Especialista aponta que decisão de Putin de não renovar acordo para exportação de grãos ucranianos pelo Mar Negro visa mostrar força após motim do Grupo Wagner| Foto: EFE/EPA/ALEXANDER KAZAKOV/SPUTNIK/KREMLIN
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Com a saída da Rússia do acordo de grãos do Mar Negro, não renovado por Moscou nesta segunda-feira (17) e que durante um ano havia permitido a exportação de alimentos da Ucrânia a partir dos portos do país invadido mesmo com a guerra em andamento, o mercado mundial prevê alta dos preços e entidades da área de direitos humanos temem um aumento da fome em vários países.

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Diante da notícia, os preços do trigo, milho e da soja já subiram nesta segunda-feira. O acordo havia sido estabelecido por Rússia e Ucrânia há um ano, com mediação da ONU e da Turquia, e havia sido prorrogado duas vezes, em março e maio. Enquanto esteve vigente, permitiu a exportação de mais de 32 milhões de toneladas de alimentos da Ucrânia para 45 países em três continentes.

A Rússia decidiu não renovar o compromisso porque uma série de reivindicações suas não foi atendida, como a reconexão do seu banco agrícola, o Rosselkhozbank, ao sistema bancário internacional SWIFT, o levantamento das sanções sobre peças sobressalentes para máquinas agrícolas, o desbloqueio de logística e seguros de transporte e o descongelamento de ativos.

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Ainda que Moscou não tenha ligado diretamente a não renovação do acordo ao ataque à ponte da Crimeia, apenas algumas horas separaram os dois fatos.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, declarou nesta segunda-feira que a decisão da Rússia “será um golpe para os necessitados em todas as partes” do mundo.

“Em última análise, participar desses acordos é uma escolha, mas as pessoas que passam dificuldades em todas as partes e os países em desenvolvimento não têm escolha. Centenas de milhões de pessoas enfrentam a fome e os consumidores enfrentam uma crise global de custo de vida. Eles pagarão o preço”, lamentou.

A embaixadora dos Estados Unidos na ONU, Linda Thomas-Greenfield, disse que a retirada russa demonstra “o que acontece quando um país decide tomar como refém toda a humanidade”. “Enquanto a Rússia se dedica a jogos políticos, as pessoas de verdade sofrem”, criticou.

Em entrevista à CNBC, o analista Peter Ceretti, da consultoria Eurasia Group, disse que os embarques russos de grãos continuarão, e o fim do acordo não interromperá totalmente as exportações ucranianas via Mar Negro ou pela Europa.

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“No futuro, no entanto, o fim do acordo de grãos aumentará outras pressões de alta sobre os preços dos alimentos, como a seca na Europa e o início do El Niño. Os mercados mais afetados pelo fim do acordo serão os países do norte da África e do Levante, que importam grandes volumes de grãos da região do Mar Negro”, afirmou o especialista.

Na semana passada, o diretor regional de emergência para a África Oriental no Comitê Internacional de Resgate (IRC, na sigla em inglês), Shashwat Saraf, havia alertado para os riscos que a não renovação do acordo do Mar Negro representaria para a região, cuja produção agrícola foi seriamente afetada por secas e inundações.

“Com aproximadamente 80% dos grãos da África Oriental sendo importados da Rússia e da Ucrânia, mais de 50 milhões de pessoas na região correm o risco de passar fome e os preços dos alimentos dispararam quase 40% este ano”, afirmou, em comunicado.

Ainda que o presidente da Turquia, Recep Erdogan, ainda acredite na possibilidade de fazer o amigo Vladimir Putin retornar ao acordo, Timothy Ash, estrategista soberano sênior da BlueBay Asset Management em Londres e especialista em Rússia e Ucrânia, afirmou em entrevista ao The New York Times que a decisão de não renovar o compromisso – que “vai prejudicar países específicos, dependentes dessas exportações” – já é um reflexo do fracassado motim do Grupo Wagner em junho e do subsequente desejo do presidente russo de mostrar força perante o mundo.

“[Essa atitude] mostra o quão fraco Putin está depois da tentativa de golpe do Wagner: ele está desesperado para obter qualquer influência que puder”, argumentou. (Com Agência EFE)

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Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]