polícia sérvia, que decidiu prender qualquer um que pisar no pedaço de terra que, agora, a Sérvia diz ser seu. O próprio Jedlicka precisou pagar multa para ser liberado em meados de maio. Uma das poucas operações em moeda real a ser realizada na Liberlândia. A ideia é fazer circular na cidade-estado bitcoins ou qualquer outra moeda virtual utilizada pelos 40 mil cidadãos que Jedlicka pretende aceitar a partir do fim deste ano.

A triagem segue critérios rigorosos – embora de difícil controle. Pessoas com antecedentes criminais estão fora. Simpatizantes do nazismo, comunismo e extremistas, também. Jedlicka e sua primeira-dama têm rodado o mundo para convencer os demais países a reconhecer a Liberlândia. Embaixadores espalhados pelo planeta tratam de refinar o recrutamento de cidadãos e explicar o projeto. Também filtram sugestões para a Constituição publicadas na página do país no Facebook.

Tudo para distanciar a Liberlândia da excentricidade do Sudão do Norte ou do futurismo exagerado do Seasteading Institute. Criado em 2009, o projeto pretende, até 2020, inaugurar a primeira ilha flutuante em águas internacionais. À semelhança da Liberlândia, a ilha artificial pretende ser um estado mínimo para 600 habitantes com serviços fundamentais providos por empresas privadas. A iniciativa marítima, lançada há seis anos, é conduzida por Patri Friedman, neto de Milton Friedman, Nobel de Economia e um dos pensadores fundamentais do movimento libertário americano.

Morto em 2002, Friedman é autor da frase “qualquer solução governamental é geralmente tão ruim quanto o problema e na maioria das vezes torna o problema pior”. Ensinamento aprendido pelo pai da possível mais nova nação do mundo. “Nosso objetivo é construir um país em que pessoas honestas possam prosperar sem serem oprimidas por governos que atrapalham suas vidas com restrições desnecessárias e impostos”, informa a apresentação no site da Liberlândia.

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