O bilionário Michael Bloomberg chegou atrasado na corrida presidencial, mas já está conquistando o segundo lugar na preferência dos eleitores democratas e assustando os seus concorrentes. O que o fez passar de 4 para 19% nas pesquisas de intenção de voto para as prévias do Partido Democrata em apenas dois meses? Dinheiro. Muito dinheiro que, aliás, sai de seu próprio bolso.
O empresário dono da Bloomberg LP construiu uma fortuna pessoal estimada em US$ 60 bilhões vendendo produtos e serviços de dados e tecnologia para o setor financeiro. Uma pequena parte destes recursos agora está sendo direcionada para sua empreitada presidencial.
Em três meses a campanha de Bloomberg gastou US$ 400 milhões, um valor sem precedentes para as prévias americanas – o presidente Donald Trump, por exemplo, investiu cerca de US$ 70 milhões de seu próprio dinheiro na campanha de 2016. Foram US$ 124 milhões só em propagandas eleitorais veiculadas nos 12 estados onde as primárias serão realizadas em 3 de março (Super Terça) - 10 vezes mais do que os US$ 10 milhões investidos por Bernie Sanders, candidato que aparece em primeiro nas pesquisas de intenção de voto para nomeação democrata. Se continuar nesse ritmo e conseguir a chance de disputar as eleições presidenciais contra o presidente Donald Trump, em novembro, Bloomberg pode, facilmente, elevar os gastos de campanha a dez dígitos.
Seus adversários democratas o acusam de “comprar seu caminho para a presidência dos Estados Unidos”. Bloomberg, por sua vez, defende que, por não precisar de financiamento externo, não vai dever favores para nenhum grupo com interesses específicos se chegar à Casa Branca.
Esse discurso tem agradado uma parte do eleitorado democrata. Alguns, preocupados com o poder de financiamento do Partido Republicano, acreditam que Bloomberg seria o único com condições financeiras de bater Trump em 3 de novembro. Outros, porém, o rotulam de plutocrata.
Esse dilema não é novo entre os democratas. Bloomberg é o maior doador do partido e seu dinheiro foi fundamental para a conquista da maioria dos assentos na Câmara dos Deputados nas midterms de 2018. Segundo o New York Times, com US$ 100 milhões, ele ajudou a eleger 15 deputadas e 6 deputados naquele ano.
Mas o dinheiro que o bilionário investe no Partido Democrata parece pouco se comparado ao que ele dedica às causas que defende. A mesma reportagem do New York Times estima que Bloomberg doou bilhões para projetos filantrópicos destinados ao controle de armas, mudanças climáticas, saúde e educação - temas que agora formam a base das propostas de Bloomberg em sua campanha eleitoral.
Investir rios de dinheiro em uma campanha presidencial pode dar muito certo ou muito errado, mas Bloomberg já teve uma experiência positiva com essa estratégia. Foi gastando grandes quantias - mais de US$ 70 milhões - que ele conquistou a prefeitura de Nova York em 2001.
Nas eleições de 2020, ele já começou a colher os primeiros resultados positivos: além de um segundo lugar nas pesquisas de opinião mais recentes, ele garantiu, pela primeira vez, sua participação em um debate democrata, que ocorrerá na noite desta quarta-feira (19). Isso só foi possível porque o Comitê Nacional Democrata suprimiu uma regra que estabelecia um mínimo para contribuições de campanha e desconsiderava investimento próprio - o que pode ser um indicativo de que os figurões do partido estejam inclinados a apoiar a nomeação de Bloomberg como candidato democrata.
Principais propostas
Bloomberg se coloca como um candidato moderado na corrida democrata. Apesar de já ter 78 anos, sua campanha usa muitos memes e o apelido Mike para buscar uma identificação com a nova geração de eleitores.
Ele é a favor do controle de armas. Promoveu diversas campanhas na internet contando histórias sobre mães que perderam seus filhos para a violência armada, tiroteios em escolas e o lobby de armas. Uma dessas campanhas foi ao ar durante o intervalo do Super Bowl e custou US$ 11 milhões. Bloomberg propõe tornar mais rígido o sistema de verificação de antecedentes para a compra de armas e banir a venda de fuzis de assalto.
