Em 11 de julho, uma movimentação iniciada nas redes sociais gerou uma série de manifestações em diferentes cidades de Cuba, numa mobilização contra a ditadura comunista como há muitos anos não se via. A repressão do governo resultou em centenas de prisões e uma morte, além de processos subsequentes, mas, mesmo assim, movimentos que pedem liberdade econômica e política na ilha, de olho na atenção mundial atraída pelos atos, estão convocando a população cubana para novas ações em outubro e novembro.
Uma greve nacional foi marcada para 11 de outubro, data em que se completarão três meses das manifestações de julho e 153 anos e um dia do início das guerras de independência de Cuba. Para 20 de novembro, está sendo organizada uma manifestação, iniciativa liderada pelo dramaturgo Yunior García e endossada por participantes dos atos de 11 de julho, como o dissidente Manuel Cuesta, o ator Reinier Díaz, o cineasta Raúl Prado Rodríguez e a editora Miryorly García.
No último dia 15, os movimentos críticos à ditadura cubana tiveram outro momento de repercussão internacional, com a inclusão do artista e dissidente Luis Manuel Otero Alcántara, líder do Movimento San Isidro e um dos presos em 11 de julho, na lista de cem pessoas mais influentes de 2021 da revista americana Time.
Em entrevista ao podcast do The Daily Signal, o diretor-executivo do Centro por uma Cuba Livre, John Suarez, lembrou que, enquanto muitos líderes dos protestos do mês retrasado continuam na prisão, o regime comunista publicou em agosto o Decreto 35, “basicamente ameaçando as pessoas que gravam, que compartilham coisas nas redes sociais, com multas e prisão, e também encorajando seus quadros a agredi-las fisicamente”.
Mesmo assim, ele projetou que manifestações futuras devem ter mais apoio da população local, ao mesmo tempo em que cobrou mais pressão externa. “Estou otimista porque, pelo que vi em julho, existe um profundo desejo dos cubanos por mudanças. O que precisamos é de solidariedade internacional, não apenas dos Estados Unidos, mas do mundo democrático de forma mais ampla”, afirmou.
Suarez apontou que os movimentos eclodiram neste momento porque a pandemia de Covid-19 piorou as condições de vida já dramáticas em Cuba. “O regime tentou tirar vantagem da situação para apertar ainda mais seu controle totalitário sobre a população. Em 28 de dezembro, anunciaram a proibição de viagens partindo de países para onde os cubanos normalmente viajavam no dia 1º de janeiro, incluindo Estados Unidos, República Dominicana, Panamá, Haiti e outros lugares, onde muitos obtinham alimentos, remédios e outros suprimentos de que precisam, mas ao mesmo tempo mantiveram o turismo aberto com a Rússia e outros lugares que tiveram níveis muito mais altos de incidência de Covid-19, o que causou surtos inclusive em regiões turísticas de Cuba”, relatou.
Professor acredita em surgimento de novas lideranças em Cuba
Outros fatores de impacto na economia cubana foram a queda no número de turistas, devido à pandemia, a safra ruim de cana-de-açúcar e a suspensão de depósitos em espécie em dólares, em junho.
Clayton Vinícius Pegoraro de Araújo, professor de direito internacional da Universidade Presbiteriana Mackenzie, comentou, em entrevista à Gazeta do Povo, que “a longo prazo”, Cuba não vai resistir à atitude histórica de fechamento político – por uma mera questão de sobrevivência econômica.
“Para atrair investimentos, Cuba precisa mostrar que respeita as instituições de alguma forma, o que parece que, com o endurecimento das legislações contra manifestações internas, não vem ocorrendo. As manifestações mostram uma insatisfação popular e talvez uma tentativa de um momento de virada, mostrar que é agora, nesse momento pós-pandêmico, que o país precisa se abrir. A população sente que é o momento de lutar por uma abertura”, explicou. “Cuba teve uma evolução do ponto de vista constitucional da época do Fidel Castro para cá, mas ainda não é suficiente pelos padrões das democracias consolidadas.”
Segundo Araújo, os movimentos cubanos populares precisam ser observados com atenção pelo mundo, mas ao mesmo tempo, o professor não projetou mudanças imediatas. “Acredito numa abertura a longo prazo, para mais de cinco, dez anos. É necessário um arejamento da política cubana e a pressão popular pode indicar um caminho, podem surgir novos líderes políticos”, argumentou.