Greves e manifestações, escassez de combustível, tensão nos portos e centrais nucleares: os opositores à reforma trabalhista na França acentuavam suas ações nesta quinta-feira (26) para tentar fazer dobrar o governo socialista de François Hollande.
Em Paris, a polícia entrou em confronto com encapuzados durante uma grande manifestação de protesto contra a reforma trabalhista.
Cerca de 100 manifestantes que lideravam o protesto se separaram da manifestação e bloquearam uma rua transversal, derrubando contêineres e lançando garrafas contra a polícia, que respondeu com gás lacrimogêneo.
Neste clima, os trabalhadores das usinas nucleares na França se juntaram nesta quinta à onda de greves.
O primeiro-ministro Manuel Valls, sob pressão, admitiu nesta quinta-feira a possibilidade de “mudanças” ou “melhorias” no projeto de lei, e anunciou que receberia no sábado representantes “do setor petrolífero”. No entanto, o chefe de governo voltou a descartar a retirada do texto controverso.
Ele afirmou ser “inaceitável bloquear um país” e “prejudicar assim os interesses econômicos da França”, em declarações ante os deputados.
Na quarta-feira, Valls afirmou que a CGT, que lidera os protestos, “não dita a lei no país”, e nesta quinta voltou a criticar a “irresponsabilidade” da união sindical.
A paralisia crescente do país ocorre a duas semanas para a abertura do Eurocopa, em 10 de junho.
Os sindicatos convocaram um novo dia de protestos, o oitavo desde o início do movimento há três meses, que em várias ocasiões degeneraram em violentos confrontos com as forças policiais.
O nono, que será uma manifestação única em Paris, está programado para 14 de junho, quatro dias depois do início do torneio.
O secretário-geral da CGT, Philippe Martinez, convocou, por sua vez, “uma generalização da greve”.
Segundo o governo, a lei vai dar mais flexibilidade às empresas para combater o desemprego. Já os seus detratores consideram que irá aumentar a insegurança no trabalho e criticam nomeadamente o artigo 2, que dá primazia aos acordos particulares sobre as negociações de sindicatos profissionais, precarizando as condições de trabalho.
A contestação divide profundamente a esquerda francesa. O governo precisou recorrer a um instrumento constitucional que permite aprovar uma lei sem passar pelo voto no Parlamento, antes de ser tramitada no Senado.
Lembranças de 68
O bloqueio de refinarias e depósitos de petróleo forçou o governo a utilizar suas reservas estratégicas de combustível. O Estado havia utilizado na quarta-feira três dos 115 dias de reservas disponíveis.
“Vamos fazer tudo o necessário para garantir o abastecimento dos franceses e da economia”, disse o presidente François Hollande.
Cinco dos oito depósitos de combustível permaneciam bloqueados ou operando bem abaixo de sua capacidade, depois que as forças de segurança dispersaram pela manhã os ativistas que bloqueavam um deles.
Longas filas se formam há vários dias nos postos de gasolina, que em muitos casos racionam a distribuição. Os depósitos de quase um terço dos postos de combustível estão secos ou quase vazios, enquanto um popular aplicativo para telefones móveis indica onde ainda há combustível disponível.
Viviane, uma aposentada de 66 anos que esperava para abastecer seu carro em Allier (centro), compara a atual turbulência com as duas semanas de greves e manifestações maciças de 1968.
“Lembro-me de Maio de 68 e posso dizer que a escassez não é brincadeira e eu estou tomando precauções”, disse a motorista.
Centrais nucleares
A contestação subiu um novo degrau nesta quinta-feira, com o voto a favor da greve nas 19 usinas nucleares do país.
“Entre 50% e 80% dos funcionários estão em greve, de acordo com as centrais”, afirmou a porta-voz da CGT nesse setor, Marie-Claire Cailletaud, admitindo que, para manter o fluxo, a França “provavelmente será forçada a importar energia” de países vizinhos.
O organismo que administra a rede elétrica nacional, RTE, afirmou por sua vez que “a oferta de produção disponível (...) é suficiente para cobrir as necessidades de eletricidade do país”.
A oferta foi reduzida em 25% na central de energia elétrica de Nogent-sur-Seine, cerca de 100 km ao sudeste de Paris.
O movimento de protesto também tem provocado interrupções nos transportes.
A companhia ferroviária SNCF informou na quarta-feira sua quinta greve desde março.
A Direção-Geral da Aviação Civil (DGAC) recomendou que as empresas reduzam em 15% os seus voos de quinta-feira para o aeroporto Paris-Orly.
Em meio a essa onda de descontentamento, o governo recebeu a boa notícia de que o desemprego tinha caído pelo segundo mês consecutivo em abril.
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