Grafitti em prédio de Havana, capital de Cuba, 20 de julho. Manifestantes cubanos estão sendo julgados sem direito ao devido processo, denuncia ONG| Foto: EFE/ Ernesto Mastrascusa/ Gazeta do Povo
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Centenas de manifestantes detidos em Cuba serão julgados em "processos policiais" que violam o direito ao devido processo e à defesa efetiva, denunciou a Prisioners Defenders, ONG de direitos humanos que está acompanhando a situação na ilha.

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Os julgamentos, segundo a organização, são realizados sob a forma de "atestado direto", um processo sumário no qual se passa do inquérito policial à audiência de manifestação oral, sem que haja ação judicial ou processo, em questão de poucos dias, violando "flagrantemente a garantia do devido processo".

Desta maneira, fica mais difícil para que parentes dos manifestantes detidos consigam contratar um advogado. "Eles dificultam muito para a gente, porque não dá tempo sequer para que se busque a defesa e se prepare", disse à BBC Mundo o irmão de um dos manifestantes detidos.

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A lei cubana permite que o "atestado direto" seja usado para acusações cujas penas são inferiores a um ano, mesmo que a soma delas resulte em mais de um ano de prisão em caso de condenação.

Como é o processo

De acordo com a descrição da Prisioners Defenders, todo o processo, desde o início da investigação até a sentença, não leva mais do que cinco dias. A investigação e a acusação são feitas pela polícia e geralmente não há intervenção nem acusação formal da promotoria nestes processos – o Ministério Público pode escolher se participa ou não da audiência oral, diferentemente dos processos ordinários. Por esse motivo, a ONG considera que se trata de um "processo policial" e não judicial.

"É a polícia, e não a promotoria, que tem as rédeas do processo do começo ao fim", afirmam.

Também é a polícia que, em reunião com o juiz, marca a data para a audiência oral, oportunidade em que o acusado se apresenta diante de um juiz. Nem o promotor e nem a defesa participam desta reunião para definição da data, segundo a organização.

Assim, quando o réu é convocado para a audiência, ele ainda não sabe do que está sendo acusado e quais são as provas contra ele. Na prática, o advogado só terá acesso aos autos pouco antes da audiência.

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Existem casos em que o réu não tem tempo hábil para designar um defensor, já que se trata de um processo sumário em que os prazos entre o início da investigação e audiência variam entre 48 horas e 96 horas. Quando isso acontece, a audiência inicia sem que o réu saiba do que está sendo acusado formalmente.

De acordo com a ONG, se trata de "um processo relâmpago, sem comunicação às partes interessadas e com portas fechadas", afirma a Prisioners Defenders.

Nesta terça-feira, a diretora da Anistia Internacional para as Américas, Erika Guevara-Rosas, também criticou este tipo de julgamento sumário ao citar o caso do fotógrafo Anyelo Troya, preso enquanto fotografava os protestos de 11 de julho. A família dele informou que Troya foi julgado sem defesa e está incomunicável. "As garantias do devido processo e do julgamento justo foram violadas. Exigimos sua liberdade!", tuitou Guevara-Rosas.

Os "atestados diretos" são usados frequentemente para julgar dissidentes na ilha. No ano passado, por exemplo, o rapper Denis Solís, integrante do Movimento San Isidro, foi condenado por desacato a oito meses de prisão preventiva em um processo que durou, segundo a imprensa local, 72 horas, sem a presença de um advogado.

"Aparência judicial"

Flávio González, professor de Direito na Universidade de Buenos Aires (Argentina), diz que o procedimento adotado em Cuba é "totalmente abreviado" e que a parte acusada não tem muitas chances de defesa, já que não sabe quais são as acusações são feitas contra ela e não pode contar com um advogado. "Obviamente a pessoa não vai ter muita possibilidade de se defender", diz González.

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O especialista explica que uma das principais diferenças entre o rito de Cuba e o processo judicial em repúblicas democráticas é que a defesa é um princípio fundamental garantido pelas constituições destes países. Por exemplo, na Argentina e no Brasil, o cidadão tem o direito de se defender de maneira legítima em um processo judicial. "[Em Cuba], praticamente se está violando essa possibilidade. É como se o que se buscasse não é saber se houve algum delito, mas já condenar a pessoa", afirma González.

González avalia que o processo judicial cubano usado no caso dos manifestantes detidos "simula ser algo que não é". "Trata-se de dar uma aparência judicial a algo que, na verdade, é perseguição política", diz.

Desde o início dos protestos no domingo, 11 de julho, mais de 500 manifestantes foram detidos, incluindo menores de idade, segundo monitoramento de ativistas cubanos. Na falta de informações oficiais do regime, ativistas criaram um documento interativo para que as pessoas registrem as detenções de familiares e conhecidos; a lista já possui 537 nomes de localidades de toda a ilha.