Outro ponto crucial de sua abordagem com os eleitores democratas: mudanças climáticas. Ele promete, entre outras coisas, reverter a decisão de Trump e colocar os Estados Unidos de volta no Acordo de Paris e cortar a emissão de gases do efeito estufa em 50%, em toda a economia, até 2030. Porém é um crítico da proposta de viés esquerdista que ficou conhecida como Green New Deal, que, entre outras coisas, prevê que toda a energia elétrica do país seja suprida com fontes renováveis.
O financiamento e a manutenção do direito ao aborto é um tema caro para muitos eleitores democratas e, por isso, também está na plataforma do candidato. “Como presidente, protegerei ferozmente o direito de escolha de uma mulher e nomearei juízes que defenderão esse direito", declarou Bloomberg em 12 de fevereiro.
Na saúde é onde ele se diferencia de alguns de seus rivais na disputa democrata. Ele não apoia o “Medicare for all” do senador Bernie Sanders, mas é a favor de criar um plano de saúde subsidiado para pessoas de baixa renda, administrado pelo governo e que ofereça opções mais baratas do que o mercado privado para os demais usuários.
Polêmicas
O interesse popular em Bloomberg aumentou os comentários negativos sobre o candidato. Duas histórias em particular ganharam as manchetes nas últimas semanas.
Racismo
Um áudio de 2015, compartilhado recentemente nas redes sociais, mostra o candidato democrata Michael Bloomberg defendendo uma controversa política de segurança adotada por seu governo quando era prefeito de Nova York, conhecida nos Estados Unidos como "parar e revistar" (stop and frisk). Na gravação, ele aparece dizendo que "95%" dos "assassinatos, assassinos e vítimas de assassinos" são homens de minorias entre 16 e 25 anos e que, para reduzir a violência, era necessário jogá-los contra a parede e revista-los.
"Você precisa tirar as armas das mãos das pessoas que estão sendo mortas. Você quer gastar o dinheiro com muitos policiais nas ruas, coloca os policiais onde está o crime, o que significa em bairros minoritários", diz Bloomberg no áudio originalmente postado por um apoiador de Bernie Sanders.
Muitos democratas - e conservadores - o chamaram de racista pelos comentários. Bloomberg, no primeiro mandato como prefeito de Nova York, era republicano. Deixou o partido durante o segundo mandato e ganhou o terceiro como candidato independente. Posteriormente voltou a filiar-se aos democratas. Esse vai-e-vem partidário também é criticado por seus opositores.
Bloomberg se retratou e está conseguindo algum apoio da comunidade negra. O deputado por Nova York Gregory Meeks, que na época criticou a política do “parar e revistar”, disse que aceitou a retratação de Bloomberg e agora endossa a candidatura do bilionário. O grande apoio dos eleitores negros ainda parece estar com o vice-presidente de Obama, Joe Biden, mas talvez isso possa mudar se o candidato continuar caindo nas pesquisas de opinião - o que pode deixar em aberto o apoio dos afro-americanos a outro candidato moderado, como Bloomberg.
Sexismo
Bloomberg se coloca como um progressista a favor do direito da mulher ter total controle sobre seus direitos reprodutivos, mas já foi acusado de ter feitos comentários sexistas e promover uma cultura desconfortável para mulheres em sua empresa.
Uma matéria do jornal Washington Post publicou recentemente uma investigação sobre a conduta de Bloomberg no ambiente de trabalho, que inclui relatos de que o empresário teria ridicularizado uma funcionária grávida e pedido que ela abortasse seu filho, aparentemente por causa da licença maternidade.
Bloomberg diz que nunca fez isso e que as mesmas acusações voltam à imprensa toda a vez que ele concorre a um cargo eletivo. Salientou também que é um “incentivador das mulheres no ambiente de trabalho”. A seu favor ele tem o argumento de que, nas últimas eleições para o Congresso americano, ajudou a eleger 15 deputadas democratas - o que, por outro lado, fomenta ainda mais críticas sobre abuso de poder econômico: “Bloomberg estaria pagando para tentar se livrar de um passado machista?”
Se a aposta milionária de Bloomberg dará certo, por enquanto, ninguém sabe. Os indicativos inciais virão junto com os resultados da Super Terça, o primeiro teste de fogo do candidato bilionário septuagenário.
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